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Newsletter Nº 183 / 14 de Abril de 2022
Direcção Mafalda Ferro Edição Fundação António Quadros
ÍNDICE


01 – Augusto Cunha, o mais ignorado da geração d’Orpheu, por Mafalda Ferro.

02 – “António Ferro e o Heroico Cinema Português!” (obra lançada no Porto a 1 de Abril), por Carla Ribeiro.

03 – Rubinstein, Silva Pereira e a “Música como Forma de Ser”, 110 anos depois do nascimento do Maestro Joaquim da Silva Pereira, por Manuel Silva Pereira

04 – Delfim Maya: uma exposição, uma inauguração e um pouco de história, por Mafalda Ferro.

05 – «Pinharanda Gomes, historiador do pensamento português». Mostra na BNP. Divulgação.

06 – Catálogo da exposição «Ruy Belo: História pequena de um Grande Poeta», por Fundação António Quadros.

07 – Livraria António Quadros. Promoção do mês – Obras de Augusto Cunha: Contos escolhidos e Os Meninos d'oiro. Vaudeville.


EDITORIAL,

por Mafalda Ferro

 

Prestamos hoje homenagem a duas grandes figuras pela obra que realizaram e pelas qualidades humanas e profissionais que sempre demonstraram:
Augusto Cunha (10 de Abril de 1894 / 18 de Abril de 1947) no mês do seu nascimento e da sua morte; 
Joaquim da Silva Pereira (1912-1992), 110 anos depois do seu nascimento.

ESTE ANO ENTREGAMOS DOIS PRÉMIOS ANTÓNIO QUADROS - 2021 e 2022

Como se sabe, o Prémio António Quadros (PAQ) Música Popular foi atribuído a José Cid mas, em virtude da pandemia que se instalou em Portugal em 2020/2021 (coronavírus), só foi possível entregá-lo em Novembro de 2021.


Apesar de já se ter escolhido a categoria para 2021, o processo de atribuição e entrega do PAQ 2021 foi adiado para este ano, 2022. Assim, para acertar o passo, os Prémios 2021 e 2022 serão entregues no mesmo dia em cerimónia conjunta.


Tendo presente a importância de juntar os dois processos sem que qualquer deles perca a sua importância ou identidade própria, optou-se por convidar a assumir a Presidência dos dois prémios uma personalidade única, alguém com sólidos conhecimentos, experiência e capacidades nas duas categorias.


A personalidade escolhida foi Margarida de Magalhães Ramalho que, por sua vez, completou o júri com os vogais Henrique Cayatte e Margarida Belém. [As suas notas biográficas bem como os dois regulamentos podem ser consultados no Sítio da Fundação António Quadros],


Categoria do PAQ 2021 –
Face à incontestável importância de António Ferro na promoção da Arte Moderna em Portugal durante o primeiro período do Estado Novo, bem como a sua estreita relação com artistas e movimentos artísticos como os do Orpheu e da Semana de Arte Moderna de S. Paulo, a categoria em 2021 é, em sua homenagem, «ARTE». O prémio será entregue a uma obra literária publicada num dos dois anos que antecedem ao da atribuição do PAQ.

Categoria do PAQ 2022 – Face à intensa e profunda acção, estudos, lições e publicações de António Quadros sobre Portugal, sobre a sua História, mitos e tradições, a categoria em 2022 é, em sua homenagem, «HISTÓRIA». O prémio será entregue a uma obra literária publicada num dos dois anos que antecedem ao da atribuição do PAQ.

O Júri encontra-se presentemente em fase de análise e deliberação de publicações que obedeçam aos requisitos patentes em cada um dos regulamentos.


RUY BELO

Publicamos hoje o catálogo da exposição  «Ruy Belo: História pequena de um Grande Poeta» que esteve patente em Rio Maior entre 11 de Fevereiro e 21 de Março.


Aproveitamos para rectificar uma informação que por lapso foi publicada incorrectamente na penúltima newsletter, (n.º 181) na biografia de Ruy Belo:

Apesar de ter feito parte da Opus Dei durante cerca de dez anos, Ruy Belo vai-se afastando da Igreja, chegando mesmo a riscar dos seus anteriores manuscritos a palavra "Deus" substituindo-a por valores em que acreditava como "Liberdade" ou "Justiça". Nenhum dos seus filhos viria a ser baptizado ou a receber educação religiosa.


Leia-se a informação depois de rectificada:

Apesar de ter feito parte da Opus Dei durante cerca de dez anos, Ruy Belo vai-se afastando da Igreja, chegando mesmo a riscar dos seus anteriores manuscritos a palavra "Deus" substituindo-a por valores em que acreditava como "Liberdade" ou "Justiça". No entanto, todos os seus filhos foram baptizados embora não tenham recebido educação religiosa. A Catarina, por exemplo, foi baptizada em Setembro de 1975 em Vila do Conde e, já adulta, crismada no Cairo.

 
01 – Augusto Cunha, o mais ignorado da geração d’Orpheu, 
por Mafalda Ferro

Apesar de Augusto Cunha ter feito parte daquela que ficou conhecida como a Geração d'Orpheu juntamente com António Ferro, Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Almada-Negreiros, Armando Cortes Rodrigues, Santa-Rita Pintor, Luís de Montalvor, Alfredo Guisado e José Pacheco Coelho entre muitos outros, pouco se sabe sobre a sua vida, obra e personalidade.

Modernista, humorista, escritor, poeta, cronista, novelista, crítico literário e de espectáculo, conferencista, dramaturgo e amante profundo do teatro em todas as suas vertentes, autor de textos de textos de divulgação turística, Augusto Cunha marcou presença constante na imprensa portuguesa, colaborando assiduamente em inúmeros periódicos da época dos quais se destaca «Portugal Colonial», «Portugal Cine Revista», «Ilustração Portuguesa», «A Voz», «Gazeta dos Caminhos de Ferro», «Domingo Ilustrado», «Notícias Ilustrado», «Sempre Fixe», «Diário de Notícias», «Diário da Manhã», «Diário de Lisboa», «Notícias de Lourenço Marques», «Primeiro de Janeiro», «Comércio do Porto», «Atlântico», «Panorama», «Acção», «O Mundo» entre muitos outros.


Em 1913, enquanto estudante do Liceu Camões, conhece Mário de Sá-Carneiro e António Ferro e, com eles,
frequenta tertúlias na Casa dos Anjos, casa de António Ferro, nas duas Brasileiras (a do Chiado e a do Rossio), no Martinho e no restaurante «Irmãos Unidos» propriedade da família de Alfredo Guisado.

No mesmo ano, 
ingressa no primeiro Curso da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, assim como António Ferro e Azeredo Perdigão. Dos três, apenas ele termina o curso em Lisboa já que António Ferro abandona a Universidade durante o último ano para iniciar a sua carreira de repórter e Azeredo Perdigão, para defender o amigo Cunha, acaba por ser expulso e obrigado continuar o curso em Coimbra terminando com a classificação de “Muito Bom”, 18 valores. Mas o trio mantém-se fortemente unido.


Já na Universidade, publica com António Ferro "Missal de Trovas. Quadras dos 17 e 18 anos" (Lisboa, Livraria Ferreira Lda. Editora, 1914, de acordo com o exemplar que mandou encadernar e que integra hoje o acervo da Fundação António Quadros). A obra é prefaciada por João de Barros, Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Afonso Lopes Vieira, João Lúcio, Júlio Dantas, Alberto Osório de Castro, Augusto Gil. Com dedicatória impressa dos autores para Augusto Gil e Fausto Guedes Teixeira.


Pouco depois, para fazer face às suas despesas de estudante, começa a trabalhar no Ministério da Justiça e a publicar artigos humorísticos e de crítica, crónicas, espectáculos de revista, peças de teatro nas quais também participa como actor.


Em 1918, escreve «Direito por Linhas Tortas», espectáculo de revista organizado pelos quintanistas do Curso de Direito de 1913/1918, que viria a ser representado em Outubro desse ano no Teatro S. Carlos em Lisboa.


Terminado o Curso, inicia funções no Ministério das Colónias e contrai matrimónio na Igreja Paroquial dos Anjos com a irmã de António Ferro, Umbelina Tavares Ferro. Como referido no «Século da Noite», a 28.08.1919, estiveram presentes, além da família e de outros amigos, Filomeno da Câmara, Alfredo Guisado, Azeredo Perdigão, Alice Dantas e Raul Feio. O casal Cunha vive desde então e até 1938 na Casa dos Anjos em Lisboa chegando ainda a coabitar com o amigo e cunhado António Ferro até à sua partida para o Brasil.


A sua maneira de ser, responsável e com fortes valores humanos e familiares, leva-o a seguir caminhos e a tomar decisões, nem sempre fáceis. Em carta a António Ferro, refere as suas escolhas em relação ao percurso literário e à sua participação no movimento modernista: 

Fizemos juntos essa primeira entrada, essa visita ainda de cerimónia. Eu retirei-me logo, discretamente. Tu ficaste. Entrámos pela porta do lirismo e apesar do bom acolhimento – que animou tantos outros a passarem do vestíbulo, imitando-nos os passos – eu saí e não voltei. –  e adiante  –  Talvez infelizmente, demorei-me pouco junto deles; e segui outro caminho mais árido, mais penoso. Tu seguiste aquele que juntos tínhamos começado.

Em 1920, abre o seu primeiro escritório de advogado e, mais tarde, partilha o escritório de Azeredo Perdigão, o mesmo onde o amigo viria a delinear os primeiros estatutos da Fundação Calouste Gulbenkian. Nesse ano, nasce a sua filha Maria Helena e, no ano seguinte, o filho Pedro Henrique. Sabe-se que teve uma filha mais nova, Raquel, que morreu com 6 meses. Os seus filhos e os de António Ferro, netos de avós comuns (António Joaquim Ferro e Helena Tavares Afonso Ferro), viriam a nascer todos no mesmo quarto da Casa dos Anjos.


Em 1922, recebe a licença de notário e, em 1926, inaugura e dirige com Tavares Alves a Sociedade Forense Portuguesa e, no mesmo ano, em Maio, integra com Leitão de Barros, a Comissão de Festas de Lisboa. Em 
1928, é nomeado presidente do Tribunal de Árbitros Avindores (Tribunal que julga questões entre patrões e assalariados).

C
olabora, ainda em 1928, assim como António Ferro, Fernanda de Castro, Leitão de Barros, Martins Barata, Luzia e Teresa Leitão de Barros, no primeiro número d'«O Notícias Ilustrado».

Em 1930, a pedido da cunhada Fernanda de Castro, escreve "O exame do meu menino. Teatro de trazer por casa (Entreacto)", peça destinada a ser representada em benefício dos seus Parques Infantis; a peça foi levada à cena no Teatro da Trindade sendo "o meu menino" interpretado por Vasco Santana. A publicação desta peça, numa edição em miniatura, esteve na origem das famosas "Lições do Menino Tonecas".


Em 1931, escreve a comédia «Sempre Noivos» que é levada à cena no Teatro do Ginásio; a peça «Xa bi tudo» (em colaboração com Alfredo França), representada pela Companhia Lucília Simões-Erico Braga no Teatro da Trindade e protagonizada por Chaby Pinheiro; a peça «Os Meninos d'oiro. Vaudeville» que, ensaiada por Lucília Simões e representada por Brunilde Júdice, Irene Isidro, Teresa Gomes, Erico Braga, Samwell Diniz e José Gamboa, não sobe à cena nem é publicada em vida do autor.


Em 1932, e até 1934, ocupa o cargo de Secretário de Armindo Monteiro, Ministro das Colónias: Em 1934, concebe e dirige até ao ano da sua morte, a revista «O Mundo Português – revista oficial de Arte, Literatura e Propaganda Colonial», edição de Agência Geral das Colónias e do SPN/SNI.


Através da vasta obra que publicou, pode comprovar-se o grande número de amigos que reuniu, entre o grupo dos artistas modernistas, já que assinaram capas e/ou ilustrações dos seus livros: Abel Manta, Amarelhe, Bernardo Marques, Bernardo Marques, Carlos Botelho, Cottinelli Telmo, Eduardo Malta, Estrela Faria, Francisco Valença, Jorge Barradas, Lino António, Manoel Lima, Maria Adelaide Lima Cruz, Martins Barata, Mesquita,
Manoel Lima, Paulo Ferreira, Paulo Roberto Araújo, Rodriguez Castañé, Sarah Affonso, Stuart de Carvalhais, Teixeira Cabral; foi retratado e caricaturado por Eduardo Malta, Teixeira Cabral, Francisco Valença e Norton; foi fotografado por Sampayo, Achiles e Salazar Diniz.

A todos, ou a quase todos, e muitos mais, chamou a colaborar no «Mundo Português».


Em 1933, começa a publicar n'«O Notícias Ilustrado» entrevistas de sua autoria a grandes figuras de teatro como Lucília Simões, Irene Isidro, Luísa Satanela, Ausenda de Oliveira, Georgina Cordeiro, Maria Helena, Adelina Abranches, Ilda Stichini, Ester Leão, Palmira Bastos, Maria Sampaio, Fernanda de SousaMaria Alvarez, Maria Matos, Aura Abranches e Adelina Campos.


Em 1935, colabora assiduamente em grande parte dos 43 números do periódico «Bandarra - Semanário da Vida Portuguesa», fundado por António Ferro.


Dirige a organização das publicações da Secção Portuguesa da Exposição de Paris e integra o grupo de colaboradores intelectuais dos pavilhões portugueses das exposições de Paris (1937), Nova Iorque (1939) e Mundo Português (1940).


Em 1938, muda-se com a família da Casa dos Anjos para a Avenida da Republica onde a sua mulher permanecerá mesmo depois da sua morte.


Em 1940, participa activamente na estruturação do "Círculo Eça de Queiroz" (Sócio Fundador n.º 6). Ainda nos anos quarenta, assume a presidência da Assembleia Geral da Lutuosa do Ministério das Colónias e é nomeado Sócio Efectivo da Sociedade de Geografia de Lisboa (1944); assume a direcção do Jornal Radiofónico do Império e Emissora Nacional (1945).


No dia 18 de Abril de 1947, mês que o vira nascer, Augusto Cunha morre, vítima de doença dolorosa e prolongada deixando inconsoláveis a mulher, filhos, sogro, sobrinhos, cunhada, restante família e muitos amigos dos quais se destaca António Ferro, Raul Feio, António Folgado da Silveira e Azeredo Perdigão.

Augusto Cunha foi uma das personalidades mais singulares do grupo modernista. Com uma complexa mas rara personalidade, era um homem consciencioso, meticuloso, sério, com um semblante muitas vezes melancólico, alguém que observava o mundo com um olhar malicioso e que se ria à socapa não só dos podres ou das futilidades da vida social do seu tempo, mas até de si próprio, expressando-o por uma ironia que nunca chegava à dureza do sarcasmo, pois era essencialmente um homem bom, sem sombra de azedume ou de despeito.

António Quadros, 1988.

Legendas
1 - Três quintanistas do curso de Direito: Augusto Cunha, Raul António Barbosa Viana e António Ferro (sentado). Lisboa, 1918.
2 - Augusto Cunha e sua mulher Umbelina Raquel Tavares Ferro.

Nota adicional
: O espólio de Augusto Cunha integra o acervo da Fundação António e está disponível para consulta. Toda a informação associada está publicada no Sítio da Fundação.

 

02 – Rubinstein, Silva Pereira e a “Música como Forma de Ser”, 110 anos depois do nascimento do Maestro Joaquim da Silva Pereira, por Manuel Silva Pereira


Encontraram-se em Dezembro de 1959, no Monumental Cinema, em Madrid, para o último dos Conciertos de Otoño, patrocinado pelo Ayuntamento da capital espanhola: Silva Pereira, 47 anos, Maestro português, Kappelmeister encartado por Viena, na classe de direcção de orquestra do Professor Swarowski; e Arthur Rubinstein, 72 anos, Pianista, cabeça aureolado de sabedoria, polaco de nascença, mas senhor do mundo, filho natural da Belle Époque, bon viveur, artista generoso, infatigável, tão à vontade com a realeza europeia como com a  ersatz de Hollywood, que o distinguiu em 1970, premiando o melhor documentário de longa-metragem -- Arthur Rubinstein ou lamour de la vie --  escrito e realizado por Gérard Patris e François Reichenbach.


O público esgotou a sala – “amo Espanha como se ama uma mulhercom ternura!, afirmou Rubinstein e a crítica distribuiu loas e prosa, menos para o 5.º Concerto, de Beethoven (Imperador), mais para o n.º 1 em Mi menor e o Nocturno em Fá sustenido, de Chopin, e muito, imenso para a Rapsódia sobre um tema de Paganini, de Rachmaninoff, autêntica pedra de toque para pianistas e chefes de orquestra. Aí sim, escreve A. del Campo, crítico do Pueblo, foi onde se ouviu o poderoso instrumento orquestral frente a frente com o piano, que canta e grita, que exalta e espicaça, abalando a orquestra com a sua prédica fervente. A obra do compositor russo pede à batuta que contenha o piano, e até o tempo rítmico, para que a orquestra seja cativada e se surpreenda com a ostentação dos seus quase inesgotáveis recursos.


Também Espinosa Orlando, no jornal Madrid, Juan San Miguel no Informaciones, Jose Maris Franco no Ya e Fernandez-Cid no ABC tecem comentários emocionados e entusiastas à arte indiscutível de Rubinstein, à humana e elevada palpitação do seu espírito, projectado de forma clara e luminosa pela sua técnica gigantesca. Na regência, Silva Pereira soube criar um ambiente equilibrado de timbres e uma atmosfera sonora cheia e envolvente com a sua direcção cuidada, atenta e vigilante, respeitosa para com o solista e as partituras.


Quase uma década depois, em Maio de 1967, os dois artistas voltariam a estar juntos, agora no concerto inaugural do XI Festival Gulbenkian de Música. O palco foi o Coliseu dos Recreios, e Chopin e Rachmaninoff voltaram ao programa, completado com o Concerto n.º 2 em Si bemol maior, de Brahms, a Pavana e Galharda do portuense Cláudio Carneyro e, a fechar, a 2.ª Suite da Daphnis et Chloé, de Ravel.


Rubinstein é já octogenário faleceu com 95 anos, em 20 de Dezembro de 1982 mas mantém intactos os dotes que o afirmam como lenda viva dos pianistas, mágico intérprete das Concertos, Nocturnos, Valsas, Mazurcas e Polonaises (The Chopin Recordings; 1928-1939), com lugar garantido junto de Apolo, ao lado de Schnabel, Gieseking, Heifetz ou Horowitz, este último, porventura, o maior pianista de todos os temposSó que eu sou melhor músico!


Técnica prodigiosa, sem nunca fazer lembrar a mecânica do robot, interpretações aliciantes, seriedade exemplar, doseamento dos volumes, lindíssima sonoridade, sentido claro da estrutura das obras, milagre de vitalidade e juventude, Rubinstein faz de novo o pleno dos elogios e dos clamorosos aplausos, sem que os méritos de Silva Pereira cuja vocação e competência se alicerçam, ao fim e ao cabo, na mesma musicianship que demonstrara à evidência nos tempos em que era dirigido mais do que dirigente” – passem despercebidos ao ouvido de João de Freitas Branco, então crítico em O Século.


Rubinstein actuou em Portugal pela primeira vez em Novembro de 1948, no Teatro Nacional de S. Carlos, em recital promovido pelo Círculo de Cultura Musical, então no seu XV ano de existência, sob a presidência de Elisa de Sousa Pedroso. Em 1954, foi a vez do Porto o receber, em concerto com orquestra dirigida por Moreira de Sá; e, em 1972, o Presidente da República agraciou-o com uma comenda.


Dele gosto de recordar o modo como Arnold Steinhardt, líder do Quarteto Guarnieri, o definiu: Rubinstein
podia moldar uma frase musical com enorme liberdade, mas nunca de forma excessiva ou de mau gosto. Era mágico, pois nunca soube como ele o fazia. Ou, ainda, como ele próprio se apresentava: sempre me considerei um instrumento musical, não um piano ou um violino, mas a própria essência da música. Nunca ando, sonho ou durmo sem ter música na cabeça. A música é a minha forma de ser. 

Legendas:
1 - Silva Pereira e Rubinstein. Madrid, 20 de Outubro de 1959.
2 - Cartaz da actuação da Orquestra Sinfónica de Madrid dirigida por Silva Pereira e acompanhada ao piano por Rubinstein. Madrid, 20 de Outubro de 1959. 
3 - António Ferro no Restaurante Alvalade em Lisboa com Elisa de Sousa Pedroso, António Eça de Queiroz e Arthur Rubinstein, pianista polaco, por ocasião da sua 1.ª actuação em Portugal no Teatro Nacional de S. Carlos, em recital promovido pelo Círculo de Cultura Musical presidido por Elisa de Sousa Pedroso.

 
03 – "António Ferro e o 'Heróico Cinema Português'", obra lançada no Porto a 1 de Abril,
por Carla Ribeiro

Em 2022, passam 90 anos sobre as cinco entrevistas de António Ferro a Salazar, publicadas no Diário de Notícias em Dezembro de 1932. O historiador Fernando Rosas entende-as como o primeiro manual de propaganda do novo regime. Foram, com efeito, o que tornou o ainda algo obscuro e recém-nomeado Presidente do Conselho numa figura em que o povo se podia reconhecer. O mito começava a ser criado. As entrevistas deram a Ferro um cargo no Estado Novo: o de director do Secretariado de Propaganda Nacional. No ano passado, em Novembro, assinalaram-se os 65 anos sobre a morte prematura deste homem.

Uma data mais: a primeira sessão pública do cinematógrafo, em Paris, pelos irmãos Lumière, realizou-se no ano em que Ferro nasceu: 1895. Seis anos após o seu desaparecimento, na sua História Breve do Cinema, Manuel Maria Múrias descrevia António Ferro como “um cinéfilo como não houve outro em Portugal” (1962: 273).

Assim isolados, estes factos pouco significam. Mas em conjunto ajudarão a compreender melhor o papel que António Ferro desempenhou no panorama do cinema português nas décadas de 1930 e 1940.

Em Ferro, Luís Reis Torgal encontra um dos “intelectuais orgânicos” do Estado Novo, que “relaciona a sua visão da sociedade e da política com as suas escolhas culturais e estéticas” (2005: 240). Isto é, que usa a cultura como arma política. Talvez por isso seja uma das figuras mais controversas da primeira metade do século XX português. Escritor – inserido no movimento modernista português, publicou, durante a sua juventude artística e iconoclasta, como a apelidou José Barreto, cerca de duas dezenas de obras, divididas entre poesia, novela, conto, peças de teatro, conferências e manifestos –, jornalista, diplomata, é, todavia, sobretudo recordado (e estudado) como director do Secretariado de Propaganda Nacional (SPN). Dele disse Leitão de Barros, seu amigo de longos anos: “O próprio Salazar, sem você, é como um belo quadro a que […] se tirasse a moldura”. Dificilmente alguém diria melhor. E estas palavras elucidam sobre o papel que Ferro desempenhou ao serviço do Estado Novo e do seu Presidente do Conselho.


As palavras de Leitão de Barros estabelecem outro ponto de partida para este livro: a relação entre cultura e poder. Mais ainda: a relação entre cultura e a sua utilização como didáctica de uma nação. E Ferro esteve no centro deste processo.


Trata-se, assim, de discutir a relação entre António Ferro, o político, homem familiarizado com o poder e com quem o detinha, e o homem de cultura, domínio pelo qual era, em grande medida, responsável. Em particular, a sua acção política sobre o cinema português, mas também o seu pensamento cinematográfico. Pensamento e acção, pois. Como se ligaram estas duas perspectivas, ao longo de quase duas décadas (1933-1949) de trabalho político e de acção estética e ideológica, através da famosa “Política do Espírito”, na direcção do Secretariado? Que resultados alcançou Ferro, no campo da política oficial para o cinema? Que acolhimento e resistências encontrou? Quem foram os seus aliados? Foram o seu pensamento cinematográfico e a sua acção compatíveis? Convergiram com a política imposta por Salazar? Estas são algumas das interrogações a que tento ir dando resposta. 

 
04 – Delfim Maya: uma exposição, uma inauguração e um pouco de história,
por Mafalda Ferro


A exposição «Um modernista autodidata: Delfim Maya» pode ser visitada na Biblioteca Nacional de Portugal (BNP) até ao dia 31 de Maio. No dia da sua inauguração, realizou-se um colóquio sobre Delfim Maya (1886-1978), com a participação de Guilherme d’Oliveira Martins, Administrador da Fundação Calouste Gulbenkian, Eduardo Duarte, Professor na Faculdade de Belas Artes de Lisboa, Samuel Rama, Professor da Escola Superior de Arte e Design das Caldas da Rainha e artista plástico e de Maria José Maya, neta do artista e mestre em História de Arte.


A relação do escultor com António Ferro remonta, pelo menos, ao início dos anos 30 do século XX já que em 1931, Delfim Maya desenhou duas caricaturas de António Ferro, hoje, propriedade da sua família.


Delfim Maya foi pioneiro em Portugal na construção de esculturas em ferro e noutros metais ‒ a primeira exposição em que apresentou trabalhos em folha de metal (prata) recortada foi em 1934.


Em conversa com a sua neta Maria José Maya, tomei conhecimento de que em Janeiro de 1934, Delfim Maya fez uma pequena exposição na sua casa de Lisboa, a Casa de Santa Isabel, onde tinha o seu atelier, mostrando este novo tipo de escultura em que cada figura era planificada, recortada e dobrada, sem qualquer soldadura, constituindo um método genial e inovador de concepção, que podemos relacionar com os movimentos cubista e o construtivista.


Continuando a conversa com a minha interlocutora, confirmei a admiração de António Ferro pelas esculturas de folha de metal de seu avô já que, tendo comparecido à inauguração, escreveu no Livro de Honra que “Delfim Maya criou uma arte. Difícil fazer-lhe maior elogio”.


A mostra terá sido uma espécie de “ensaio” para ver como as pessoas reagiam aquele tipo de escultura, pois ainda no mesmo mês de Janeiro fez uma exposição na Joalharia Leitão, no Chiado, com esculturas em chapa de prata, que teve imenso sucesso.


Maria José Maya referiu ainda, com base na correspondência em seu poder, que apesar de Delfim Maya ter sido convidado por António Ferro a expor obras em folha de metal recortada na Exposição Internacional de Nova Iorque, em 1939, a Secretaria do SPN (Secretariado de Propaganda Nacional) boicotou a sua participação alegando desconhecer a morada e, assim, o escultor só recebeu a carta de convite em princípios ou meados de Abril, quando a exposição se iniciava a 30 de Abril.


Notas
1 - Delfim Maya era sócio da SNBA (Sociedade Nacional de Belas Artes), onde participava desde 1932 nos Salões da Primavera, em cujos catálogos se podia encontrar a morada de todos os artistas.
2 - António Ferro estava em Nova Iorque à data da alegada troca de correspondência.

Para além desta exposição que é possível ver na BNP, será inaugurada no dia 18 de Abril, Dia Internacional dos Monumentos e Sítios, às 15.30h, no Museu Militar de Lisboa, em S.ta Apolónia, uma obra de Delfim Maya: uma floreira resultante da transformação de uma bala de canhão da I Guerra Mundial (1918). Esta inauguração será acompanhada por uma sessão de poesia, com o tema “Da Guerra à Paz”, por Maria José Maya.

 
05 – «Pinharanda Gomes, historiador do pensamento português». Mostra.
Divulgação

A Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, inaugurou ontem, dia 13, uma exposição dedicada a Jesué Pinharanda Gomes (1939 / 2019) que estará patente até ao próximo dia 17 de Setembro.

A mostra, destaca o autor enquanto o maior historiador do pensamento português de todos os tempos. Activo numa perspectiva espiritualista e católica, estatuto que reivindica desde os primeiros livros e a que sempre se manteve fiel, Pinharanda Gomes produziu uma obra vastíssima, sobre uma inúmera multiplicidade de temas.


Autodidacta, nascido em Quadrazais, Sabugal, terra raiana de contrabandistas, a que tem devotado parte importante dos seus escritos, Pinharanda Gomes só soube de ser de nacionalidade portuguesa quando iniciou a frequência do ensino primário.


Possuidor do mais vasto saber sobre a história do pensamento português, de que se destacam os três volumes da História da Filosofia Portuguesa (1981-1991), bem como sete volumes da série Pensamento Português (1969-1993), regista em todos os seus livros uma adesão viva ao modo religioso e de se tematizar as questões filosóficas.


Autor prolífico, resgatou do esquecimento histórico inúmeros autores integrados na mundividência espiritualista (Joaquim Alves da Hora, João de São Tomás, Samuel da Silva, João Lourenço Insuelas, Prudêncio Quintino Garcia, Francisco Rendeiro, Pereira de Freitas, entre outros), prestando sólida consistência à existência de uma corrente filosófica em Portugal que, em continuidade, por vezes subterraneamente, desprezada pelo racionalismo e pelo positivismo, condenada pelo modernismo, tem privilegiado, desde os alvores da nacionalidade, o espírito face à matéria, a alma face ao corpo, a transcendência face à imanência, a metafísica face à positividade empírica.


Este é, de facto e de direito, o estatuto singular de Pinharanda Gomes no seio da cultura portuguesa contemporânea: para além do seu pensamento pessoal, harmónico com a restante obra de historiógrafo da história intelectual portuguesa segundo uma visão religiosa e espiritualista, os seus estudos demarcam com clareza o fio de continuidade existente em Portugal, de um modo constitutivo, de pensadores que, ora situados no poder de Estado, ora contra este, ora a este indiferentes (os místicos), incessantemente, sem hiatos temporais, interrogaram, sem desfalecimento, segundo uma posição religiosa (não necessariamente católica e eclesiástica, como, por exemplo Amorim Viana, Sampaio Bruno e Teixeira de Pascoaes) ou apenas espiritual (por exemplo, Antero de Quental) a face de Deus e as qualificações filosóficas decorrentes: o ser, a existência, a essência, o devir, a causalidade e o determinismo, o acaso, a criação, a morte.


A mostra «Pinharanda Gomes: historiador do pensamento português» pretende homenagear esta figura, principalmente na vertente histórico-filosófica da sua obra, sem, contudo, menosprezar o pensamento original do autor e as outras contribuições dele em vários âmbitos da cultura portuguesa. A mostra integra materiais do espólio guardado no Centro de Estudos Jesué Pinharanda Gomes de Sabugal, assim como do acervo da Biblioteca Nacional de Portugal, instituição da qual Pinharanda Gomes foi assíduo frequentador durante a sua vida.

 
06 – Catálogo da exposição «Ruy Belo: História pequena de um Grande Poeta»,
por Fundação António Quadros.

A exposição foi visitada por escolas, grupos e particulares, bastante interessados em saber mais sobre a vida e obra do Poeta Ruy Belo. Foi com grande alegria que recebemos também a Catarina e o Duarte Belo, filhos do Grande Poeta.
O
tempo da exposição prolongou-se durante mais umas semanas a pedido de muitos vindos de Rio Maior e das suas freguesias e, também, do Porto, Lisboa, Santarém, Caldas da Rainha, Ota, Leiria, Benedita e muitos outros locais.

A exposição, itinerante, continuará brevemente o seu caminho continuando a dar a conhecer Ruy Belo. 




 
07 – LIVRARIA ANTÓNIO QUADROS
Promoções do mês, obras de Augusto Cunha:

Autoria: Augusto Cunha.

Título: Contos escolhidos.

Prefácio: António Ferro. A obra inclui ainda uma carta de Augusto Cunha para António Ferro e a resposta de António Ferro.

Capa: Bernardo Marques.

Edição – Lisboa: Livraria Bertrand, 1956.

PVP (promoção até 14 de Maio): 15,00.


Autoria:
Augusto Cunha.

Título: Os Meninos d'oiro. Vaudeville.

Prefácio: António Quadros.

Capa: Paulo Ferreira.

Ilustração: Caricatura do autor por Francisco Valença.

Edição (póstuma) – Braga: Oficinas Gráficas da APPACDM, 1988.

PVP (promoção até 14 de Maio): 15,00.

 
 
     
 
Apoios:
 
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