clique aqui se não conseguir visualizar correctamente esta newsletter
Newsletter Nº 143 / 14 de Janeiro de 2019
Direcção Mafalda Ferro Edição Fundação António Quadros

ÍNDICE

01 –
Razões para um Prémio, por José Guilherme Victorino.

02 – Aspectos da afirmação da cultura visual em Portugal: o papel de António Ferro. Da Ilustração Portuguesa ao arquivo fotográfico do SPN, por Paulo Ribeiro Baptista.

03 Litoral: revista mensal de cultura [Lisboa, 1944-1945] digitalizada e partilhada, por Hemeroteca Municipal de Lisboa.

04 – Aveiro, uma surpresa de cor viva num Portugal de verde-a-mate, por Raul Proença Mesquita.

05 Exposição «Ver Tudo: Màmía Roque Gameiro (1901-1996), desenho e ilustração, por Sandra Leandro.

06 – Delfim Maya e a Liberdade de Ser e de Criar, por Maria José Maya.

07 Livraria António Quadros promoção do mês: Delfim Santos e a Família Castro e Quadros Ferro. Coordenação editorial de Mafalda Ferro. Lisboa: Fundação António Quadros, 2011.


EDITORIAL

por Mafalda Ferro

Os Instituidores da Fundação António Quadros, primeiros beneméritos e responsáveis pela sua existência, foram Paulina Roquette Ferro, António Roquette Ferro, Mafalda Ferro, Rita Ferro, Vicente Lemonnier Ferro e Stéphanie Lemonnier Ferro, os doadores dos espólios de Fernanda de Castro, António Ferro e António Quadros.


No dia 6 de Maio de 2008, a Fundação António Quadros foi instituída pessoa colectiva de direito privado no cartório notarial de Melânia Jones Valente Ribeiro  com sede em Vale de Óbidos, Rio Maior.


No dia 8 de Janeiro de 2009, a Fundação foi reconhecida em Despacho n.º 2400/2009 assinado pelo Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Dr. Jorge Lacão e entregue em mão por Dr. José Maria Sousa Rego.

Momentos registados por Francisco d'Orey Manoel, vice-presidente da Fundação, também presente nesse dia.


Dez anos depois, lembra-se e agradece-se também às 20 pessoas que mais activamente participaram na primeira etapa histórica da Fundação (2007-2009), esperando não esquecer ninguém:

 

António Roquette Ferro, Francisco d'Orey Manoel, Francisco Ferro Gautier, Isabel Cunha d'Eça, João Alves Miranda, José Carlos Calazans, José Maria Sousa Rego, José Mariano Gago, Luís Almeida Gomes, Luís Silva Moreira, Madalena Ferreira Jordão, Mafalda Samwell Diniz, Maria Barthez de Bragança, Mário Serra Gentil de Quina, Melânia Jones Ribeiro, Rui Lopes, Rui Neves da Silva, Rui Patrício Albuquerque, Sara do Ó Chaves, Teresa Samwell Diniz.

 

Conheça melhor a História da Fundação António Quadros, consulte AQUI a sua Cronologia Histórica, patente no Sítio da Fundação.

 
01 – RAZÕES PARA UM PRÉMIO.
por José Guilherme Victorino.

 

Cabendo-me, naturalmente, efectuar uma breve contextualização referente ao Prémio António Quadros 2018, começo por citar a acta da reunião deliberativa do Júri, no passado mês de Julho:


«Decidiu a Fundação António Quadros criar um prémio destinado a promover e divulgar a cultura, a acção e o pensamento portugueses, nas suas múltiplas expressões e géneros, tarefa a que, lúcida e generosamente, o seu patrono e os seus pais dedicaram grande parte da sua actividade.

No presente ano, dada a relevância que o turismo português teve no pensamento e na acção de António Ferro, sendo crescente o número de artigos e monografias que se lhe referem, foi deliberado que a categoria do Prémio António Quadros seria o Turismo, e que o Prémio seria entregue a uma personalidade portuguesa de reconhecido mérito nessa área.

Na sequência da decisão, tomada em Assembleia Geral desta Fundação, em 30 de Janeiro, aceitei com gosto o convite para presidir ao Júri deste prémio, a que se seguiram os convites que dirigi a demais individualidades com perfil académico-profissional justificadamente adequado à formação desse colectivo. Primeiramente, à Prof.ª Doutora Cândida Cadavez (Docente de Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril e Investigadora do Instituto de História Contemporânea, da Universidade Nova de Lisboa), convite que, contudo, à mesma não foi possível aceitar, e a Mafalda Ferro, Presidente desta Fundação. Posteriormente, à Dra. Ana Filomena Figueiredo (então Vereadora com o Pelouro do Turismo, da Câmara Municipal de Rio Maior), à Prof.ª Doutora Carla Ribeiro (Docente do Instituto Politécnico do Porto e Investigadora do Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade, da Universidade do Porto), e a Celestino Domingues, ex-docente nas Escolas de Hotelaria e Turismo do Algarve e de Lisboa, investigador pioneiro nesta área.

Congratulou-se o Júri por, em sessão única e por unanimidade, ter sido deliberada a atribuição do Prémio António Quadros 2018 a Margarida de Magalhães Ramalho, cuja continuada pesquisa e produção editorial, em torno da História do Turismo, é da maior relevância, numa visão inédita, multidisciplinar e de extrema actualidade, num contexto português e europeu, designadamente através de obras como Aldeias Históricas; O Estoril na Vanguarda do Turismo; Escrever sobre Sintra; Lisboa na Pintura:  um olhar sobre a cidade, ou Portugal na Pintura: viagens na nossa terra.»

 

Resta-me acrescentar que Margarida Ramalho se revelou como uma das mais profícuas e interessantes historiadoras, que, num contexto não académico, se interessou pela História do Turismo em Portugal, em contributos indispensáveis numa área ainda, paradoxalmente, tão pouco explorada, bem como em torno da problemática relativa aos refugiados, durante o segundo conflito mundial.

Tal leva-me a partilhar a convicção – tendo em conta, não só recentes publicações de Margarida Ramalho, mas também o facto de a sua investigação ter sido crucial para a realização do notável Museu Vilar Formoso Fronteira da Paz – de que a História do Turismo, em Portugal, é indissociável da História do Holocausto.


A priori
parecendo tratar-se de temáticas desconexas, é, porém, de considerar o verdadeiro momento-charneira, da passagem por Portugal, em trânsito, de milhares de refugiados, a partir de Maio de 1940, entre judeus e outros fugitivos considerados indesejáveis pela Alemanha. Não só este factor, apesar de inesperado, deixou de ter consequências na estratégia consignada ao turismo pelo regime, como também se traduziu noutra realidade com a qual, eu próprio, me vim a confrontar no âmbito da investigação a que me tenho dedicado e que aliás referi noutro âmbito. (1)

O turismo não consiste somente em estatísticas, infraestruturas, proventos económicos. O turismo (e em consequência a História do Turismo), é hoje, cada vez mais, um fenómeno multicultural e interdisciplinar, que ultrapassa, em muito, o tradicional binómio atração-oferta vs. capacidade instalada. Os fluxos turísticos têm cada vez mais em conta o contexto sócio cultural em que se integram os visitantes. O turismo é por isso, acima de tudo, um factor de abertura ao outro, de aproximação ao que não conhecemos, não vivenciamos, não experimentamos. Falamos, em suma, de partilha, relativamente às diferenças civilizacionais, às crenças, aos hábitos, ao património imaterial que representa a cultura de um Povo. Falamos da aprendizagem da tolerância, que é hoje um dos mais ameaçados factores de cosmopolitismo.


A obra de Margarida Ramalho é disso um excelente exemplo, também de um percurso e de uma coerência temática, que levaram à total unanimidade na atribuição deste prémio, exemplo de uma investigadora que não enveredou por temas fáceis, de menor comprometimento com a realidade envolvente, ou de maior distanciamento relativamente a temas fracturantes da contemporaneidade, dos países e dos sistemas políticos do Séc. XX.


Ora creio que nada mais apropriado, do que a Fundação António Quadros, para também se abordar o turismo em função daquilo que foi, daqueles que tiveram uma visão de pioneiros, de uma actualidade que ainda não deixa de surpreender.

Foi António Ferro, como comentou o seu filho António Quadros, um «eterno enamorado da paisagem», um ideólogo do turismo «com base num sentimento da natureza», que escreveu, em 1949:

 

Entre as vantagens que devemos à paz (…) podemos e devemos contar, como uma das maiores, a propaganda natural que obtivemos a nosso favor, através da passagem forçada, pela nossa terra, que constituiu, para muitos, autêntica revelação, de estrangeiros de todas as qualidades e de todos os países. (…) Foi, sem dúvida, ocasião excepcional, talvez única na nossa história contemporânea, para os estrangeiros, que raramente vinham a Portugal, a esta ponta extrema da Europa, se aperceberem do nosso interesse, das nossas qualidades, qualidades da paisagem, do clima, e do homem (…). Mas não nos iludamos. Se tal deslumbramento se pode considerar, em grande parte justo, porque nasceu da natural surpresa em face da revelação dum país que se impõe pelo seu carácter, pela sua beleza, pela sua poesia, nem sempre visível mas sempre sensível, (ele) foi também proveniente do contraste, entre o inferno de onde saíam e o paraíso onde chegavam, e pela visão rápida, superficial, quase sonhada, do nosso País. (2)

 

Hoje sabemos que, para Ferro, esse mortificado contingente acarretou múltiplas preocupações, não só por parte de desconhecidos que, por diversos motivos, viram no Secretariado uma abertura contrastante com a de outros organismos, como por parte daqueles que se valeram de relações estreitadas em tempo de paz, caso de Stefan Zweig, por exemplo, intercedendo por sua mulher, não deixando Ferro, pessoalmente, de intervir também em casos que se podem considerar muito para além da esfera dos então famosos, poderosos ou socialmente bem relacionados. 

Apesar dos prováveis receios do regime, de que também viessem a inculcar novos hábitos, ou seja, a desestabilizar mentalidades e, como tal, os fundamentos da ditadura, curiosamente o país não recebeu estes refugiados como intrusos. E talvez isto ajude a explicar porque voltaram, ou ficaram, muitos estrangeiros, apesar das próprias condições de condicionamento a que foram submetidos por via do seu estatuto, bem como a existência de um relatório insuspeito, do Foreign Office, reportando a estrita neutralidade revelada por António Ferro, e a postura declaradamente aliadófila de sua mulher, Fernanda de Castro, ao longo da guerra.


É por isso, finalmente, que também me ocorre – ao rever o trabalho de Margarida de Magalhães Ramalho, designadamente o recente livro O Comboio do Luxemburgo, em co-autoria com Irene Pimentel – o seguinte trecho, neste caso de Sophia de Mello Breyner:

 

Quem procura uma relação justa com a pedra, com a árvore, com o rio, é necessariamente levado, pelo espírito de verdade que o anima, a procurar uma relação justa com o homem. Aquele que vê o espantoso esplendor do mundo é logicamente levado a ver o espantoso sofrimento do mundo. Aquele que vê o fenómeno quer ver todo o fenómeno. É apenas uma questão de atenção, de sequência e de rigor. E é por isso que a poesia é uma moral. E é por isso que o poeta é levado a buscar a justiça pela própria natureza da sua poesia.(3)

 

Para além da eventual, mas deslocada analogia com postulados neo-realistas, que na obra desta poetisa creio não se terem colocado, a distância que vai da prática da História à prática da literatura é bastante óbvia, a começar pela necessária objectividade e rigor inerentes à primeira. Mas creio ser facilmente compreensível o que se pretendeu dizer. 

Ao fim e ao cabo, no que respeita à actividade turística, também se pode e deve definir uma ética, uma moral, da mesma forma que esta se define, quando hoje se fazem campos de golfe onde a água não abunda, ou se descaracterizam centros históricos, desalojando residentes idosos, por exemplo, para rentabilizar alojamentos turísticos.

Notas

  1. Victorino, J. G. (2018). Propaganda e Turismo no Estado Novo: António Ferro e a revista Panorama (1941-1949). Lisboa: Alêtheia Editores.
  2. Ferro, A. (1949). Turismo: fonte de riqueza e de poesia. Lisboa: Edições SNI.
  3. Andresen, S. de M. B. (1968). Arte Poética III. In Antologia, 1944-1967. Lisboa: Portugália Editora.
 

02 – ASPECTOS DA AFIRMAÇÃO DA CULTURA VISUAL EM PORTUGAL: O PAPEL DE ANTÓNIO FERRO. DA ILUSTRAÇÃO PORTUGUESA AO ARQUIVO FOTOGRÁFICO DO SPN,
por Paulo Ribeiro Baptista.

 

Durante a década de 1920 e o início da de 1930 a cultura visual portuguesa sofreu uma profunda transformação, perceptível nos magazines ilustrados de grande circulação. Um dos primeiros traços dessa mudança terá sido o da renovação da Ilustração Portuguesa, em 1921, com um novo director, António Ferro, apoiado pelo jornalista e consultor Leitão de Barros.


À esquerda: António Ferro no seu gabinete de trabalho na «Ilustração Portuguesa», com o jornalista João Ameal no dia 8 de Outubro de 1921.


Traziam um programa visual modernizado que viria a ter continuidade noutros magazines ilustrados e em particular, desde 1927, no Notícias Ilustrado, com um figurino visual cosmopolita, em linha com os magazines ilustrados internacionais. 

Foi Ferro que, em Portugal, se aventurou primeiro num género de jornalismo com recurso exaustivo à imagem, quer com imagens sugeridas pela sua escrita quer com o uso da fotografia, muitas vezes só com legenda, como sucedeu frequentemente no Notícias Ilustrado

 

Porventura o ponto mais alto do jornalismo “visual” de António Ferro terá sido a longa entrevista a Salazar, publicada no Diário de Notícias em 1932.

O virtuosismo com que António Ferro soube ligar a escrita e a fotografia na construção de uma imagem para a figura praticamente “invisível” de Salazar, como sugeriu José Gil, ficou bem demonstrado, sendo inculcada num imaginário colectivo que, apesar de todas as mudanças políticas e dos anos volvidos, ainda subsiste, prova da força de uma propaganda visual assaz eficaz. Seria Ferro, já como director do Secretariado de Propaganda Nacional, em 1933 e, na sequência lógica desse percurso, a criar logo um arquivo fotográfico nesse departamento estatal, serviço que daria apoio à máquina de divulgação visual do regime até ao seu ocaso.

 

A partir de uma investigação realizada à crítica teatral portuguesa em jornais diários nos anos 1920 e início de 1930 (em parte levada a cabo na Fundação António Quadros) foi possível constatar que quer António Ferro, crítico do Diário de Notícias, quer José Leitão de Barros, crítico de A Capital, tiveram um papel de destaque na forma como essa crítica passou a considerar a dimensão visual como um aspecto determinante do espectáculo teatral. Juntos, os dois amigos tiveram ocasião de colaborar em várias circunstâncias e projectos, como sucedeu nos magazines Ilustração Portuguesa e Notícias Ilustrado. A dimensão visual no teatro, ou seja, na cenografia e nos figurinos, era uma das preocupações permanentes das suas críticas, nisso coincidiam e essa coincidência veio a tornar-se particularmente significativa quando juntos levaram à cena a peça "Knock ou a vitória da medicina" do dramaturgo unanimista francês Jules Roman no Teatro Novo, em 1925, e em que o domínio da visualidade mereceu particular destaque. Por isso a abordagem proposta centra-se em aspectos relacionados com essas áreas da cultura, do jornalismo, do teatro e da literatura.
(…)
Num percurso de mais de uma década, desde finais da década de 1910 e em parte desse percurso acompanhado e apoiado por Leitão de Barros, António Ferro cruzou diversos domínios criativos, jornalismo, teatro, ensaio, poesia, neles introduzindo uma dimensão de visualidade que estivera em grande medida ausente da sociedade portuguesa. Coincidência ou não, como julgamos, essa preocupação de Ferro com a visualidade surge na linha de um movimento do pensamento europeu que reflectiu sobre a natureza das imagens e o seu papel na sociedade e que esteve na base da criação dos estudos em cultura visual.

A pulsão visual de Ferro revelou-se desde muito cedo e marcou logo alguns dos seus primeiros trabalhos, conferências e entrevistas, tendo-se, a pouco a pouco, estendido a outros domínios. O jornalismo e o teatro foram particularmente importantes para a intervenção “visual” de Ferro, sobretudo pelo impacto social que alcançaram, medido na contestação causada. Efectivamente, a sociedade portuguesa não ficou imune a essa intervenção de Ferro e os seus efeitos fizeram-se sentir no desenvolvimento de uma cultura visual quer nos magazines ilustrados que proliferaram ao longo da década de 1920, quer na transformação “visual” que ocorreu no teatro e, em particular, na revista à portuguesa, com o concurso de muitos dos artistas modernistas que colaboraram quer nos magazines ilustrados, quer no teatro de revista, graças ao concurso de Ferro, enquanto os circuitos oficiais lhes estavam vedados.


No início da década de 1930, a capacidade de influência de António Ferro nos meios intelectual, cultural e político alargou-se muito e os seus editoriais no Diário de Notícias tiveram um grande impacto que culminou na famosa entrevista à figura até então relativamente obscura de Oliveira Salazar, verdadeiro marco na afirmação do Estado Novo em que a dimensão visual assumiu um papel de grande importância.


Todo esse contexto se tornou determinante quer para a escolha de Ferro para director do Secretariado de Propaganda Nacional, quer para a sua acção nesse organismo. Muitas das linhas de actuação do SPN seguiram preceitos já enunciados ou ensaiados por Ferro e onde a visualidade assumia um papel determinante. Assinale-se, em particular, a precoce criação de um arquivo fotográfico, instrumento fundamental da propaganda visual do regime.


Leia AQUI o texto completo publicado em «VISTA-revista de cultura visual», n.º 2, 2018, pp. 41/57.

 
03 LITORAL: REVISTA MENSAL DE CULTURA [LISBOA, 1944-1945] DIGITALIZADA,
por Hemeroteca Municipal de Lisboa.

 

Litoral: revista mensal de cultura foi publicada em Lisboa, entre Junho de 1944 e Janeiro-Fevereiro de 1945, num total de 6 números dirigidos por Carlos Queiroz e com orientação gráfica de Bernardo Marques. Fica a partir de agora disponível na Hemeroteca Digital e visível AQUI.

Tendo como pano de fundo a Segunda Guerra Mundial, em que a neutralidade portuguesa não poupou o país ao seu impacto, a revista assumia, no seu editorial de abertura, pretender tomar "posição perante o sistemático influxo de várias correntes ideológicas e doutrinárias difundidas entre nós, nos últimos anos, por todos os meios publicitários, quer em línguas estrangeiras, quer na nossa", resultando numa "despersonalização colectiva". Por outras palavras, intentava potenciar os "caracteres dominantes e virtudes intrínsecas" - e distintivas - dos portugueses, "uma maneira própria de sentir, pensar, criar e agir".

 

Quer do ponto de vista literário, quer do ponto de vista gráfico, a revista pautou-se pela qualidade dos seus colaboradores, onde pontuam nomes como os de Delfim Santos, Miguel Torga, Vitorino Nemésio, Afonso Duarte, Hernâni Cidade, António José Saraiva, Jorge de Sena, e Mário Eloi, António Dacosta, Olavo d'Eça Leal ou Ofélia Marques.

 

Saiba mais  AQUI a ficha história da «Litoral» preparada por Helena Roldão.

Nota: Exemplares também disponíveis para leitura em suporte de papel na Biblioteca da Fundação António Quadros em Rio Maior, colecção originalmente pertencente a António Quadros.
 
04 – AVEIRO, UMA SURPRESA DE COR VIVA NUM PORTUGAL DE VERDE-A-MATE
por Raul Proença Mesquita.

 

Conhecia Aveiro de passagem apenas pela sua estação, a caminho do Porto. Desta vez, no Verão, decidi apear-me e visitar a cidade. Depois de descer a pé a longa Avenida Dr. Lourenço Peixinho, antiga Avenida Central, sem grande interesse, a não ser pelo Edifício Avenida, antigo Cine Teatro Avenida, de traça pós Art déco, que relembra o Cinema e Teatro Monumental em Lisboa, agora um soturno centro Comercial, cheguei perto da ria. Começou o deslumbre! Cor, pontes ladeadas de flores, casas Arte Nova em belíssimo estado, gente a passear, esplanadas cheias, mas daquelas encostadas aos cafés, não no meio do passeio ou à beira da rua nem em quiosques, uma alegria de que já me tinha esquecido. E um sentimento estranho encheu-me. Era uma alegria de infância num certo sentido mas junta a outra mais tardia, a de a minha vida no exílio no princípio dos anos 1970, em sítios coloridos, sem que a mesma o fosse por força das circunstâncias. Cor, foi a primeira nota maior deste sítio. Seguiu-se-lhe a água da ria e as pontes.

Escolhi bem a época da visita, em pleno Verão, como aconselhado por Raul Proença, meu avô, no Guia de Portugal, obra de sua inspiração e arremesso. Jantei pouco depois. Tinha chegado tarde. Preferi um café-restaurante simples onde o canal vira à direita e comi bem na esplanada, a um preço muito agradável. Voltei a passear e sentei-me até a noite chegar, num outro, perto do meu hotel, para assistir, nesta sucessão de surpresas, a um faustoso fogo-de artifício que assinalava o fim do Festival dos Canais, que tinha decorrido durante essa semana. Assim se justificava aquela multidão de visitantes e de gentes locais. As crianças estavam entusiasmadas mas não gritaram. Dir-se-ia que a beleza desta terra não as deixava portarem-se mal. Ou, maldade minha na interpretação, estariam bem-educadas...


No dia seguinte, não muito cedo, não madrugo, visitei a Igreja da Misericórdia. Com a raridade de em Portugal se ver um frontispício renascentista, situa-se num belo largo barroco com palacetes dessa época, num silêncio que quase nos transporta para Rodrigues Lobo ou para o castelhano Lope de Vega. Lembrei-me deles embora o segundo seja muito vivo no seu teatro. O interior da igreja é bonito, equilibrado e sem ornamentação gongórica. Não levei o Guia de Portugal. Só o consultei em Lisboa a posteriori. A descrição desta igreja no Guia de Portugal, Beira I – Beira Litoral, deverá ter sido feita por Sant’Anna Dionísio, a quem coube continuar o Guia em Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, nos anos 1960. A sua descrição é tão diferente! Desde se referir a esta igreja como sendo “falha de elegância” e “dura e fria” até indicar o barroquismo (?) de uma fachada claramente renascentista, a escrita severa e, às vezes, falha de informação, de Sant’Anna Dionísio contrasta com a de Raul Proença nos primeiros volumes do Guia, na vivacidade contundente deste.


Ingressei de seguida adentro o bairro antigo, o que não custou muito debaixo do calor, sendo as ruas estreitas e com sombra. Almoço, de menu completo de €8, num sítio com duas portas de entrada, instalado num prédio antigo mas renovado no interior e frequentado por jovens. Boa comida, sem tabuleiros, com serviço à mesa. Comi uma alheira vegetariana e, a seguir, um pudim. Não me apeteceu a sopa, incluída. Água, só o vinho foi aparte porque se pediu uma garrafa. Éramos dois.


Perto da Igreja da Misericórdia cruzei-me com o Teatro Aveirense. Estava anunciada uma ópera. Ainda que a bilheteira estivesse fechada, dirigi-me à porta dos artistas e informei-me. Sim, iam passar Os Contos de Hoffmann, de Offenbach. E em Lisboa que poucas óperas há por temporada!


Mais tarde foi o passeio de barco. Não era um moliceiro, este era maior, foi-nos dito, e se alguma crítica faço a esta surpreendente terra é a de que não cheguei a ver nenhum dos famigerados barcos durante a minha estada. Por que será que não se veem? Mas vale a pena o passeio. A explicação é bem dada em três línguas e fica-se com uma ideia das embarcações e da cidade em geral, até da parte mais nova. Passou-se por casas de madeira coloridas e por um antigo armazém de bacalhau, agora restaurante desta inevitável iguaria portuguesa, ao lado de um armazém de sal, por sua vez ao lado de uma escola de dança, também eles todos de madeira, proporcionando uma vista linda e diferente do que é habitual. Noruega? Da parte nova, a guia salientou com orgulho: “o bairro mais caro de Aveiro”, na minha opinião, um género de construções Oriente-Vasco da Gama - Lisboa, porém, talvez, de melhor qualidade à vista, com relvados, situado para o interior da cidade, perto do Museu de Aveiro, mas sem a categoria do bairro barroco que percorri. 


No regresso desta digressão, visitei mais uma igreja, a bonita Igreja da Apresentação. Tem dois painéis de azulejos no seu exterior, que lhe dão uma graça sui generis pelo facto de lhe conservarem leveza e, no interior, sobre o actual branco de fundo, sobressaem três sumptuosos altares em talha dourada bem restaurada e polida. Ainda dois museus, o Museu da Cidade e o Museu de Arte Nova, pequenos, uma benesse às vezes, instalados em duas joias restauradas de Arte Nova. Outro belo jantar, desta vez num restaurante mesmo: um excelente ensopado de enguias.


No dia seguinte foi a vez de passear ao deus-dará e de comprar uns bolos para trazer. Está-se a ver, é claro: ovos moles!  Dei com um Centro Comercial, coisa de que não gosto, mas que me foi anunciado com brio ter sido o primeiro no país a ser construído a céu descoberto, o que melhora as coisas, verdade seja dita. As pontes em frente, ou vice-versa, dão graça. E, sempre, flores!


Almoço em frente ao cineteatro. Que pena não ser o cinema com dois ou três balcões que de certeza já foi. Que filmes de cowboys, que BBs, que Ginas Lollobrigidas, CCs, Elsas Martinellis, que sei eu! E almocei bem mesmo com saudades dos cinemas a que ia e que este me fez lembrar.


Falta a referência às pessoas. Não existe terra só com igrejas ou com ria ou com largos ou com manjares, há primeiro que tudo, embora aqui apareçam no fim, as pessoas. São simpáticas, frescas, acolhedoras. Nem todas autóctones, apercebi-me, mas a terra fá-las assim. Os horríveis tempos da Inquisição, que marcaram também esta cidade a ferro-e fogo, parecem, por que artes não sei, ter desaparecido da memória, não sei se pela beleza do local, se pela água nesta sua forma, se pelas flores postas por todo o lado, se pela mistura das gentes vindas ou se por algum misterioso acaso que a mim, pelo menos, não me foi dado até agora descobrir.  


A descrição de Aveiro por Sant’Anna Dionísio no Guia de Portugal, já que a intervenção de Raul Proença no Guia acerca desta cidade foi pequena, é ela tão virada para dentro, fruto de quem a escreveu, sem dúvida, Dionísio, homem taciturno e indecifrável que era, mas também, essa sua escrita, fruto de uma época e situação em que olhar para fora não seria aconselhável. Aveiro como eu a vi, cidade que não uma “Holanda meridional” nem uma “Veneza de Portugal” (in Guia de Portugal), talvez mais, se isso fosse preciso, uma Noruega com Arte Nova ao gosto do Sul mas em que o mais importante é que surge como uma cidade de alegria, de cores, de pessoas, de cultura, cidade aberta e onde apetece respirar. Poderá ser um exemplo para nós todos?


Aveiro: Postais pertencentes ao acervo da Fundação António Quadros.

 
05 VER TUDO: MÀMÍA ROQUE GAMEIRO (1901-1996), DESENHO E ILUSTRAÇÃO,
por Sandra Leandro.

 

A exposição «Ver Tudo: Màmía Roque Gameiro (1901-1996), desenho e ilustração» comissariada por Sandra Leandro estará patente na Casa Roque Gameiro apenas até 24 de Fevereiro de 2019.

A mostra tem por objectivo dar a conhecer a trajectória de Màmía (Maria Emília), uma das filhas do excecional aguarelista Alfredo Roque Gameiro.

Esta exposição retrospectiva tenta ver de perto o que Màmía fez, inclusivamente o invisível. Encontra-se disposta em duas salas e estrutura-se em cinco núcleos: «Màmía – modelo»; «Serenidade e silêncio: interior(es)»; «Pintar à luz do sol»; «Desenho e Ilustração: Màmía artística e científica» e «Naturezas-mortas, flores, folhas, conchas». O catálogo que acompanha a exposição, contém um estudo inédito, o primeiro realizado sobre a pintora. A mostra contará ainda com workshops, conferências e visitas guiadas. Além da sua pintura e ilustração exibem-se diversas obras a que deu origem como modelo. Observam-se, assim, trabalhos de Alfredo, Raquel e Helena Roque Gameiro, Mily Possoz, Cottinelli Telmo, Hebe Gonçalves Gomes e Jaime Martins Barata, com quem casou em 1926.


Recordando a programação da exposição Ver tudo em 2019, sublinha-se que existe um novo email para as actividades em que é necessária inscrição: 
museu.arqueologia@cm-amadora.pt.

PROGRAMAÇÃO DA ÚLTIMA ETAPA DA EXPOSIÇÃO:

19 de Janeiro, 15,30

Visita Guiada com Sandra Leandro (Comissária da Exposição). Gratuita, mas sujeita a inscrição para o endereço electrónico: museu.arqueologia@cm-amadora.pt. Limite: 20 participantes.

2 de Fevereiro, 15,30

Mesa redonda «Màmía por quem a conheceu» | Entrada livre. Participantes: Ana Mantero, Clara Ogando, Gonçalo Martins Barata, José Pedro Martins Barata, Pedro Cabral e Sandra Leandro (moderadora).

16 de Fevereiro, 15,30

Conferência | Entrada livre. As obras de encomenda estatal de Jaime Martins Barata (1899-1970) e a modernidade artística no Estado Novo. Jorge Costa (Doutorando da Université Paris-Sorbonne e FCSH, Universidade NOVA de Lisboa).

23 de Fevereiro, 15,30

Workshop. Por Tiago Costa. Modos de ver - o desenho e a aguarela como descoberta. Gratuito, mas sujeito a inscrição para o endereço electrónico: museu.arqueologia@cm-amadora.pt Limite: 15 participantes.




Local e contactos
Casa Roque Gameiro - 
Praceta 1.º Dezembro, 2 – Venteira (2700-668).
Telefone: 214 369 058 | Fax: 214 929 239.
38º45'28.9''N 9º14'31.8''W.

Horário

Terça a sábado, das 10 às 12.30 e das 14 às 17.30 | Domingo, das 14.30 às 17.30.
Encerramento: Segunda-feira. Aberto aos feriados. 
Entrada Livre.

 
06 – DELFIM MAYA E A LIBERDADE DE SER E DE CRIAR
por Maria José Maya

Delfim Maya, artista a que, no Livro de Honra da exposição “Esculturas de Delfim Maya”, realizada na Casa de Santa Isabel em Janeiro de 1934, António Ferro se referiu da seguinte forma: "Delfim Maia criou uma arte. Difícil fazer-lhe maior elogio. António Ferro".


No seu artigo "As esculturas em prata de Delfim Maya", publicado na «Ilustração
Grande Revista Portuguesa» n.º 195 a 1 de Fevereiro de 1984, Rogério Pérez refere que Há três semanas que o público estaciona em massa ante as montras da joelharia Leitão e admira com invulgar interesse as originais esculturas em prata que representam figuras e animais picadores e toureiros, varinas e bailarinas, touros, cavalos, cães, gatos e tigres, tudo com graça, movimento e expressão própria. […]

Leia AQUI o artigo de Maria José Maya, filha do artista publicado na revista «ARTIS ON», da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, n.º 7 cujo tema é "Arte e Poder".


Nota: As duas caricaturas de António Ferro, desenhos a carvão, aqui publicadas, pertencem a Maria José Maya, filha do escultor e o supra-citado Livro de Honra, bem como outros documentos, foi já doado à Biblioteca Nacional.
 
07 LIVRARIA ANTÓNIO QUADROS
Promoção do Mês.

 

Título: Delfim Santos e a Família Castro e Quadros Ferro.
Coordenação
Mafalda Ferro.
Organização, estudo introdutório e notas: Filipe Delfim Santos.
Prefácio: António Brás Teixeira.
Edição – Lisboa: Fundação António Quadros, 2011.
Arranjo gráfico e Capa: Mafalda Samwell Diniz.
Descrição: Correspondência trocada entre Delfim Santos e António Quadros, Fernanda de Castro e António Ferro; carta de José Osório de Oliveira para Delfim Santos; e outros assuntos de interesse.
PVP até 14 de Fevereiro de 2018: 10,00€.
PVP a partir de 14 de Fevereiro de 2018: 12,00€.

 
 
     
 
Apoios:
 
Por opção editorial, os textos da presente newsletter não seguem as regras do novo acordo ortográfico.

Para remover o seu e-mail da nossa base de dados, clique aqui.


Esta mensagem é enviada de acordo com a legislação sobre correio electrónico: Secção 301, parágrafo (A) (2) (C) Decreto S 1618, título terceiro aprovado pelo 105º. Congresso Base das Normativas Internacionais sobre o SPAM: um e-mail não poderá ser considerado SPAM quando inclui uma forma de ser removido.
 
desenvolvido por cubocreation.net