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ANTÓNIO FERRO - VÁRIOS ESPELHOS PARA UM SÓ ROSTO

Meses antes do desastre nacional do «25 de Abril» as edições «Panorama» publicaram uma antologia de António Ferro, com selecção, prefácio e comentários de seu filho, o escritor António Quadros, dando a público algumas páginas do "Diário» escrito em Berna e em Roma, durante os seis anos em que o condutor da "Política de Espírito» esteve à frente das nossas representações diplomáticas naquelas capitais.
Ferro morrera em 11 de Novembro de 1956. A data do armistício da primeira guerra mundial fora, para ele, também outro armistício - num quarto do Hospital de S. José, no coração de Lisboa que o vira nascer sessenta e um anos antes em 17 de Agosto de 1895, o combatente da «Batalha de Flores» firmava tréguas com a Vida. Talvez haja repetido, de si para si, aquilo que dissera na sua «Arte de Bem Morrer»: «Não há vida que valha qualquer morte com asas».

Alada tinha sido, em boa verdade, toda a sua carreira. Só com asas - asas de talento, de sensibilidade, de inteligência e de extraordinário poder de trabalho - seria possível cruzar horizontes e pousar em tantas árvores, da poesia ao jornalismo, do teatro à diplomacia, da agitação demolidora de um franco-atirador à firme e persistente acção criadora de um bom governante. E em cada um desses voos, nada de desnorteado, nada de inútil, todo o roteiro de uma obra em que, como observou António Lopes no comentário à reedição póstuma da «Leviana» e da «Teoria da Indiferença», «não há uma iniciativa falhada, urna nota de mau gosto, uma incoerência mental».

Com a Revolução de Abril o nome de António Ferro foi, evidentemente, para o rol dos malditos, em companhia, aliás, de muitos nomes ilustres. Era, sem discussão possível, um nome grande do jornalismo português; deviam-se-lhe serviços de maior préstimo na valorização da arte e da cultura nacionais; havia tornado possível a realização de um sem número de vocações literárias ou artísticas; mas nem nenhuma dessas credenciais nem a sua honestidade pessoal o absolviam do «nefando crime»: fora um dos mais directos colaboradores de Salazar. Cometera, além desse, outros delitos graves: era um homem inteligente e civilizado. Isso lhe garantia a incompatibilidade com um regime personificado com criaturas paranóicas ou semi-analfabetas.

O ostracismo começou a ter o seu termo neste ano de 1984, mercê da iniciativa do Grupo de Teatro «Primeiro Acto», de Algés, ao pôr em cena «Mar Alto», a peça de António Ferro cuja estreia se fizera com êxito no Brasil em 1922, primeiro no Teatro Sant' Ana, de São Paulo, para logo se repetir no Lírico, do Rio de Janeiro, mas cuja apresentação no Teatro Nacional de São Carlos, aos 10 de Julho de 1923, redundou em escândalo. Tratou-se de uma manipulação levada a cabo por uns tantos escribas bem-pensantes da época e com impacto bastante para o governador civil de Lisboa mandar proibir a representação, insistindo nesse bem pouco democrático processo não obstante o protesto de intelectuais como Fernando Pessoa, Aquilino Ribeiro, António Sérgio ou João de Barros - dezenas de intelectuais. Não havia muito, também, uma das melhores peças de Alfredo Cortez, «O Lodo», havia sofrido idêntica sabotagem. Vivia-se, como se vê, em plena democracia.

A reposição de «Mar Alto» pela equipa do «Primeiro Acto», acompanhada por uma exposição bibliográfica e por colóquios acerca da peça e do autor, constituiu, nestes tempos em que hoje vivemos, um acto de audácia - de uma audácia muito ao estilo de António Ferro - e foi, aliás, um bom espectáculo, quer pela internegração que lhe deram Arminda Taveira, Fernando Loureiro e João Vasques, quer pelo facto de se tratar de um texto teatral bem construído e que, não sendo uma obra de génio, merece com inteira justiça ser colocado ao nível das obras válidas, muito acima da mediania, e isto independentemente do seu valor documental para a história do moderno teatro português.

Deve dizer-se que esta verificação surpreendeu muita gente, sem excluir admiradores de António Ferro e cultores da sua memória. Sendo um trabalho datado do mais intenso período « modernista» do escritor, quem nunca houvesse lido a peça teria algum direito a pensar que «Mar Alto» não passaria de mais uma « Leviana», de mais uma travessura literária do jovem que a si próprio se considerava «um trapeiro de cores, um fumador de paradoxos». Acontece, porém, que «Mar Alto», embora repleto de paradoxos, tem consistência e densidade bastantes para ser posto em cena e aplaudido, como se viu agora.

Debaixo da maquilhagem do absurdo, a peça é profundamente realista, e profundamente analisadas são as almas das suas personagens e a sociedade a que pertencem. Prova, em suma, que António Ferro foi também um homem de Teatro.

É de crer que em matéria de Teatro, António Ferro tenha escrito algo mais do que «Mar Alto» e de que «O Estandarte», estreada esta no Sá da Bandeira, do Porto, em 1932. Pelo testemunho de Fernando Pessoa, sabemos que já em 1913 tinha três peças de Teatro escritas, ou em esboço, e na resenha biográfica que António Quadros agora traçou para o espectáculo do «Primeiro Acto», inteiramo-nos de que escreveu em Berna, entre 1951 e 1953, uma outra peça intitulada «Eu não sei dançar». Mas o seu nome fica menos ligado ao Teatro pelas obras que escreveu do que pelo interesse e pelo estímulo que lhe dispensou.

Em 1925, muito longe de vir a ser o director do SPN, António Ferro fundou com José Pacheco, em uma das salas do cinema Tivoli, o primeiro Teatro-Estúdio que houve em Portugal. Chamava-se «Teatro Novo», tinha programado vasto reportório de autores nacionais e estrangeiros, mas ficou-se por levar à cena, Para cada um a sua verdade». de Pirandelo. e «Knock ou a VIsta da Medicina», de Jules Romains. O «Teatro Novo» acabou por falta de verba. Melhor dito: acabou por não haver ainda nessa altura, na esfera dos poderes públicos, um António Ferro que lhe desse ajuda.

Apareceria oito anos mais tarde esse António Ferro, quando Salazar lhe confiasse a direcção do Secretariado de Propaganda Nacional: o «Teatro do Povo», entregue a Francisco Ribeiro (Ribeirinho) e a Francisco Lage, seria uma das mais louváveis e mais úteis realizações, tal como em 1949 a criação dos Prémios de Arte Dramática para as Sociedades de Recreio. A fundação em 1940 do famoso «Grupo de Bailados Verde Gaio» situa-se, evidentemente, fora do âmbito do Teatro, mas nem por isso deixa de ser obra de alguém desde sempre fascinado pelo palco, pelo espectáculo.

Para o «Verde Gaio» escreveu António Ferro o argumento de quatro bailados - «D. Sebastião», «Imagens da Terra e do Mar», «Noite sem fim» e «A Noite sobre o Monte Calvo». Criar uma companhia portuguesa de bailado deve ter sido para Ferro uma felicidade muito especial - era um dos sonhos da sua Juventude, de quando se não cansava de ilustrar crónicas ou conferências, a propósito de tudo e de nada, com alusões aos «BalIets Russes». E é de lembrar que o primeiro Congresso de Crítica Dramática e Musical, realizado em Lisboa em 1933, foi iniciativa do antigo crítico teatral do «Diário de Lisboa» - ele próprio, António Ferro.

«UM CINÉFILO COMO NÃO HOUVE OUTRO»
Homem de Teatro, Ferro esteve quase a ser um homem do Cinema - do Cinema que tinha a idade dele, ambos nascidos na última década do século XIX, ambos feitos para o século xx. O cinema foi um dos muitos cenários da adolescência de António Ferro, já a motivar-lhe aos 22 anos uma conferência no Salão Olímpia sobre «as grandes trágicas do silêncio». Dele escreveu Manuel Maria Múrias, na sua «História Breve do Cinema», «foi um cinéfilo como não houve outro em Portugal».

Cinéfilo, apenas, sem chegar a ser cineasta. Cinéfilo em HolIywod, a entrevistar «astros» e «estrelas» do fim dos anos 30. Cinéfilo, sobretudo, nos esforços que despendeu ao serviço da chamada «Sétima Arte»: devem-se-Ihe as equipas do Cinema Ambulante do SPN, a instituição dos Prémios Cinematográficos e a Lei de Protecção ao Cinema, com o Fundo do Cinema e a Cinemateca Nacional. E apetece dizer - um pouco à sua maneira - que esboçar a biografia de António Ferro é como que planejar as sequências de um filme de grande metragem em vários episódios, a que se poderia chamar "O descobridor de horizontes», ou - talvez melhor, talvez mais à tona de água - 0 homem dos sete ofícios».

A «POLÍTICA DO ESPÍRITO»
A poesia foi um desses horizontes. Pode até dizer-se ter sido o primeiro e o último horizonte da sua carreira literária, que começou com «Missal de Trovas», aos 17 anos, e acabou com «Poemas Italianos» de 1955, que supomos ainda inédito. Teatro e Poesia são, porém, horizontes em que o perfil de António Ferro se esfuma, contrastado com as dimensões assumidas naqueles dois campos em que se impôs e impõe até aos adversários. De tal modo imagine-se! - que há quem cuide agora, ao que parece, de lhe recriar a imagem fora do quadro dos valores do Estado Novo.

No campo da «Política de Espírito», (título de um editorial seu de 1932 no «Diário de Notícias» e que serviu de legenda para toda a acção desenvolvida à frente do organismo oficial chamado de início SPN e mais tarde SNI) perfilam-se, sucessivamente, a instituição dos Prémios Literários (1934), as exposições de Arte (a primeira de Arte Moderna foi em 1935) e os respectivos galardões, o comissariado do Pavilhão de Portugal na Exposição Internacional de Paris (1937) e nas exposições de Nova York e de San Francisco (1939), a condução geral das comemorações do Duplo Centenário (1940), o Concurso da Aldeia Mais Portuguesa de Portugal ( 1939), os Concursos das Estações Floridas (l94\), a remodelação da Emissora Nacional (1941), as Pousadas de Turismo (1942), o lançamento das revistas «Atlântico» e «Panorama» (1942-43) os Salões de Arte Moderna dos Artistas do Norte (1945), o Museu de Arte Popular (1948) ou o Estatuto de Turismo (1949).

Tudo isto, além das já citadas realizações nos sectores do Teatro, do Bailado ou do Cinema e de múltiplas promoções de ordem menor, de que já ninguém fala mas que ao tempo significaram muito, como o popular «Concurso das Montras»: tudo isto, grandes ou pequenas coisas, mobilizando ano para ano intelectuais e artistas - alguns deles de primeira grandeza - e, sobretudo, de ano para ano revelando cada vez maior número de novos valores, ou de candidatos a tal. E tudo, salvo raras excepções, levado a efeito em gradual crescimento, com regularidade, com intensidade, florindo em cada ano com a naturalidade das coisas naturais. Apesar das incompreensões e das invejas que vieram de todos os lados. E isto, este querer ir até ao fim, aconteceu em Portugal, país das Capelas Incompletas, terra de uma gente que, no dizer de um dos seus poetas, «só sabe fazer bem Torres de Belém»...

O JORNALISTA
O director do SPN não carregou somente com o peso da má vontade dos adversários do Estado Novo e o das incompreensões opostas de muitos lados à sua obra de reformador da paisagem estética e literária. Do jornalista António Ferro o funcionário António Ferro herdou incompreensões e invejas acumuladas desde a publicação de «Gabriel D' Annunzio e Eu», que um crítico da época, de língua viperina, afirmava ser a versão portuguesa da fábula de La Fontaine «O leão caçando com o burro». Tinha sido, de facto, um jornalista incomodativo.
Duplamente incomodativo. Apareceu como neflibata que assim chamavam depreciativamente aos futuristas os «bem-pensantes» - mas surgiu e incomodou, sobretudo com um valor profissional muito acima da craveira vulgar. Passara desapercebida a sua passagem pelo «Orpheu», onde foi, simultaneamente, editor e catecúmeno do credo modernista. Talvez o mesmo tenha acontecido ao ser nomeado, em 1919, chefe de redacção do órgão sidonista «O Jornal», embarcadouro de largada para uma carreira que se prolongaria em O Século» a «Ilustração Portuguesa», o «Diário de Lisboa» e o «Diário de Notícias ... Mas deixou de ser um desconhecido, ou alguém a quem se não liga especial importância, a partir da sensacional reportagem em Fiume e das conversas com D' Annunzio, o libertador da pequena cidade adriática, então no auge da celebridade.

É difícil distinguir nessa carreira jornalística entre as reportagens, as entrevistas ou as crónicas, por um lado, e, por outro lado a exibição de acrobacias literárias como "Leviana .. (1921) e "Teoria da Indiferença .. (1920) ou a conferência sobre Colette (1921) e as do ciclo brasileiro - "A Arte de Bem Morrer .. e "A Idade do Jazz Band .. (1922-23), pois toda a literatura do jovem modernista é essencialmente jornalística:

"A Leviana" deve ser lida como reportagem da vida de certas mulheres, "Batalha de Flores .. (também do ciclo brasileiro) vale, sobretudo, por ser uma crónica da vida lisboeta, ou, mais exactamente, da Lisboa do Chiado e da Rua do Ouro. E não exageraremos ao observar que a "Arte de bem morrer .. é, afinal, uma extensa reportagem através da História, desde Petrónio a Landru, embora esquecendo Sócrates, e Maria Stuart, e D. Lourenço de Almeida ...

Como realizações de jornalismo puro - e do melhor quilate, sem gravador portátil, sem questionários pré-fabricados - foram as entrevistas recolhidas em "Viagem à volta das ditaduras .. , de 1927 (com Mussolini em Roma, Primo de Rivera em Madrid ou Kemal Ataturk em Ancara, para não falar de outros); em "Praça da Concórdia .. , de 1929 (autêntica salada de celebridades políticas. culturais ou mundanas, onde. a propósito de Bcrriot, se observava que «estar nas esquerdas em França é estar de um lado» mas que em Portugal "é olhar só de um lado ..... ); em "Novo Mundo, Mundo Novo .. e "Hollywood, capital da imagem .. , de 1930-31 (com as impressões trazidas dos Estados Unidos) e em "Prefácio da República Espanhola» (publicado em 1933 mas referente a uma reportagem inquérito feita em 1930). Depois, as entrevistas com D. Manuel lI, em 1932, e sobretudo, nesse mesmo ano, a série de entrevistas com Salazar, que devem considerar-se hoje indispensáveis textos de apoio para quem queira entender a sério o pensamento e a obra do fundador do Estado Novo.

Acrescente-se que outras entrevistas notáveis - com Afonso XIII de Espanha ou com Lloyd George, por exemplo - seriam recolhidas na colectânea publicada em 1941, sob o título "Homens e Multidões .., obra cuja leitura não será demais recomendar aos alunos das actuais escolas de Jornalismo. Para que se não perca a lição de um jornalista acerca do qual dizia, entusiasmado, Ramon Gomez de La Serna: "Dá a impressão de estar inteirado de tudo ...

O NACIONALISTA
Das peças magistrais de jornalismo há uma que anda geralmente esquecida; a da reportagem do funeral de D. Manuel lI, em Julho de 1932. Lembramo-la aqui por um motivo especial, que a seguir se verá qual é.

Depois das exéquias e antes de ser trasladada para Lisboa, a uma do monarca ficara depositada na pequena igreja de um arrabalde londrino, a igreja de Weybridge. E foi em certo domingo desse Julho de 1932 que António Ferro se encontrou à saída de Weybridge com um grupo de cem portugueses que tinham vindo de muito longe - "da Índia.., segundo dizia o guarda igreja - para velarem os restos mortais de um rei de Portugal.

Eram, todos, goeses embarcadiços da companhia "P & O .. da carreira das Índias; goeses que tinham trocado por Bombaim a sua terra natar quando ainda eram crianças, que dificilmente se exprimiam em português, que passavam a maior parte do tempo sobre o mar, mas goeses, também, que não haviam esquecido ser Portugal a sua pátria, ser a fé católica a sua fé; goeses que mantinham no porto de Tilbury, "terminus .. certo da rota dos seus barcos, uma capelinha chamada" Estrela do Mar .., e nessa capelinha, entre lumes e flores, porventura entre círios trazidos do Oriente e flores colhidas nos campos de Inglaterra, uma imagem de S. Francisco Xavier, a imagem portuguesa e cristã da alma de Goa, do povo de Goa. Comentava assim o jornalista: "Admiráveis rapazes, que nunca pediram nada à sua terra, que se contentam em amá-Ia de longe, como se a sua pátria fosse uma santa, como se estivesse num dos altares da igreijinha de Tilbury.

Como se a pátria fosse uma santa. A imagem criada por António Ferro ao correr da sua reportagem sobre "os goeses de Tilbury .. muitas vezes se me faria presente ao espírito, vários anos passados: primeiro com a morte do timorense régulo D. Aleixo; depois, com a de Aniceto do Rosário e com a resistência da população luso-indiana à integração no império de Nova Deli; por último, com o assassínio dos régulos moçambicanos que preferiram cair assassinados pela Frelimo. do que trair a bandeira portuguesa. Para todos eles a veneração que tinham por essa bandeira foi adivinhada na definição do portuguesismo dos goeses de Tilbury: "Como se a pátria fosse uma santa...

A citação daquela crónica de António Ferro tem aqui, como se disse, um motivo especial, que é o de apontar para a linha de rumo seguida imperturbavelmente pelo autor da" Viagem à volta das ditaduras», rumo que não foi mais do que o de um portuguesismo integral. Podem chamar-lhe sentimento de Portugalidade, não errarão se lhe chamarem só nacionalismo.

Ferro pertenceu ao número dos que sobrepuseram ao patrioteirismo indígena da idade liberal o nacionalismo integral, e no caso português, transeuropeu - de uma nova era, em que se passou a olhar mais para os construtores do futuro do que para os heróis do passado. A descoberta da real dimensão do portuguesismo começou para ele em Luanda, aos 23 anos, quando ajudante do governador-geral Filomeno da Câmara e, logo depois, secretário-geral de Angola. Dessa passagem por Luanda há, de resto, uma palpitação nas primeiras páginas da sua "Arte de bem morrer». Mas foi por certo a triunfal digressão pelo Brasil, no mesmo ano do seu casamento com a poetisa Fernanda de Castro e na mesma altura em que Lisboa e o Rio de Janeiro vibravam em uníssono com o vôo glorioso de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, que lhe afervorou o sentido lusíada, mais tarde expresso na crónica dos goeses de Tilbury.

Nessa digressão, aliás, António Ferro prestou o seu primeiro grande serviço a Portugal, desempenhou-se da sua primeira embaixada, foi mostrar aos modernistas brasileiros que Portugal não era, apenas, um exportador de emigrantes. Em troca, deu-lhe o Brasil a confirmação do que o jovem jornalista sentia: que um país como Portugal, capaz de realizar o prodígio da nação brasileira, não podia ser nunca «um pequeno país». Ninguém melhor entendeu isto do que Carlos Malheiro Dias, ao apresentar António Ferro ao público do Teatro Lírico do Rio, em 30 de Julho de 1922: «Nas vossas mãos de artista arvorais uma bandeira, agitada pelo vento que sopra não do quieto passado mas dos quadrantes do futuro. Convosco veio o clamor alegre dos que se banham nas águas vivificantes da mocidade. Vós atestais que as nações podem ser antigas sem serem velhas».

Desse ano de 1922, primeiro centenário da independência do Brasil e, em coincidência, ano do primeiro voo Lisboa - Rio de Janeiro e da primeira visita de um chefe de Estado português ao país irmão, fez António Ferro o pilar inicial de uma ponte que viria a chamar-se comunidade luso-brasileira, por ele franqueada ao trânsito mediante iniciativas culturais como a publicação da «Atlântico» e a criação da secção brasileira do SPN, além das amizades nascidas entre intelectuais e artistas das duas pátrias.

Por amor ao Brasil? Sem dúvida. Mas, essencialmente, por amor a Portugal. Por entender Portugal não só como um espaço ou um estado mas como o lar de uma grande família, tão necessitada de se manter unida e ligada a todos os parentes como carecida de se actualizar, de não viver só virada para as recordações do passado mas igualmente para as esperanças do futuro. Nacionalismo é isso.

LUGAR E TEMPO CERTOS
Foi um político António Ferro? Cremos que se lhe pode chamar muita coisa mas não um homem político. Tão pouco um intelectual modernista convertido aos cânones de uma ordem conservadora. Pertenceu a uma geração ao mesmo tempo irreverente e devotada, a assistir dia a dia ao desabar de tabiques carunchosos e ao alteamento de novas construções, que, quanto mais não fosse, tinham o mérito de ser novas e banhadas por lima luz solar. Foi um homem participante no fenómeno político do seu tempo. De modo algum um profissional da política.

Para António Ferro, a militância no campo político ainda hoje chamado «das direitas» (tal é o peso dos lugares comuns... ) começou da mesma manelrà do que para grande parte dos seus contemporâneos: começou por Sidónio Pais, em quem o próprio Fernando Pessoa veria uma «flor alta do paul da grei». Em «D. Manuel lI, o Desventurado», que publicou em 1954, Ferro evoca o dia em que pela primeira vez viu o chefe da República Nova, quando este saía da estação do Rossio, por entre o entusiasmo popular, e o jornalista de vinte e três anos abancava no Café Martinho, «quartel general da sua indolência». E conta: «foi Sidónio Pais, a figura esbelta de Sidónio, o nosso primeiro republicano sem barrete frígio, quem me arrancou a este adormecimento, a esta modorra». Mas note-se bem que o sidonismo de António Ferro não tem nada de político-partidário, é uma exigência do seu nacionalismo: compreendeu que as nações «só se prestigiam através da grandeza das suas figuras e nunca, nunca, através da pequenez dos seus figurantes». Também hoje se começa de novo a compreender isso.

O nacionalismo político de António Ferro (repetimos que não nos parece admissível falar a seu respeito de nacionalismo partidário, até porque a expressão, no fundo, é absurda) despertou oom Sidónia Pais, desenvolveu-se com Filomeno da Câmara, foi por certo influenciado pela palavra de Homem Cristo Filho (o que é patente na peça "o Estandarte») e, escusado será dizê-lo, realizou-se por completo em contacto com Oliveira Salazar e perante os claros, inegáveis sinais de ressurgimento nacional trazidos à ditadura militar de 1926 pelo seu ministro das Finanças.

Nem Sidónio nem Salazar representaram para António Ferro chefes partidários. Representaram, sim, chefes nacionais, potencialmente o primeiro, efectivamente o segundo. O nacionalismo de António Ferro é preexistente à sua acção como condutor da «Política de Espírito», embora este só com Salazar pudesse haver atingido a extensão e a profundidade alcançadas. O salazarismo de António Ferro - entusiástico mas lúcido, vibrante mas reflectido - é corolário natural do seu patriotismo. Caixeiro-viajante de Portugal no estrangeiro, conforme alguém lhe chamou, Ferro não foi um exportador de propaganda oficial, como nunca fora um importador de modas ou ideias estrangeiras. Tão errado é considerá-lo um estrangeirado em 1922 como julgá-lo em 1942 um «chauvinista».

De fora para dentro ou de dentro para fora, o que fazia num sentido ou em outro passava sempre pelo filtro de uma sensibilidade muito portuguesa, do culto da originalidade - e do bom gosto. Modernista, não há nele qualquer desacato à verdadeira Tradição. Admirador da vida parisiense, nas suas grandezas ou nas suas bagatelas, não pretende de modo algum que Lisboa seja uma imitação de Paris - só deseja, só exige que Lisboa faça, em relação a Paris, o triste papel da provinciana que cheira a cebola. Do mesmo modo, o que mostrou aos estrangeiros e aos portugueses espalhados pelo mundo não foi um cartaz de propaganda partidária mas sim a autenticidade da casa portuguesa, onde havia salas para mostrar os quadros de Nuno Gonçalves ou do Grão - Vasco, ou a Carta de Pêro Vaz de Caminha e outras para expor galos de Barcelos em cenários de azulejo e de chita.

O endiabrado modernista que escandalizou Lisboa com a sua «Leviana» e o seu «Mar Alto;>, o arrojado jornalista que transformou em entrevista o silêncio feroz de Clemenceau, o republicano que restaurou a realeza de D. Manuel II não no trono mas na alma do seu povo, esse homem fora de série tinha, em boa verdade, na terra portuguesa, no lar de todos nós, algo de exemplar dona-de-casa.
Sim. Qualquer coisa de dona-de-casa, sabendo pôr sempre tudo no lugar certo, desde os paradoxos e os ilogismos às ideias sérias e às grandes verdades que se não discutem. Tudo no lugar sério - a começar por ele.
Eu penso, muito sinceramente, que António Ferro em nada se melindraria com esta comparação. Mas sei que algumas sensibilidades mais delicadas, menos atrevidas, poderão achá-la irreverente, talvez até desrespeitosa. Mas nesse caso...
Pois nesse caso valho-me do que serviu de motivo a esta breve memória da obra e da personalidade de António Ferro - a reposição de «Mar Alto» em tábuas de um palco. E já o não comparo a uma dona de casa, mas sim a um contra-regra.
Dentro e fora do Teatro, ele foi autor, actor, encenador e espectador. Mas foi principalmente fora do Teatro - principalmente no jornalismo, principalmente no dia-a-dia de uma carreira composta em todos os tipos de letra - um genial contra-regra, que faz entrar em cena, a tempo e horas, algumas das maiores personagens do seu tempo de europeu e de português. Que fez até entrar em cena e no Grande Teatro do Mundo um povo chamado Portugal.

Fonte: Futuro Presente, Número Especial 21/22, Abril/Junho de 1985
 
A MATRIZ DE ANTÓNIO FERRO
António Ferro continua a ser uma figura incontornável para a compreensão das políticas culturais em Portugal. A cultura tornou-se com ele não apenas num veículo de propaganda, mas sobretudo um eficaz instrumento de controlo social. Ao contrário do que se afirma, a sua principal preocupação não era a criação e difusão das ideias do regime, mas a criação de meios de ocupação dos "tempos livres" dos portugueses. Estes constituíam um tempo potencialmente perigoso para o poder se não fosse organizado. A contribuição mais significativa de António Ferro foi, como veremos, ter mostrado que as múltiplas manifestações culturais podiam ser organizadas de modo a predisporem os indivíduos para certas formas de comportamento e pensamento espontâneo.

A política cultural do Estado Novo nos anos trinta e quarenta, estava longe de reduzir-se ao SPN/SNI. Era partilhada e prosseguida por diversos organismos do Estado, sob a orientação de Salazar, o seu verdadeiro mentor. Em todas as áreas contava com a colaboração de muitos dos melhores criadores e intelectuais do tempo. Para além dos aparelhos locais, como as câmaras municipais, no Estado, cinco organismos possuíam uma acção muito relevante, ainda muito longe de ser esclarecida na sua globalidade.
- O Ministério da Educação Nacional (MEN), com Carneiro Pacheco (1936-1940) e depois com Mário de Figueiredo (1940-1944), assumiu claramente uma função doutrinária no regime.
- O Ministério do Interior (MI), desde 1927 tinha a seu cargo a censura à imprensa e aos espectáculos. Cabia-lhe ainda o licenciamento dos espectáculos e divertimentos (vistos), assim como dos recintos onde estes se realizavam. Controlava ainda o registo dos artistas, intérpretes e das empresas promotoras de actividades artísticas. Em 1940, a censura da imprensa e espectáculos passou a ser coordenada também pelo SPN, sendo integrada definitivamente no SNI em 1944, assim com as restantes áreas. O MI assumiu então uma função mais estritamente policial.
- A FNAT- Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho, criada em 1935, ocupava-se dos tempos livres dos trabalhadores e da sua formação cultural, segundo os valores do regime.
- O Comissariado Nacional do Emprego, criado em 1932, chefiado por Duarte Pacheco, de forma muito discreta, mas não menos eficaz, teve um papel activo na promoção cultural, nomeadamente financiando a contratação de desempregados.
- O Secretariado de Propaganda Nacional (SPN), criado em 1933 e transformado em 1944, no Secretariado Nacional de Informação, Cultura Popular e Turismo (SNI), duas criações atribuídas a António Ferro, estavam directamente ligadas a Salazar. De forma persistente, António Ferro, ao longo de 16 anos foi transformando uma estrutura inicial muito artesanal, numa verdadeira máquina de propaganda e controlo das actividades informativas, culturais e turísticas que ainda hoje é apontada como modelo de eficiência.

Apesar das limitações inerentes a uma análise centrada apenas num destes organismos - a SPN/SNI/SEIT, foi todavia a perspectiva seguida neste trabalho, em grande parte ditadas por os condicionalismos que lhe são inerentes.

A "POLÍTICA DO ESPÍRITO"
António Ferro não estava sozinho quando defendia todo um ideário que expressava identidade da cultura portuguesa, naquilo que julgava ser a sua autenticidade. Desde finais dos anos trinta, que este ideário percorria toda a administração pública, sendo nos aos quarenta teorizado por muitos dos mais reputados intelectuais portugueses.

António Ferro, tal como Gobbels, tinha uma percepção clara de como a cultura se poderia transformar num poderoso instrumento de poder ao serviço do Estado, nomeadamente na construção de uma retórica cultural onde os conflitos sociais são harmonizados em torno de grandes desígnios nacionais.

Ao Povo Português é atribuída uma missão divina - propagar e defender os grandes valores da cristandade no mundo. O seu Império é apresentado como o exemplo da obra civilizacional do mundo ocidental. As suas aldeias, constituídas por gente trabalhadora, pobre e feliz, são apresentadas como um exemplo às outras nações civilizadas, onde pululam grandes urbes industrializadas minadas pela desordem e imoralidade.

A política do Estado Novo, no seguimento da ditadura militar de 1926, assumiu como missão restaurar a "alma da pátria portuguesa" que os governos democrático-liberais haviam procurado destruir. A ordem pública, o miraculoso equilíbrio das contas públicas eram apresentados como exemplos de um país que voltou a reencontrar-se consigo próprio, aceitando o que herdou do seu passado glorioso, com o orgulho de quem aceita o que melhor pode aspirar, libertando-se de todos os seus desejos exteriores. Conformam-se os pobres com o que possuem, e os ricos com aquilo que Salazar lhes proporciona. As elites culturais com o estatuto de privilégio que lhes é proporcionado. A exaltação patriótica dos “valores nacionais” não se projecta no sentido de descobrir novos saberes ou técnicas, mas na auto-contemplação do ser português, como se nessa atitude se contivesse tudo o que de melhor se pode aspirar. A história de Portugal, como a concebe Salazar e a encena António Ferro, termina afinal na quietude contemplativa da sua própria trajectória, nos seus hábitos e costumes, tudo o que em suma, faz que sejamos o que já somos.

ÁREAS DE INTERVENÇÃO
Nos dez primeiros anos, o SPN privilegiou três áreas: a propaganda do ideário do regime, o turismo como meio de difusão da imagem de um país feliz consigo próprio, e a cultura popular como instrumento integrador das camadas mais baixas da população.

Depois de 1944, o SNI, dotado de novos meios, para além da propaganda, começa a actuar no controlo e censura da informação veiculada pela comunicação social e com a inspecção das actividades culturais. O Estado Novo sente-se cada vez mais isolado, e com um ideário que não consegue gerar tão amplos consensos como os que no período anterior foi capaz de produzir. O turismo foi perdendo grande parte da sua função ideológica, para se transformar na promoção de mais um destino para férias a preços baratos. As preocupações económicas secundarizam as de natureza ideológica. A cultura popular acabou por ser enquadrada no âmbito da etnografia, em regra ao serviço também da promoção turística. O SNI que até aí privilegiara a população rural e o imaginário dirige-se agora para as camadas urbanas, nomeadamente as de maior rendimento e instrução. Só após a saída de António Ferro, em 1949, será possível dar corpo a esta nova orientação política.

ESTRUTURAS
Para além das ideias que caracterizaram, cada período, António Ferro, foi criando uma poderosa estrutura burocrática e concebendo amplos programas culturais que ainda hoje, em grande parte, sobrevivem. Entre as suas funções mais salientes destacam-se as seguintes:

A recolha e tratamento da informação dos órgãos de comunicação nacionais ou estrangeiros de apoio aos altos dirigentes do Estado, servidos por uma biblioteca, uma Fototeca e uma Filmoteca.
A propaganda era alimentada por uma contínua produção de informação destinada aos órgãos de comunicação e à Emissora Nacional, desdobrando-se numa vastíssima produção editorial, em diversas línguas, organização de exposições em Portugal ou no estrangeiro. O Brasil surgia neste contexto como uma força que permitia amplificar a voz de Portugal no mundo. António Ferro, apesar de entrever a importância económica do turismo, viu sobretudo nele um meio de propaganda. O apoio à cultura, nomeadamente às artes plásticas, cinema, música, dança, teatro, privilegiou a atribuição de prémios, a encomenda ou compra de obras ou a produção de eventos em detrimento do apoio à criação de estruturas para a produção cultural.

A grande promoção cultural de António Ferro centrou-se contudo em volta da cultura popular, que tinha nas romarias, arraiais e feiras a sua expressão mais genuína. À sua volta procurou criar uma grande encenação não apenas para os estrangeiros, mas sobretudo para consumo interno. Uma vasta equipa de artistas e intelectuais, como dissemos, ao longo dos anos sob os motivos mais diversos foi pacientemente re-elaborando as grandes manifestações populares em termos plásticos mais modernos, apresentado-as em seguida como expressões genuinamente populares. Fragmentos de memórias locais são pretexto para a criação de tradições centenárias. A confusão entre o falso e o autêntico era total. A promoção da cultura erudita junto do povo, foi neste contexto limitadíssima, pois a mesma correspondia a um desvio à integração do povo numa cultura popular que se lhe apresentava como exaltante.

No final da década de quarenta, a política cultural do Estado Novo, nas suas diversas vertentes, estava claramente esgotada, surgindo entre os defensores do regime, um número crescente dos que preconizam a sua mudança. No plano económico, o modelo corporativista, ainda assente na ideia de um retorno às corporações medievais, apesar de continuar a alimentar o imaginário de muitos intelectuais, é esvaziado de conteúdo ideológico. Em breve, teremos um corporativismo regulamentado pelo Estado, cujos dirigentes não se reconhecem no próprio corporativismo. No plano cultural, como reconhecerá Salazar, apesar das inúmeras obras encomendadas ou apoiadas pelo Estado Novo, nenhum criador, ideia ou obra cultural conquistara projecção além-fronteiras. Depois de 1938, a imposição por parte do Estado das temáticas regionalistas ou historicistas, contribuíra afinal para desligar ainda mais a arte produzida em Portugal das grandes correntes internacionais.

A "FILOSOFIA PORTUGUESA"
Face a esta evidência, muitos intelectuais passam a defender que a cultura portuguesa, reflectia outras categorias mentais inapreensíveis noutras línguas. A originalidade da racionalidade do pensar português, só os portugueses o podiam compreender. Durante os anos cinquenta, no nosso acanhado meio filosófico, a questão central é a existência ou não de uma filosofia portuguesa. Nos seus pressupostos, continuava-se afinal a discutir a política do espírito de António Ferro, afirmando ou negando-a.

AS CAUSAS DO AFASTAMENTO
Durante a II Guerra Mundial (1939-1945), dois fenómenos começaram a esvaziar o discurso ideológico montado por António Ferro.
- O primeiro, foi o contraste que transparecia entre a miséria sentida pela maioria dos portugueses e a exaltante opulência de paz e bem estar com que alguns milhares de portugueses e estrangeiros viviam nas estâncias balneares, em especial na Costa do Sol. A activa propaganda do SPN/SNI, exaltando a paz e prosperidade do país, feita na base de contrastes sociais, entre pobres e ricos, apenas aumentava esta sensação de privação para a maioria da população. A partir de 1943, conforme reconhecia a Igreja, o Partido Comunista Português começou a emergir explorando estes mesmos contrastes a que o Neo-Realismo dará forma artística.
- O segundo foi a emergência dos Estados Unidos da América como a grande potência mundial, constituindo os seus estilos de vida e a sua democracia verdadeiros símbolos da modernidade. Na reconstrução dos países europeus devastados pela guerra, a imprensa reconhecia ritmos de crescimento económicos que não tinham paralelo com os fracos progressos obtidos pelo Estado Novo. A comunicação social, afecta ou não ao regime, não deixa de difundir imagens desta prosperidade distante de que a grande maioria dos portugueses estava privada.

O discurso da superioridade de modelo de sociedade portuguesa, assente no corporativismo, transformou-se subitamente no discurso das causas do atraso económico do país. Neste contexto, Salazar rapidamente percebeu que tinha que alterar o discurso do regime e mudar os mecanismos de controlo social, mas para isso tinha também que afastar o homem que criara e encarnara o modelo anterior. Em 1949 António Ferro é compulsivamente afastado do cargo que desempenhara desde 1933. Chegara a hora dos burocratas.


Fonte: http://acultura.no.sapo.pt/page8Matriz.html

António Maria Zorro