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Newsletter Nº 186 / 14 de Julho de 2022
Direcção Mafalda Ferro Edição Fundação António Quadros
Índice

01 – Inauguração da exposição «António Quadros, ‘Portugal, Razão e Mistério’ e a Filosofia Portuguesa». Memória visual

02 – António Quadros, os primeiros anos, por Mafalda Ferro

03 – António Quadros, o Mestre da Geração do «57», por Jesué Pinharanda Gomes

04 – D. Manuel II o Último Rei de Portugal, por Mafalda Ferro

05 – Dom Manuel II o Desventurado – uma entrevista e uma publicação de António Ferro

por Mafalda Ferro e Paulo Baptista

06 – José Hermano Saraiva, 10 anos depois da sua morte, por Mafalda Ferro

07 – Livraria António Quadros: Promoção do mês – Obras em Prosa e Poéticas de Fernando Pessoa: Edições Europa-América. Vários Lotes.


Editorial, 
por Mafalda Ferro

António Quadros faria hoje, dia 14, 99 anos.

Em sua homenagem a Fundação tem estado a preparar iniciativas com um tema comum «António Quadros, ‘Portugal, Razão e Mistério’ e a Filosofia Portuguesa»: uma exposição que foi inaugurada no passado dia 8, patente durante os meses de Julho e Agosto; e uma Mesa Redonda a realizar no dia 16.

A Mesa Redonda promovida pela Fundação António Quadros com o apoio da Câmara Municipal de Rio Maior e da Revista «Nova «Aguia» acontecerá no dia 16 de Julho às 16h.

Abertura da sessão: Mafalda Ferro.

Moderação: Renato Epifânio.

Participantes: Abel Lacerda Botelho, António Braz Teixeira, António Cândido Franco, Guilherme d’Oliveira Martins, José Almeida, Joaquim Domingues, Joaquim Pinto da Silva, Paulo Samuel, Pedro Martins e Renato Epifânio.

Local: Espaço Museológico da Biblioteca Municipal / Fundação António Quadros.

Informações: mafaldaferro.faqmail.com | 965552247.                   

Entrada Livre.

Lembramos também, este mês, José Hermano Saraiva (10 anos depois da sua morte) e Dom Manuel II (90 Anos depois da sua morte).

 
01 – Inauguração da exposição «António Quadros, ‘Portugal, Razão e Mistério’ e a Filosofia Portuguesa».
Memória visual.


 
02 – António Quadros, os primeiros anos,
por Mafalda Ferro


António Quadros nasceu às seis e vinte da manhã do dia 14 de Julho de 1923 em Lisboa na casa dos seus avós paternos (Rua dos Anjos, n.º 12, 2.º).

Foi registado com o nome António Gabriel de Quadros Ferro sendo que o seu segundo nome representou uma homenagem de seu pai ao poeta italiano Gabriel d'Annunzio. 
Foi essa a sua segunda ligação à literatura. A primeira foi ser filho dos escritores Fernanda de Castro e António Ferro.


Três meses depois do seu nascimento, o artista Bernardo Marques, amigo e vizinho dos pais, terminou a decoração e a pintura de murais na casa do n.º 6 da Calçada dos Caetanos e o casal Ferro mudou-se para lá com o filho primogénito que nessa casa cresceu e viveu até ao dia do seu casamento.

Fernando Manuel Tavares de Castro e Quadros Ferro, seu irmão mais novo, com menos quatro anos, foi o seu melhor amigo; sempre lhe chamou, com ternura, Nucha ou Mano. Dos amigos mais chegados nesses primeiros anos, destacamos os seus primos direitos Maria Helena e Pedro Cunha, filhos de Umbelina e Augusto Cunha, e, fora do núcleo familiar, o Bibó, filho de António e Narcisa de Meneses e o Raul Feio.


As características demonstradas em criança por António Gabriel continuaram visíveis ao longo da vida, foi sempre dócil, sorridente, de gargalhada fácil, generoso, sensível, suave, sem rancores... Segundo sua mãe, era «calado, tranquilo, não fazia ondas, seguia serenamente o seu caminho, sem sobressaltos, mas de maneira eficiente e segura.»


Em contacto directo com o ambiente cultural que se vivia em casa dos pais, António Quadros privou e aprendeu com  intelectuais e artistas mas nunca se deixou influenciar por políticos. O seu percurso seguiu sem desvios rumo ao Pensamento, à Filosofia.


Tendo os pais casado muito novos, António Gabriel foi o Ai-Jesus dos seus amigos, escreviam-lhe, retratavam-no, enviavam presentes e a grande amiga de sua mãe, Teresa Leitão de Barros, todos os dias 14 de Julho lhe enviava uma lampreia de ovos com a qual eu [Mafalda] me deliciei inúmeras vezes, anos e anos mais tarde.


Em dia de Ano Novo, Afonso Lopes Vieira enviou-lhe uma decorativa carta: “Meu caro António Gabriel, gostei muito que tu tivesses gostado tanto dos versos que te mandei e ao teu irmão. Pus a palha e não a fita porque a palha nasce nos campos e a fita vende-se na loja. A palha é mais bonita, não achas? O Menino Jesus não me deu nada, mas eu não fiquei triste porque tu e outros meninos gostaram do meu livro. Recebe um abraço do teu amigo Afonso Lopes Vieira. Bom Ano para todos dessa Casa. 1.1.932”.

Um dos primeiros presentes que recebeu foi um óleo de Almada Negreiros com a dedicatória manuscrita “Ao primogénito do António Ferro, lembrança do amiguinho Almada. Madrid, 22 de Fevereiro de 1928”. Este quadro pertence hoje ao seu primogénito António Roquette Ferro.

Com 5 anos, Sarah Affonso bordou, para ele e para seu irmão, camisolas e fatos de príncipes da Rússia para uma festa de carnaval e, em 1928, pintou-o ao lado da mãe; com 19 anos, em 1943, foi desenhado por Pedro Leitão e por Inês Guerreiro; com cerca de 12 anos, Álvaro de Brée esculpiu o seu busto.

Apesar de o seu principal passatempo ser a leitura, também gostava de brincar com soldadinhos de chumbo, de jogar à bola, de nadar e de ouvir as conversas dos adultos.



Recordando a primeira vez que viajou com sua mãe (para o Brasil), escreveu «Vínhamos no mesmo barco com a Tuna Académica de Coimbra, que me escolheu como mascote. Tive de presente uma capa e batina em miniatura, aos cinco anos vesti-me de estudante de Coimbra!»

E, a essa, muitas outras viagens se seguiram. Em 1937, por exemplo, acompanhou a família a Paris onde, na Exposição Internacional, foi fotografado com a Rainha D. Amélia.

Costumava passar férias em casa de uma tia materna no Monte Estoril e na Quinta da Marinha em Cascais. Frequentava a «Parada» e as praias de Cascais ao Estoril.


Apesar da sua profunda paixão pela leitura, nunca gostou de estudar, sempre foi aluno “para o 10”, como nos dizia. Fez a primária na Escola Francesa e, em 1935, iniciou os estudos no liceu Pedro Nunes onde permaneceu até 1941. Concluído o ensino secundário, matriculou-se, na Faculdade de Direito de Lisboa da Universidade de Lisboa, tendo lá ficado não mais do que um ou dois anos. Inscreveu-se em Histórico-filosóficas na Faculdade de Letras de Lisboa, foi aluno de Delfim Santos que considerava o seu primeiro Mestre, colega de Mário Soares. Viria a concluir a licenciatura em 1949, já casado, com a dissertação “O génio nacional na arquitectura portuguesa” que em 1954 viria a constituir a base da sua Introdução a uma Estética Existencial.


Iniciou a sua carreira literária com cerca de 19 anos, assinando António Gabriel, nos jornais da Mocidade Portuguesa.


Em 1944, interrompeu o curso e iniciou o serviço militar como soldado-cadete n.º 7/44 do 1.º grupo da Companhia de Subsistências na Póvoa do Varzim onde residiu até 1946 quando o terminou com a categoria de oficial miliciano. No mesmo ano, inscreveu-se como sócio do Sport Lisboa e Benfica e, também, do «Olímpico Club de Portugal.


Terminado o curso e o serviço militar, apaixonado, pretendendo contrair matrimónio, iniciou a sua primeira actividade profissional como chefe da Secção de Propaganda e de Turismo dos Serviços Culturais da Câmara Municipal de Lisboa e Assistente Cultural da Junta Central das Casas do Povo. Em 1947, começou a publicar artigos literários e de crítica em jornais e revistas que reúne num volume que intitula Modernos de Ontem e de Hoje em cujo prefácio confessa:

Estreio-me na vida literária da pior maneira – escrevendo sobre literatura. Eu, que não tenho uma obra, que publico o meu primeiro livro, que inicio um caminho, que sou novo em experiência e em idade, estreio-me, criticando as obras dos outros [...] Peço desculpa da ousadia. Ousadia dos vinte anos. Ousadia que, possivelmente, eu próprio, daqui a vinte anos, não saberei perdoar.


No mesmo ano e durante cerca de dez anos, produziu e apresentou na Emissora Nacional programas musicais sob o pseudónimo «Rui Bandeira» e, sucessivamente, as rúbricas «A Música das Cidades» (quinzenal) com locução de Artur Agostinho, «Cartas de toda a gente», «Fragmentos da vida quotidiana», «Toda a carta tem resposta», «Memórias da poesia vivida», «Tapete mágico» (quinzenal), «Lendas e tradições do povo português», «Crónicas de um coleccionador de imagens» e «Personagens em busca de romance».

Assinou ainda com o mesmo pseudónimo, montagem do seu irmão Fernando Teles de Castro, um conjunto de 8 programas: «Viagens ao mundo da dança» apresentados por Pedro Moutinho, dos quais a Fundação conserva apenas o registo de três: “Um grande bailarino romântico, Jules Perrot”, “O «Verde-Gaio» e a história do bailado português”, “Um grupo de bailarinos negros, o «Negro Dance Theatre» ”.



Paulina de Roure Roquette, a Pó como todos lhe chamavam, filha dos Viscondes da Fonte Boa, sua noiva colaborava  com a Associação Nacional de Parques Infantis fundada e dirigida por Fernanda de Castro. E assim a conheceu.

A família da Pó, bastante conservadora, começa por demonstrar uma certa reserva em relação ao namoro e a uma ainda hipotética futura ligação a uma moderna família de intelectuais. No entanto, a delicadeza e simpatia de António Quadros, rapidamente conquista toda a família.

O matrimónio, celebrado pelo Padre Pedro Gambôa, aconteceu em Lisboa, no dia 8 de Dezembro de 1947, dia da Imaculada Conceição e, também, do aniversário de Fernanda de Castro, na Igreja de Nossa Senhora das Mercês, seguido de lanche em casa de António Ferro e Fernanda de Castro

Os noivos passaram a noite de núpcias na Pousada de S. Brás de Alportel, tendo seguido depois para Sevilha.

De regresso, o casal instalou-se durante alguns anos na sua primeira casa (Avenida Guerra Junqueiro, 20 1.º Dt).

Do casamento, que durou quase 50 anos, nasceram cinco filhos mas apenas três sobreviveraram: António Duarte Roquette de Quadros Ferro (1952) que seguiu as pisadas do pai como Director-Geral do IADE; Ana Mafalda Roquette de Quadros Ferro (1953) que trabalhou na obra da avó nos Parques Infantis, integrou o Conselho de Administração do IADE, criou e dirige a Fundação António Quadros; e Rita Maria Roquette de Quadros Ferro (1955) cujo evidente talento para a escrita lhe granjeou lugar cativo na terceira geração de escritores da Família Ferro.


A Pó foi recebida de braços abertos pela família do marido e encontrou em António Ferro o pai que perdera aos 14 anos.

Mas, essa é já outra história.

 

03 – António Quadros, o Mestre da Geração do «57»,
por Jesué Pinharanda Gomes

 

Trinta e um anos após o surgimento do jornal “57”, António Quadros teceu uma breve memória de louvor a quem considerou como sendo o Mestre da sua geração: Álvaro Ribeiro. Nesta breve memória evoca os companheiros do Movimento que o jornal proclamava e que se consideravam discípulos directos de Álvaro Ribeiro e de José Marinho, e indirectos de Leonardo Coimbra, mais, do ideário da “Renascença Portuguesa”. Com Álvaro e Marinho encontravam-se todos os dias nos Cafés Palladium (Restauradores) ou na Brasileira do Rossio.


Desde logo ressalta, nesse escrito evocativo, a assunção da herança dos pensadores ligados à tradição, de modo que os discípulos professavam a continuidade daquele movimento na tertúlia que os unia, do ponto de vista do sucesso histórico, mas com realce para o factor de união mental – “o primado da filosofia na reflexão sobre os problemas humanos, os segredos naturais e os mistérios divinos” .


Ao tempo, para aqueles discípulos, a Universidade não constituía alternativa, de um forte desencanto nos tendo legado oportunos documentos, subscritos por ele, António Quadros, Afonso Botelho e Orlando Vitorino, em livros ou em diversos artigos esparsos na imprensa. O problema da Universidade deveio mais agudo e sentido quando, em 1951, a Faculdade de Letras de Lisboa reprovou a tese de licenciatura apresentada por Orlando Vitorino – A Fenomenologia do Mal, mais tarde (1970) editada pelo autor. O diagnóstico da Universidade foi por ele iniciado em 1952, no jornal Ler, em um artigo intitulado “Problemas da Cultura Portuguesa. As licenciaturas em História e Filosofia pela Faculdade de Letras de Lisboa”, artigo esse em solidariedade com Orlando Vitorino e que deu origem a um Inquérito sobre o tema, levado a efeito por aquele jornal.


Na evocação de Álvaro Ribeiro, Quadros renova a profissão da sua tese, aliás agravada, porque, se nos anos 50 do século XX a Universidade ainda aparecia como entidade questionável, agora António Quadros esboça o cenário da cultura portuguesa ao tempo: “uma antropologia imbuída de materialismo”, “uma cosmologia desintegrada do homem, do cosmos e do divino” e “uma teologia decaída em apologética e moral”, enfim: “como instituição a Universidade já não existe”.


Procedendo a brevíssima sinopse das teses alvarinas, em alguns casos comparadas ou relacionadas com as de Leonardo Coimbra e de José Marinho (num diálogo interescolar), Quadros define o que então (e depois) se deveria entender como “Filosofia Portuguesa”: 
o magistério do intelecto activo, de portugueses para portugueses, em diálogo orgânico em que os discípulos aprendem mais dos mestres, mas em que os mestres aprendem também algo dos discípulos, e não só dos discípulos, também do magistério arcaico do povo e da tradição, dos ancestrais e, no caso português, da nossa tripla herança judaica, islâmica e cristã.


Caracterizando o grupo de amigos e companheiros, não esqueceu a exigência pragmática e educativa da Filosofia, então, e por isso, chamada a intervir na política, ainda que evitando a intervenção nas práticas políticas.


O grupo que se reuniu em volta do jornal “57” ficou fiel ao preceito de Álvaro Ribeiro, de que não pode haver política portuguesa que não se baseie numa educação portuguesa, esta enfim dependente de uma filosofia portuguesa, isto é, de um pensar por nós próprios, em trânsito genuíno do intelecto passivo para o intelecto activo, em sublimação da herança recebida pela passagem de potência a acto.

 

«António Quadros e a Filosofia Portuguesa» (excerto), 
em António Quadros: Obra, Pensamento, Contextos,

Universidade Católica Editora, 2016. 
 
04 – Dom Manuel II o último Rei de Portugal,
por Mafalda Ferro

Um das personalidades cuja vida mais me impressiona e que mais admiro é Dom Manuel II, o último Rei de Portugal.

Tendo-se completado no passado dia 2 de Julho, 90 anos da sua morte em Londres, parece-nos pertinente dedicar-lhe algum espaço nesta publicação.

Quando nasceu, no Palácio de Belém em Lisboa, a 15 de Novembro de 1889, por ser o segundo filho dos Reis de Portugal, ninguém calculava que viria a ser, ele próprio também Rei, aliás, o último Rei.

Assim sendo, Manuel, ao contrário do irmão mais velho, não foi preparado para ascender ao trono.

Estudioso e interessado, amante da leitura, aprendeu línguas, história e música, um dos seus professores foi Alexandre Rey Colaço.

Com 18 anos, começou a preparar-se para entrar na Escola Naval e seguir carreira na Marinha mas, poucos meses depois, deu-se o regicídio; Dom Carlos e Dom Luís Filipe, o Rei e o Herdeiro da Coroa, seu pai e seu irmão mais velho, foram brutalmente assassinados à sua frente. Todos os seus planos e os que para ele haviam sido delineados se esfumaram. Foi precipitadamente forçado a reinar e, em menos de dois anos, tinha sido deposto.

Fora implantada a República.

Depois de um período curto mas muito atribulado, de terra em terra, seguiu para o Reino Unido com sua mãe; reinava então o Rei Jorge V.
Fixou residência em Fulwell Park, Twickenham, nos arredores de Londres, local para onde foram enviados os seus livros e outros bens pessoais e onde sua mãe tinha nascido, também ela no exílio.
Aí procurou viver como português e recriar um ambiente lusitano, n
unca deixando de ser fiel ao seu país, nunca procurando nem alimentando conflitos políticos ou pessoais.

Em Setembro de 1913, contraiu matrimónio com Augusta Vitória, princesa de Hohenzollern-Sigmaringen (1890-1966), sua prima com quem viveu até ao fim da vida, dedicando-se
 aos estudos, à escrita e à catalogação da sua biblioteca rica em livros antigos.
Foi, nessa biblioteca que, e
m 1930, António Ferro o entrevistou numa histórica peça publicada pelo «Diário de Notícias» que ficou célebre.

Dom Manuel II morreu em casa a 2 de Julho de 1932 mas, respeitando a sua vontade de ser sepultado em Portugal,
Oliveira Salazar com quem manteve sempre um bom relacionamento, organizou o seu funeral com honras de Estado.
Os seus restos mortais chegados a Portugal a 2 de Agosto foram
 sepultados no Panteão Real da Dinastia de Bragança, no Mosteiro de São Vicente de Fora em Lisboa.

Deixou os seus bens pessoais ao Estado Português para que se fundasse um Museu.

Em 1954, António Ferro publicou em volume a entrevista que lhe havia feito em 1930 com o título D. Manuel II, o Desventurado
Através do prefácio da obra, datado de 1954, pode estabelecer-se um paralelismo entre as emoções experimentadas por Dom Manuel II e pelo próprio António Ferro, ambos amantes da sua pátria e dela afastados até ao fim da vida.

 
05 – Dom Manuel II o Desventurado – uma entrevista e uma publicação de António Ferro,
por Mafalda Ferro e Paulo Baptista

Como tinha feito ao longo da sua vida, será novamente a partir de um fragmento da sua longa actividade enquanto entrevistador que António Ferro parte para a construção dessa derradeira obra em vida que constitui, referimos, o seu improvável testamento político, D. Manuel II, o Desventurado.


A obra parte de uma entrevista a D. Manuel II, publicada pelo «Diário de Notícias» em Dezembro de 1930. A importância dessa entrevista é considerável e, excluindo desde logo o caso aparte das que fez a Salazar em final de 1932, será provavelmente a mais importante entrevista de António Ferro a uma figura de importância nacional. Toda ela é plena de significados desde logo no título, mencionando o ”ex-rei de Portugal” identificando-se como “jornalista republicano”, na evidente tentativa de criar algum dramatismo.


Não é só no título que a entrevista a D. Manuel II se reveste de particular(es) significado(s) mas, desde logo, na própria circunstância da sua ocorrência aparentemente fortuita, no contexto da deslocação de Ferro a Londres para a reportagem do julgamento em Inglaterra das implicações “inglesas” do processo da burla das notas falsas do Banco de Portugal, organizada por Artur Alves dos Reis. Esse episódio representou um momento particularmente difícil para a credibilidade internacional de Portugal, o que pesou no próprio desenrolar da entrevista. A imagem de Portugal, sob uma ditadura militar, no centro de um escândalo fiduciário, durante a pior crise financeira da História, precisava de apoios. Dom Manuel II respondeu presente e António Ferro concretizou, talvez, uma das suas primeiras acções de propaganda do regime, das muitas que viria a concretizar, oficiosa e oficialmente. As coincidências constroem-se!


Há que recordar as circunstâncias violentas em que Dom Manuel II se exilou e a sua posição de rejeitar liniarmente qualquer protagonismo nas sucessivas tentativas de restauração da monarquia. Desde o momento do seu exílio Dom Manuel de Bragança tinha-se mantido praticamente em silêncio. A evidente identificação de algumas das circunstâncias desse exílio do ex-rei com o percurso “em exílio” de António Ferro tê-lo-ão levado a suscitar essa antiga entrevista e usá-la como base para a publicação do seu último livro em vida, D. Manuel II, o Desventurado.


Efectivamente, o mais interessante de tal programa é implicar um processo de reinvenção que Ferro irá usar de uma forma particularmente eficaz na entrevista a Dom Manuel II. Mas, se retirarmos todas as consequências dessa abordagem, nesse mesmo texto podemos sentir que se irá fechar um ciclo porque António Ferro toma essa antiga entrevista como ponto de partida para se procurar reinventar a si próprio. Porquê? Tudo indica, evidentemente, que terá sido por ver na condição de exilado de Dom Manuel II, na sua dedicação a um país, uma dedicação desvelada, inequívoca, incondicional mas sobretudo longínqua e, por essa determinante circunstância, totalmente insignificante e inconsequente, uma ausência. Será justamente esse sintoma de ausência, essa frustrante incapacidade de intervir no seu país, que Ferro identificou nele próprio em Berna e em Roma, como tinha intuído em Dom Manuel II, no seu exílio de Fulwell Park. Só desse modo se poderia justificar o prefácio que acrescentou à reportagem inicial, a essa “sonata melancólica, outonal de folhas mortas” como o próprio Ferro a classifica no próprio prefácio que se estende por setenta e cinco páginas, praticamente metade de todo o livro.

 

No prefácio a D. Manuel II, o Desventurado, de facto, António Ferro procura abordar certos aspectos do seu próprio percurso, sobretudo da evolução política dos seus ideais e do papel que as figuras de Sidónio Pais, Filomeno da Câmara e Salazar representaram para ele, sobretudo como referências políticas. Começa por nos falar de si, “entrelinhando” por exemplo, Disraeli e a sua tardia ascensão política, prejudicada por arrojados escritos de juventude, para recordar o seu próprio percurso e a maldição que as ousadias decadentistas de Leviana ou Mar Alto lhe trouxeram, no “drama do escritor que tira a máscara mas que, apesar disso, todos continuam a ver mascarado” e que foi o seu.

 

«As saudades de uma eterna juventude» (excerto),
em António Ferro, 120 anos. Actas,  2015,
Mafalda Ferro e Paulo Baptista

 
06 – José Hermano Saraiva, 10 anos depois da sua morte,
por Mafalda Ferro

José Hermano Saraiva morreu há precisamente 10 anos, em Julho, mas, se há alguém que continua sempre presente no nosso dia-a-dia, é ele pois, graças à RTP Memória, continua a entrar diariamente em nossa casa divulgando e explicando personalidades, terras e monumentos, contando histórias.

O seu inigualável talento para a comunicação, os seus conhecimentos históricos e, até a sua imaginação e capacidade de dedução, transportam-nos para outros tempos, para outras vidas mas também para o seu tempo, para a sua vida, sempre com uma importante palavra sobre o tratamento a ser dado à História, ao património que é, afinal, de todos nós.



Como é nosso hábito, com o objectivo de dar a conhecer alguns aspectos biográficos menos conhecidos ou mesmo inéditos da personalidade que pretendemos homenagear, neste caso José Hermano Saraiva, procurámos no arquivo da Fundação alguma ligação próxima com aqueles cujo espólio preservamos. Escolhemos duas situações.


Na série «correspondência», encontrámos
um cartão-de-cumprimentos sobre papel timbrado da «Academia das Ciências de Lisboa» de José Hermano Saraiva (1919/2012) para Germana Tânger.

O teor refere a organização comum de uma palestra do próprio Hermano Saraiva sobre Camões acompanhada por poesia interpretada por Maria Germana.

 

Germana Tânger

Minha estimada amiga:

O que lhe peço é quase inadmissível: que leia, como você sabe ler, as suas elegias místicas de Camões (págs. 181 e 190 desta edição).

É evidentemente uma tarefa árdua: Texto difícil, pouco comunicativo, de sentido muito concentrado. Sugiro que faça, segundo o seu critério, uma síntese. Por exemplo, na Elegia Divina, Alma Pastor, podem ser suprimidos (além doutros) os primeiros 96 versos. Em ambos os poemas há tercetos moles, ou tão intrincados que nenhum ouvinte os entenderia.

Fica ao seu critério fazer a escolha. O mais importante é captar o lado místico, e em especial os tercetos relativos á paixão de Cristo.

Penso em fazer uma breve fala: as contradições da época, a posição hesitante de Camões, a conversão espectacular (soneto Verdade, Amor, Razão, Crescimento, redondilhas Sôbolos Rios), e explicar que a última fase da vida é dominada pela preocupação religiosa, como se vê pelos versos que dirá. Isto é: a parte mais importante e longa da fala é a sua. E com a sua ajuda se espera salvar.

José Hermano Saraiva

 

Nas séries «Correspondência» e «Escritos e Actividades de António Quadros», recolhemos informação sobre uma ligação profissional entre António Quadros e José Hermano Saraiva.

A 26 de Maio de 1989, por despacho assinado pelo Primeiro Ministro Aníbal Cavaco Silva e pelo Ministro da Educação Roberto Carneiro, António Quadros, sob a égide da UNESCO, foi nomeado presidente da Comissão Nacional para o Ano Internacional da Alfabetização e representante do Ministério da Educação para a Década Mundial do Desenvolvimento Cultural, cargos de que se viu obrigado a pedir demissão em finais de Janeiro de 1991 por motivos de saúde.

O mesmo despacho refere que da Comissão Nacional para o Ano Internacional de Alfabetização e do seu Órgão Consultivo, a Comissão Científica, fizeram parte as seguintes personalidades:

COMISSÃO NACIONAL: António Quadros, presidente; Maria Helena Valente Rosa, secretária executiva; Artur Torres Pereira e Maria Teresa Ramos Ambrósio, vogais.

COMISSÃO CIENTÍFICA: Agostinho da Silva, presidente; Alberto Silva e Melo, António Braz Teixeira, António Simões Lopes, Fernando Alves Cristóvão, José Augusto Seabra, José da Cruz Policarpo, José Hermano Saraiva, José Blanco, membros.

 

08 – Livraria António Quadros, em homenagem a Fernando Pessoa, 4 Lotes em Promoção do Mês. 
Não acumulável com outras promoções.

Colecção Livros de Bolso Europa-América, Lisboa: Publicações Europa-América, 1986. Editor: Francisco Lyon de Castro. Introdução, organização, notas, biobibliografia por António Quadros.


Lote de 13 obras: PVP: 52,00€

N.º 435 – Obra Poética de FP: Mensagem e outros Poemas Afins

N.º 437 – Obra Poética de FP: Poesia II. 1930 – 1933.

N.º 439 – Obra Poética de FP: Poemas de Alberto Caeiro.

N.º 440 – Obra Poética de FP: Odes de Ricardo Reis.

N.º 466 – Obra em Prosa de FP: Escritos Íntimos, Cartas e Páginas Autobiográficas.

N.º 467 – Obra em Prosa de FP: Textos de Intervenção Social e Cultural. A Ficção dos Heterónimos.

N.º 468 – Obra em Prosa de FP: Livro do Desassossego por Bernardo Soares, 1.ª parte.

N.º 469 – Obra em Prosa de FP: Livro do Desassossego por Bernardo Soares, 2.ª parte.

N.º 470 – Obra em Prosa de FP: Ficção e Teatro: O Banqueiro Anarquista; Novelas Policiárias; O Marinheiro e outros.

N.º 472 – Obra em Prosa de FP: Portugal, Sebastianismo e Quinto Império.

N.º 473 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico I. 1910 – 1919.

N.º 474 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico II. 1925 – 1935.

N.º 475 – Obra em Prosa de FP: Páginas sobre literatura estética.

Lote de 8 obras: PVP: 32,00€

N.º 435 – Obra Poética de FP: Mensagem e outros Poemas Afins

N.º 440 – Obra Poética de FP: Odes de Ricardo Reis.

N.º 467 – Obra em Prosa de FP: Textos de Intervenção Social e Cultural. A Ficção dos Heterónimos.

N.º 468 – Obra em Prosa de FP: Livro do Desassossego por Bernardo Soares – 1.ª Parte.

N.º 469 – Obra em Prosa de FP: Livro do Desassossego por Bernardo Soares - 2.ª Parte.

N.º 473 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico I. 1910 – 1919.

N.º 474 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico II. 1925 – 1935.

N.º 475 – Obra em Prosa de FP: Páginas sobre literatura estética.

Lote de 4 obras: PVP: 16,00€

N.º 467 – Obra em Prosa de FP: Textos de Intervenção Social e Cultural. A Ficção dos Heterónimos.

N.º 469 – Obra em Prosa de FP: Livro do Desassossego por Bernardo Soares - 2.ª Parte.

N.º 473 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico I. 1910 – 1919.

N.º 474 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico II. 1925 – 1935.

Lote de 2 obras: PVP: 8,00€

N.º 473 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico I. 1910 – 1919.

N.º 474 – Obra em Prosa de FP: Páginas de Pensamento Politico II. 1925 – 1935. 
 
 
     
 
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