clique aqui se não conseguir visualizar correctamente esta newsletter
Newsletter Nº 172 / 14 de Maio de 2021
Direcção Mafalda Ferro Edição Fundação António Quadros
ÍNDICE

01 – Raul Proença, Amor e devoção de Portugal, por António Quadros.

02 –
Oitenta Anos da Morte de Raul Proença (1884 – 1941), por Raul Proença Mesquita.

03
Lembrando H. C. Andersen e o Dia Internacional do Livro Infantil, por Aníbal Seraphim.

04 – H. C. Andersen  e Germana Tânger, por Mafalda Ferro.

05
O «Diário de Lisboa», 100 anos depois, por Mafalda Ferro.

06
 Rua do Oiro, poema de António Ferro.

07 Livraria António Quadros, em promoções do mês, Portugal entre Ontem e Amanhã. Da Cisão à Revolução. Dos Absolutismos à Democracia, de António Quadros.

 

EDITORIAL,
por Mafalda Ferro

 

Dedica-se a presente newsletter, a Raul Proença (1884/1941), a Hans Christian Andersen (1805-1875) e ao «Diário de Lisboa» que lembramos muito especialmente cem anos depois do seu nascimento.

Em 1921, Raul Proença, com um grupo de intelectuais e amigos, fundou e dirigiu durante os seus primeiros anos a revista «Seara Nova» e foi, também, um dos colaboradores do n.º 1 do «Diário de Lisboa», duas efemérides que hoje lembramos, cem anos depois.
Agradecemos-lhe ainda, todos nós que tratamos bibliotecas e até arquivos, o trabalho por ele criado e desenvolvido sobre as regras de catalogação.

 

O Dia Internacional do Livro Infantil, celebrado no passado dia 2 de Abril, dia escolhido por ser o dia do nascimento do dinamarquês Hans Christian Andersen antecede o dia 1 de Junho, Dia Mundial da Criança. .


Celebrando estas duas efemérides e presenteando todas as crianças inclusive a que, acordada ou adormecida, existe em cada um de nós, lembramos este escritor autor de muitas dezenas de contos infantis que todos conhecemos e nos continuam a encantar seja em que forma nos cheguem. Os seus contos foram publicados em inúmeras edições e idiomas em todos os continentes, contados e recontados, lidos e relidos, ilustrados com pinturas, desenhos e bandas desenhadas, musicados e cantados, adaptados em prosa e em verso para peças de teatro, bailados e filmes.

Das suas histórias, saliento apenas algumas, talvez as mais conhecidas, «O Soldadinho de Chumbo» (1838) que serviu de inspiração à Disney para produzir «Toy Story» e a Fernanda de Castro para criar um poema por ela musicado; «O Patinho Feio» (1843), história de combate ao preconceito; «A Pequena Sereia», cuja personagem, exemplo de amor eterno, mereceu em 1913 a feitura por Edvard Eriksen de uma estátua em Copenhaga, na Dinamarca; e, quem não se lembra do famoso dito de uma criança no seu conto «A roupa nova do Rei» (1837), "O Rei vai nu!"?, sátira à vaidade e à soberba.

Postais ilustrados, acervo da Fundação António Quadros, Odense, Dinamarca, da esquerda para a direita
Casa onde nasceu H. C. Andersen (FAQ-01-01333-0003); Casa de H. C. Andersen. (FAQ-01-01629-0002); Casa-Museu H. C. Andersen. (FAQ-01-01629-0007); Retrato de H. C. Andersen. (FAQ/CA-POST/01405)

 
01 – Raul Proença. Amor e devoção de Portugal,
por António Quadros.

 

[Jaime Cortesão e Raul Proença] Foram correligionários e amigos. Ambos republicanos e democratas. Quando em 1919 Jaime Cortesão é nomeado por Leonardo Coimbra, então ministro da Instrução, para director da Biblioteca Nacional, já aí encontra Proença, que desde 1911 trabalhava como conservador. Leonardo encarrega-o de estudar a reorganização da Biblioteca, o que deu origem ao seu primeiro grande estudo, as “Regras de Catalogação».

Ao lado de Cortesão, de Aquilino Ribeiro, de António Sérgio, de Raul Brandão, de Afonso Lopes Vieira ou de Reynaldo dos Santos, entre outros, fez parte do chamado “Grupo de Biblioteca”, de cujo convívio nasceram numerosas iniciativas intelectuais, a começar pela «Seara Nova». Na «Seara», que ele e os seus amigos fundaram em 1921, desenvolveu uma intensa actividade de doutrinário e polemista, documentada em 1938 – 39 nos dois volumes das «Páginas de Política», publicados ainda em sua vida (m­. em 1942) e no livro póstumo, de 1964, organizado e prefaciado por Manuel Mendes, «Acerca do Integralismo lusitano (1964).

O polemismo de Proença foi a favor e foi contra. A favor de uma República democrática e liberal, uma República de homens bons, capazes de fundar, menos a sociedade da igualdade do que a sociedade da fraternidade, inspirada em valores morais, que teriam de ser heroicos, precisamente porque Raul Proença foi, pelo menos em todo o seu período activo e interveniente, um agnóstico senão um ateu. Mas um agnóstico ou um ateu profundamente idealista e veiculando valores do espírito, como é patente nos seus escritos sobre «Lealdade de Consciência e a Existência de Deus» ou o «Evangelho para uma acção Idealista no Mundo Real». Quem melhor estudou a obra do doutrinário seareiro foi Sant’Ana Dionísio, que em 1949 lhe dedicou o excelente livro intitulado «O Pensamento especulativo e agente de Raul Proença».

O grande ataque polémico de Proença faz-se sobretudo contra os integralistas, numa época em que fazia furor ainda a batalha de ideias entre os republicanos triunfantes e os monárquicos, vencidos mas não convencidos. Se nesta época, a «Seara Nova», Proença, Sérgio, etc., são os teorizadores intelectuais da República democrata, de outro lado, a Nação Portuguesa de António Sardinha, Monsaraz, Luís Almeida Braga, Pequito Rebelo, etc., pugnam pela restauração monárquica, afirmando um nacionalismo tradicionalista, que Proença acusa de passadista e estrangeirado, visto que se fundamenta principalmente nos doutrinários franceses, a começar por Charles Maurras. Á distância, dir-se-ia que ambos tinham razão: Proença em apontar (talvez em excesso), a fragilidade teorética do pensamento integralista e em insistir na necessidade de uma “tradição dinâmica” no lugar de uma “tradição imobilista ou anquilosada” (1); Sardinha e os integralistas em advertir profeticamente contra os riscos da descaracterização nacional e contra o abandono de certas linhas e constantes da estrutura cultural portuguesa. À época, a paixão politica não deixou ver claro que, para além do antagonismo, havia pontos de diálogo possíveis.

E, Raul Proença sobretudo, ao contrário de um Sérgio, era de entre os republicanos seareiros, aquele que, em vez de negar o nacionalismo e o tradicionalismo antes os queria fazer evoluir, embora dentro de instituições democráticas e em novas perspectivas de futuro, segundo valores de liberdade e de progresso. Há muito de conjuntural e epocal no polemismo e no pensamento de Proença, que aliás, na última fase da sua vida, parece ter caminhado para uma superação do ateísmo e do agnosticismo entre os quais balançou durante muito tempo, em direcção a um espiritualismo de que dá sinais nas suas meditações sobre «A Hipótese do Eterno Retorno», que realizou a partir da leitura de Nietzsche, que estão em grande parte ainda inéditas.

Bastaria contudo a iniciativa e a direcção de uma obra como o «Guia de Portugal», em que teve a colaboração de intelectuais de todas as tendências (desde Aquilino a Lopes Vieira, desde Sérgio a Raul Lino, desde Raul Brandão a António Sardinha, desde Faria de Vasconcelos a Cortesão), para justificar o juízo “de notável Português” que lhe atribuí, a par daquele último. É que o «Guia de Portugal» foi um trabalho do mais ardente e fecundo patriotismo, ao responder á distância de dois séculos (como se pode ler na epígrafe da obra), á celebre asserção de Montesquieu, segundo a qual “os Portugueses tinham descoberto o mundo, mas desconheciam a terra em que nasceram”.

Temos todos, é preciso dizê-lo, uma profunda dádiva para com Raul Proença, pois abriu caminhos que nós nem sequer soubemos percorrer até ao fim. Disse o escritor no prefácio do primeiro volume do «Guia de Portugal», que ele foi feito” pelo amor e pelo espírito de veracidade de alguns Portugueses para conjurar e adjurar a infinita piedade portuguesa” (2), acrescentando, a terminá-lo que gostaria de vê-lo no futuro conhecido como o “Livro do Amor e Devoção de Portugal”.

Foi doente, mentalmente perturbado e desiludido que Raul Proença acabou os seus dias. Teria sem dúvida gostado de saber que algumas dezenas de anos depois, um escritor de outra, mas não antagónica linhagem, lhe dava as mãos e lhe prestava esta homenagem, breve, modesta mas sincera. [Em FAQ/02/0345/00003, série «Artigos publicados na imprensa]

 

Notas Finais:

(1) Raul Proença, «Páginas de Política», 2ª série, Ed. Seara Nova, Lisboa, 1939, pp. 26 e seguintes.

(2) «Guia de Portugal», 1.º vol., Ed. da Biblioteca Nacional, Lisboa, 1924.

 
02 – OITENTA ANOS DA MORTE DE RAUL PROENÇA (1884 – 1941),
por Raul Proença Mesquita

 

Nasceu nas Caldas da Rainha em 10 de Maio de 1884 e morreu no Porto em 20 de Maio de 1941. Celebram-se agora os oitenta anos da sua morte. Escritor, jornalista, filósofo e panfletista português, não se cansou de lutar pela liberdade de acção e de consciência. Membro da Renascença Portuguesa, colaborou na Águia, ao lado de outros inetelectuais da época, na Alma Nacional e foi membro fundador da Seara Nova.

Na Seara Nova, em 5 de Novembro de 1921, Raul Proença afirmou bater-se por: 

"Um patriotismo prospectivo – e não um patriotismo retrospectivo; As necessidades vitais do presente – e não as tradições mortas do passado; A actividade inteligente de cada dia e não o sensibilismo vibrando no puro vácuo da acção.”


Mas o meu avô não negou o passado, não o interpretemos mal. Se não, vejamos: Criou o Guia de Portugal dedicado às suas gentes, às terras mas também aos monumentos que perduram pelos tempos. Nota-se o seu idealismo filosófico subjacente na necessidade de fundamentar a ação.


Foi, assim, o impulsionador do Guia de Portugal para o qual escreveu inúmeros artigos. 
A obra continuou depois da sua morte entregue a Sant’Ana Dionísio pela minha avó Teolinda e editada pela Gulbenkian. Para além do seu pensamento e acção políticos (V. ginas de Política), dedicou-se à filosofia na obra O Eterno Retorno.

LEGENDA DA IMAGEM À ESQUERDA: O grupo da Seara Nova, que em Outubro deste ano celebra o seu centenário. Da esquerda para a direita, sentados: Jaime Cortesão, Aquilino Ribeiro e Raul Brandão; de pé: Teixeira de Vasconcelos, Raul Proença e Câmara Reis. Raul Proença foi Director dos Serviços Técnicos da Biblioteca Nacional, Bibliotecário, revolucionando os meios de catalogação, que foram copiados na época por vários países da Europa.


Democr
ata, participou na Revolução do 7 de Fevereiro de 1927, que tinha começado no Porto e que abortou. Este facto levou-o ao exílio, primeiro a Madrid, depois a Paris onde a família se lhe juntou, vivendo uns tempos em Saint Germain-em-Laye para depois regressarem a Paris à Convention. Em Madrid, recebeu uma carta do Rei Afonso XIII em que este o convidou a ir ao Palácio Real receber uma condecoração pelos seus conhecidos trabalhos inovadores de Bibliotecário e pelo Guia de Portugal. Reconhecido, mas Republicano que era, respondeu também por carta a Sua Majestade, a dizer que agradecia a honra mas que não podia recebê-la. Dias depois, no sítio onde estava hospedado, apareceu um lacaio do rei com a condecoração numa caixa, sobre uma almofada de veludo. O meu avô, perante esta amabilidade, não pôde recusá-la. Excepto este momento, o resto foi trabalho e tristeza. Deixou uma vida confortável para um exílio incerto que o transportou a uma depressão ao ver que arrastara a mulher e as filhas para uma vida mais difícil. Tinha também deixado a filha mais velha em Portugal, que não pôde viajar por estar gravemente doente. Morreu pouco tempo depois aos dezasseis anos. Mas a fibra do meu avô era a de um homem que não abdicava dos seus princípios/ideologia. 

 
Notas pessoais

Quando o meu avô andou na clandestinidade, depois do falhanço da Revolução do 7 de Fevereiro, acolhido, soubemos mais tarde por Raul Brandão, aconteceu que um homem todo de preto, discreto, diria, apareceu na Av. de Berne e disse à minha avó que era muito amigo do avô e que queria ajudá-lo. A minha avó respondeu-lhe que conhecia todos os amigos do marido e acrescentou: “Olhe, não sei onde está mas se soubesse não lhe diria.” Dirigiu-se à campainha do escritório, chamou a criada e disse: “Acompanhe este senhor à porta”.

Outra nota.
Nunca conheci o meu avô mas a avó, mãe e tias, sobretudo a avó, davam-me alguma ideia. Contava-me que “Ali, naquela cadeira, sempre naquela, sentava-se a Florbela Espanca”, que, segundo a minha avó, teria tido um béguin, e só isso, pelo meu avô; “aqui sentava-me eu até às 4 da manhã a ajudar o teu avô a trabalhar. Também fumava às vezes! Ele fumava muito.” 


Sobre o seu internamento no Hospital Conde Ferreira, silêncio total.
Esteve internado desde o regresso de França em 1932 até 1941 com alguns intervalos em que vinha a Lisboa, onde chegou a conhecer o primeiro neto acabado de nascer em 1939. Foi sujeito a tudo, a uma lobotomia por Egas Moniz e a coisas que se fazem, parece, nas grandes e famosas clínicas, segundo consegui apurar como peças de puzzle que primas e conhecidos mais velhos me indicaram, alguns intelectuais, que me dispenso de nomear. Uma coisa é certa – não me foi dita pela família – disse: “tirem-me daqui, não sou um criminoso; acorrentam-me!” Resposta da enfermeira: É para seu bem!” Será que as coisas mudaram? Bem, a hospitalização do meu avô sempre era um descanso para o Salazar... Outra, essa sim, contada pela família, que não lhe quis dizer, com a conivência dos médicos, que a filha mais nova, com apenas quinze anos, tinha morrido num sanatório perto de Coimbra, para não o excitar. Estava-se em 1935. Ora, no quarto do Hospital ele tinha uma telefonia e nas notícias ouviu: “Morreu hoje de manhã a filha mais nova de Raul Proença, o impulsionador do Guia de Portugal...”


Morreu no dia 20 de Maio de 1941, faz agora oitenta anos, vítima de uma pneumonia.

Que pena não ter conhecido o meu avô!

 
03 LEMBRANDO HANS CHRISTIAN ANDERSEN E O DIA INTERNACIONAL DO LIVRO INFANTIL,
por Aníbal Seraphim.

 

Que tem de especial o dia dois de Abril? Tem algum significado para que não possa passar ao lado do verdadeiro propósito que representa? Por que será tão importante esse dia?

A resposta encontra-se na vida e obra de Hans Christian Andersen. A data escolhida para assinalar o Dia Internacional do Livro Infantil é a do nascimento desta proeminente figura de vários atributos, deixando-os como legado à humanidade, a dois de Abril de 1805.

Sobre esta personalidade ainda hoje incidem alguns estudos que permitem concluir que se trata da primeira voz a contar histórias para as crianças, cujos temas expressavam os padrões de comportamento vividos naquela época, do qual o autor procurava que a sociedade que emergia adoptasse a ideia de que todos os homens deveriam ter direitos iguais.

Elevar à leitura infantil confrontos entre "poderosos" e "desprotegidos", "fortes" e "fracos", "exploradores" e "explorados", são de facto valores que se forem incutidos na formação infantil, poderão traduzir-se num mundo mais equitativo.

Sendo que o autor viveu entre 1805 e 1875 e foi o principal impulsionador de tentar formar os mais jovens para um futuro mais promissor, através da escrita de contos, é justo que o dia escolhido para assinalar a data seja a do seu nascimento.

E se porventura se pensar que é “apenas mais um dia que se celebra”, afinal é uma data extremamente importante.

Dada a importância sobre a sua vida e obra, vários historiadores e investigadores têm estudado o seu percurso. Sabe-se que teve origens numa família humilde, mas especula-se que seria filho ilegítimo do Rei Cristiano VIII da Dinamarca.

Legalmente o seu pai e educando foi Hans Andersen, um sapateiro que viveu apenas 33 anos, e sua mãe, uma lavadeira de nome Anne Marie Andersdatter. Se ficou sem pai aos 11 anos e ficou sem mãe ao 28, tendo apenas uma meia-irmã que faleceu em 1846, originou que a sua infância fosse marcada pela pobreza, pois com a morte do pai abandonou a escola e foi trabalhar como aprendiz de tecelão e mais tarde para um alfaiate.

O seu pai teve um importante papel na sua formação, pois apesar de não saber ler nem escrever, memorizou peças de Shakespeare e As Mil e Uma Noites, e de brinquedos rudimentares fez espectáculos de marionetas para o filho, incutindo-lhe o gosto pelas artes. Assim, aos 14 anos conseguiu ingressar no Teatro Real da Dinamarca antes de se dedicar à escrita.

Os estudos sobre a sua obra continuam até aos dias de hoje e por vezes ainda surgem alguns inesperados trabalhos.

Apesar de ter falecido a 4 de Agosto de 1875, a última obra inédita atribuída ao autor foi descoberta em meados de 1920 na Real Biblioteca da Dinamarca, pelo escritor Hans Brix, intitulada: “Levnedesbog”, com tradução para Português: "O livro da minha vida".

Mas se parece surreal que essa obra tenha sido encontrada 45 anos após a sua morte, ainda mais surpreendente é que em 2012 foi descoberto pelo historiador dinamarquês Esben Brage, um manuscrito do autor com o título em dinamarquês: Tællelyset, traduzido do original como: “A Vela de Sebo”.

Este manuscrito amarelado encontrado no fundo de uma caixa, foi objecto de estudo durante dois meses e anunciado como sendo o seu primeiro conto.

Apesar da sua vasta obra, chegando aos 168 contos, confessou que tinha aversão aos estudos, contudo ingressou na Universidade de Copenhaga em 1828. Um ano mais tarde, os colegas afirmaram que dada a sua excentricidade, nada de bom resultaria dos seus estudos, no entanto, alcançou reconhecimento internacional em 1835, quando lançou o romance “O Improvisador”, fruto das suas viagens pela Europa, neste caso a Roma.

A sua obra não se pautou apenas pelos contos infantis, escreveu vários romances para adultos, livros de poesia, relatos de viagens e peças de teatro, na época que esteve no Teatro Real em que também foi actor e bailarino.

Actualmente, o mais importante prémio internacional literário infanto-juvenil, tem o nome de “Prémio Hans Christian Andersen”, e anualmente a International Board on Books for Young People (IBBY) premeia com a Medalha Hans Christian Andersen os melhores trabalhos desse género literário.

H. C. Andersen foi também um dos maiores viajantes da sua época, tendo deixado um enorme legado de relatos. Portugal não foi excepção nas suas viagens e esteve por terras lusas entre 6 de Maio e 14 de Agosto de 1866.

Dessa viagem deixou uma obra intitulada: “Uma Visita em Portugal em 1866”, constituindo o volume 27 das Obras Completas publicadas em 1868.
Por consulta na Biblioteca Nacional, sabe-se que esteve em Lisboa, Setúbal, Aveiro, Coimbra, Sintra e na zona de Troia. Durante a sua estadia escreveu inúmeros relatos e fez várias pinturas.
A visita a Portugal foi protagonizada e acolhida pela família O’Neill numa história que começou ainda nos tempos de juventude, em que José e Jorge O'Neill travaram conhecimento com Andersen em Copenhaga, antes mesmo do seu reconhecimento, tendo-se concretizado a viagem já o autor tinha 61 anos.

Ainda na consulta à Biblioteca Nacional, reproduzimos um verso que o autor escreveu no álbum da Senhora O'Neill:


«Quando, querendo Deus, em breve passear

Nas galerias de faias do meu país natal,

Voará muitas vezes meu pensamento

Para o belo país que é Portugal».

 
04 – GERMANA TÂNGER E HANS CHRISTIAN ANDERSEN (H. C. Andersen),
por Mafalda Ferro.

 

Em 1866, a convite do seu amigo Jorge O’Neill, H. C. Andersen visitou Portugal e durante os cerca de três meses da sua estadia, escreveu pormenorizadamente sobre os locais que conheceu e de que mais gostou. Ainda no mesmo ano, de volta à Dinamarca, viria a publicar estes registos com o título Uma Visita em Portugal em 1866.

É sobejamente conhecida a forte ligação de Maria Germana com Sintra iniciada na década de Setenta do Século XX. Nesse concelho, organizou inúmeras actividades culturais e foi em Sintra que viveu na fantástica casa habitada por Andersen entre 16 de Julho e 8 de Agosto do ano da sua estadia em Portugal.

Sabe-se que ao longo da vida, Germana Tânger conviveu e esteve ligada a diversas actividades com crianças, através das Guias de Portugal e do ensino mas, terá sido na sua casa de Sintra que nasceu o verdadeiro fascínio por Andersen?


De acordo com cartas preservadas na Fundação António Quadros, em 1988, com o apoio de Mário Gomes Marques, presidente do Instituto de Sintra e da Câmara Municipal, Germana Tânger arquitectou uma homenagem ao contista para a qual se propôs teatralizar um dos seus contos.


Assim, no dia 4 de Agosto de 1989, celebrando o 114.º aniversário da morte de Hans Christian, Maria Germana abriu as portas da sua casa de Sintra, conhecida por Casa do Adro ou Casa de Santa Maria na Calçada dos Clérigos n.º 9, a diversas personalidades e amigos. Axel Buus, Embaixador da Dinamarca em Portugal descerrou uma placa evocativa e, ao serão, ao sabor do vinho de Colares, e das palavras de António Torrado, Germana Tânger, Axel Buus e Fernando Tavares de Carvalho Presidente da CM de Sintra, 
apreciou-se uma Mostra de fotografias e obras do contista, preparada pela anfitriã. Alunos de teatro e jovens de Sintra interpretaram «O Sino», conto de Andersen.

Constituindo um simples lugarejo, acima de Sintra, entre rochas e verduras, está Santa Maria, em cujos arredores, sob altas árvores, José O'Neil tinha a sua casa de campo, meu novo lar. Um largo terraço com jardim suspenso e envidraçado dava para a estrada que passava serpenteando entre a vila e a grande casa da vizinhança.

Hans Christian Andersen, 1866.

 

Não é portanto de estranhar que, quando em 1993 Germana Tânger visitou a Dinamarca e os muitos amigos que lá viviam, se tivesse aproximado ainda mais da memória de quem sempre admirou: H. C. Andersen. Acompanhada pelos amigos, Susana V. Louro Pedersen e seu marido, o pintor, escultor, desenhista Carl-Henning Pedersen. Carl-Henning  – conhecido como o «Hans Christian Andersen da pintura» já que as suas coloridas e imaginativas obras nos transportam para o imaginário dos contos de fadas –  Maria Germana conheceu finalmente a terra-natal do seu contista preferido e algumas das estátuas que lhe foram dedicadas.

Diz-se que todo o estrangeiro poderá encontrar em Sintra um pedaço da sua Pátria. Eu descobri a Dinamarca.

Hans Christian Andersen, 1866.

 

De regresso a Portugal, Maria Germana continuou sempre em contacto com os amigos dinamarqueses, sem nunca esquecer H. C. Andersen e sem que eles a esquecessem.

LEGENDAS
- Fotografia de Germana Tânger com Carl-Henning Pedersen, marido de Susana Louro Pedersen, ao lado da estátua de H. C. Andersen, Copenhaga, Dinamarca, Maio de 1993 (FAQ/06/0002/06895).

- Postal de Gerda [Haven], Odense, Dinamarca, 1992.02.26, para Germana Tânger (FAQ/ 01/1629/00007).
- 2 Postais de Preben Haven (pintor) e Gerda cujo texto se completa, Odense, Dinamarca, 1998.07.06, para Germana Tânger (FAQ/01/1629/00002).
- Postal de Susana V. Louro Pedersen, Dinamarca, 2000.03.13, para Germana Tânger (FAQ/01/1333/00003).

 

05  O «DIÁRIO DE LISBOA», 100 ANOS DEPOIS,
por Mafalda Ferro.


Fundado pelo banqueiro António Vieira Pinto, sob a direcção (até 1956) de Joaquim Manso, o primeiro número do «Diário de Lisboa» foi publicado há 100 anos no dia 7 de Abril de 1921.

António Ferro e Almada Negreiros estreiam o jornal publicando o poema "Rua do Oiro" de Ferro sobre ilustrações de Almada. Fernanda de Castro (ainda assinando Maria Fernanda de Castro Quadros) marca presença com uma entrevista a Virgínia Vitorino.

Colaboram ainda neste número inicial Aquilino Ribeiro (primeira parte da novela «O Esconjuro»), Afonso de Bragança (Chá das cinco); A. F. (Os Consagrados); e alguns autores de textos não assinados que se acredita terem sido escritos por Joaquim Manso ou/e Tomás Ribeiro Colaço.

Em 1990, ano da extinção do «DL», como despedida, Marina Tavares Dias reconstrói os primeiros dias do jornal em "Diário de Lisboa, logotipo da memória" referindo as aventuras e os primeiros tempos vividos nas primeiras instalações (provisórias) da redação do «DL» na Rua do Carmo, antes da sua transferência para a Rua Luz Soriano no Bairro Alto:

Os quartos são acanhados, o acesso à rua é feito por escada íngreme de degraus carunchosos. De noite, os ratos cruzam-se debaixo das bancas dos redactores e sobre a "mesa da estiva" onde ao centro da sala mais larga são revistas as provas tipográficas. Almada Negreiros tem um estirador nessa sala. Para o primeiro número do jornal, traça a tinta-da-china o destino adivinhado de um vespertino de vanguarda. São esboços da vida contemporânea: carros eléctricos, mulheres de saia curta em pena baixa, luvarias da moda, casas de chapéus. António Ferro escreve um poema sobre estas ilustrações. Ao alto da terceira página em título garrafal, como um segundo logotipo, manda compor: "Rua do Oiro". Na página nobre do primeiro número, Almada e Ferro assinam, juntos, uma opção do próprio fundador: falar da modernidade, divulgar a poesia, dar emprego aos ilustradores e privilegiar temáticas olisiponenses.
Ferro e Almada serão presença constante no «DL» de Joaquim Manso e Alfredo Vieira Pinto. […]

Texto muito Interessante!
Nas suas Memórias, Fernanda de Castro recorda:

O António Ferro olhou-me perplexo e creio bem que foi nesse momento que resolveu vencer, custasse o que custasse, a minha resistência, nem que para tal fosse necessário – sei lá! – pedir-me em casamento. E foi o que ele fez alguns meses depois, quando, colaborando ambos no «Diário de Lisboa» desde o primeiro número, uma convivência quase diária nos aproximou limando as arestas, isto é, tornando-o a ele mais moderado, um pouco menos combativo, e a mim bastante mais compreensiva, mais indulgente para o seu panache, a sua irreverência, o seu espírito de contradição.

O «DL» continuaria durante quase 70 anos a acompanhar o panorama cultural (e não só) português. A título de curiosidade, das dezenas de milhares de artigos que podem ser consultados no arquivo da Fundação António Quadros e cuja descrição está disponível no seu Sítio, lembramos aqui um pequeno exemplo dessas publicações:

 

1922.11.15, Evolução de um artista: António Ferro estreou-se no Brasil como autor e como actor, o que diz o jornal «A Plateia» da cidade de S. Paulo no Brasil.

1923.07.12, António Ferro escreve uma carta à actriz Lucília Simões.

1924.03.15, A Alma duma artista: uma página de confissões da poetisa Virgínia Vitorino, por Artur Portela.

1927.05.25, Augusto Cunha, Advogado, participa a mudança de escritório para a Rua do Ouro, 210, 2.º.

1927.08.13, Foi preso o jornalista António Ferro", implicado no golpe dos Fifis.

1928.11.05, Uma audaciosa tentativa de pintura modernista da Sr.ª. D. Sarah Affonso.

1930.08.09, Uma associação de humoristas: em casa de ferreiro….

1932.11.25, À Margem de uma conferência: Um ponto no i do futurismo - os futuristas portugueses e a visita de Marinetti, por Almada Negreiros.

1933.07.01, O Dr. Salazar e os Artistas, por Augusto Ferreira Gomes.

1936.04.27, Em resposta: O cruzeiro de férias às Colónias e a propaganda que dele resultou, por Augusto Cunha.

1956.11.22, Morreu António Ferro, jornalista, escritor, diplomata – e principalmente homem de acção.

1956.12.06, Lisboa, António Ferro: Desejamos combater o analfabetismo para português ler e não para inglês ver.

 
06  POEMA «RUA DO OIRO»
por António Ferro.

Rua do Oiro, rua dos metais! | Mazantini de luz, o sol, ao alto…

Bailes russos deslizam no asfalto… | Cantam em coro os vidros e os cristais!


Os teus passeios, como eu sei cantá-los, | 
São largos tabuleiros de xadrez,

Onde os pés das mulheres, muita vez | São reis, rainhas, torres e cavalos…


Nas montras dos livreiros, os poetas, | 
Com seus lábios, nos livros, entreabertos,

Dizem sonetos graves, muito certos, | Na sua voz sinistra de profetas…


Horrendas, pela tarde, como espumas… | Os chapéus, nas vitrines, são cabeças,

Degoladas… O' frívolas condessas, | Vós não tendes miolos, tendes plumas…


Parques nas sedas!... Há jardins nas chitas… | 
Enforcam-se nas hastes de metal

As éticas gravatas … Em caudal, | O sangue corre aos metros, pelas fitas…


A' entrada daquela luvaria | 
Há certa mão que me parece morta…

O' mão morta a bater àquela porta, | Em poentes de chuva e ventania…


Nesta perna de vidro tão humana, | 
Há tanta carne em suas meias ternas,

Que eu grito ao ver passar certa mundana: | São taças de cristal as tuas pernas!...


Sorriem pó de arroz os perfumistas… | 
Numa loja, acolá, vejo em tropel,

Rolos de telas, blocos de papel: | Roupa branca da alma dos artistas…


Nos ignóbeis balcões dos camiseiros | 
Há bacanais de meias e espartilhos …

As bonecas de cera, nos barbeiros, | Dão à luz cabeleiras, como filhos…


Nos alfaiates jazem manequins, | 
Ossadas, afinal, dos nossos fatos…

Pelas confeitarias, os pudins, | Desfalecem, anémicos, nos pratos…


Nas tabuletas brancas – cemitérios | 
As letras negras, altas, muito esguias,

São cipreste, são sombras, são mistérios, | Almas dum outro mundo em noites frias…


Órgãos de Barbaria desarmónicos, | 
Estes carros eléctricos tão belos…

Ruidosos, barulhentos, filarmónicos, | Passam na Tarde em risos amarelos…


Rua do Oiro – palco da cidade, | 
Há bastidores em todas as esquinas…

Bebés, balões, senhoras e varinas, | Militares, cocotes, alvalade…


Os meus olhos – as hastes da tesoura | 
Recortando as imagens d’Epinal,

Pelos passeios desta rua fora… | Rua do Oiro – humano Carnaval…

 
07 – LIVRARIA ANTÓNIO QUADROS

Promoção do mês.

AUTORIA: António Quadros.
TÍTULO: Portugal entre Ontem e Amanhã. Da Cisão à Revolução. Dos Absolutismos à Democracia.
EDIÇÃO: Lisboa, Sociedade de Expansão Cultural, 1976.

PREÇO DE PROMOÇÃO: 8,00€

 
 
     
 
Apoios:
 
Por opção editorial, os textos da presente newsletter não seguem as regras do novo acordo ortográfico.

Para remover o seu e-mail da nossa base de dados, clique aqui.


Esta mensagem é enviada de acordo com a legislação sobre correio electrónico: Secção 301, parágrafo (A) (2) (C) Decreto S 1618, título terceiro aprovado pelo 105º. Congresso Base das Normativas Internacionais sobre o SPAM: um e-mail não poderá ser considerado SPAM quando inclui uma forma de ser removido.
 
desenvolvido por cubocreation.net