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Newsletter Nº 213 / 14 de Setembro de 2024 |
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Direcção Mafalda Ferro Edição Fundação António Quadros |
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ÍNDICE
01 — Exposição «António Quadros e a Espiral - 60 anos depois (1964-2024». Memória.
02 — Espiral ou O Círculo que se não fecha. A propósito da descoberta de um escrito inédito de António Quadros, por Pedro Martins.
03 — A Formação dos Mestres: O Lugar do Livro e outros Horizontes, por António Coito.
04 — Pedro Homem de Mello, 120 anos depois, e a sua presença na Fundação António Quadros, por Mafalda Ferro
05 — Revista «Nova Águia», n.º 34 - Apresentação online.
06 — Boletim Folhas à Solta n.º 127 da Associação Agostinho da Silva: Acerca de Agostinho da Silva, por Miguel Real.
07 — Diário 1980, de Paulo Ribeiro Baptista. Divulgação.
08 — Outras Notícias e Publicações recentes.
09 — Livraria António Quadros: Obra em promoção: "A Paixão de Fernando P.". 2.ª edição.
EDITORIAL,
por Mafalda Ferro
Dedica-se a presente newsletter a dois vultos maiores da cultura portuguesa
AGOSTINHO DA SILVA (1906-1994, 30 anos depois da sua morte)
PEDRO HOMEM DE MELLO (1904-1984, 120 anos depois do seu nascimento)
O último trimestre de 2024 na Fundação António Quadros será dedicado a
FERNANDA DE CASTRO
(1900-1994, 30 anos depois da sua morte, 124 anos depois do seu nascimento)
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01 — Exposição «António Quadros e a Espiral - 60 anos depois (1964-2024». Memória.
Com grande pena nossa, terminou o tempo da exposição «António Quadros e a Espiral - 60 anos depois (1964-2024» que esteve patente em Rio Maior durante cerca de dois meses e durante a cerimónia de encerramento do centenário de António Quadros, com grande interesse dos visitantes.
Promoção: Fundação António Quadros; Curadoria: Mafalda Ferro; Grafismo: Paulo Montez; Colaboração: António Coito; Apoio: Câmara Municipal de Rio Maior.
Além de algumas pessoas não identificadas, estiveram presentes no acto de inauguração amigos e personalidades como Abel de Lacerda Botelho, Ana Clara Lopes, Ana Margarida Chora e seu pai, Ana Ribeiro Rosa, Ângela Meneses, António Braz e Celeste Braz Teixeira, António Coito, António Roquette Ferro, Fabrizio Bostaglia, Fernanda Barbosa, Fernando Gebra, Francisco Moraes Sarmento, Francisco Ribeiro, João Botelho e filho, Jorge Veríssimo e sua mulher, José António Barreiros e sua mulher, José Mendes, Júlia Figueiredo, Leonor Fragoso, Lourdes Sirgado Ganho, Luís Leitão Martins, Mafalda Ferro, Manuel Cândido Pimentel, Manuel Dugos, Manuel e Maria Ricarte, Manuel Silva, Pereira, Manuela Dâmaso, Marta Gautier, Paula Ribeiro, Pedro Martins, Renato Epifânio, Ricardo Belo de Morais, Risoleta Pinto Pedro, Rui Félix Alves, Sofia Fragoso, Teresa Feio e seu marido, Teresa Pulquério.
A pedido de vários interessados que não puderam deslocar-se a Rio Maior,
publicamos os painéis gráficos da exposição
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02 — Espiral ou O Círculo que se não fecha. A propósito da descoberta de um escrito inédito de António Quadros, por Pedro Martins.
1.
Da I Série da Espiral publicaram-se treze números, entre a Primavera de 1964 e o Inverno de 1966, como decerto conviria ao conceito subjacente ao título desta revista, dirigida e editada pelo seu proprietário, António Quadros. Não sei se o filósofo o terá feito de caso pensado, mas não se deve subestimar o seu conhecimento dos símbolos, vasto e profundo. Tivessem sido somente doze os números então saídos a lume e teríamos um círculo fechado, o eterno retorno, a ausência de movimento. Mas não foi isso que sucedeu. E assim, pela derradeira aparição da revista, pôde o círculo alargar-se, abrir-se em nova volta e subir uma oitava, para que o nome, promessa de futuro, se cumprisse no que lhe era essencial.
2.
Na senda do aristotelismo português, a I Série da Espiral afirma o primado do espírito e da cultura contra o pragmatismo economicista do racionalismo, do positivismo e do materialismo. Revista que pretende pensar com séria autonomia o mundo do seu tempo e que, por isso, tanto procura superar os maniqueísmos da Guerra Fria quanto distanciar-se das piores veleidades europeístas, a Espiral irá naturalmente congregar os discípulos de Leonardo Coimbra e a geração do jornal 57.
Álvaro Ribeiro, José Marinho e Sant’Anna Dionísio não deixarão de ali assinar valiosa colaboração. A par de António Quadros, António Braz Teixeira será, porventura, o mais prolífico colaborador da Espiral, revelando, notadamente, o seu proverbial interesse pela literatura portuguesa. Mas também Afonso Botelho, Orlando Vitorino, António Telmo, João Ferreira e Pinharanda Gomes serão, entre outras da mesma geração, algumas das presenças mais regulares nas páginas desta revista.
Vultos maiores da Presença como José Régio e Branquinho da Fonseca e alguns outros de pronunciado distanciamento ideológico, casos de Bernardo Santareno e Luiz Francisco Rebello desenham o leque abrangente de uma publicação onde cabem ainda David Mourão-Ferreira, Duarte Ivo Cruz e Lima de Freitas, confirmando António Quadros como um espírito superiormente tolerante, diplomata, compreensivo e conciliador.
Pela especial atenção que irá dedicar ao Brasil e ao chamado epicentro sul-atlântico, a Espiral prenuncia também certos veios lusófonos e pan-iberistas que se virão a manifestar axialmente na obra e no pensamento de um Agostinho da Silva. Se o autor de Reflexão publica na revista alguns dos seus escritos ensaísticos mais marcantes dessa década de 60, como sejam Ecúmena, Ensaio para uma Teoria do Brasil ou Quinze Princípios Portugueses, a colaboração de outros nomes vinculados à Universidade de Brasília como Eudoro de Sousa, Santiago Naud e Pedro Agostinho permite assegurar o estabelecimento de um diálogo autêntico, afectivo e efectivo, entre hemisférios e continentes.
3.
Permitam-me agora uma breve nota esdrúxula. Diz respeito a António Telmo e se aqui a deixo é porque ela nos sugere a importância decisiva de que a Espiral se revestiu no desenvolvimento de uma obra e de um pensamento que encontrariam em António Quadros um dos seus mais dilectos interlocutores.
É em “Da Língua Portuguesa”, artigo dado à estampa no final de 1964, no número duplo 4/5 da revista, que Telmo, pela primeira vez, confere expressão nominal à noção de razão poética, cerne do seu pensamento filosófico: «A uma razão concebida como actividade do “verbo” poder-se-ia muito bem chamar “razão poética”» – escreve então o filósofo. Percebe-se a importância que lhe atribuía por ter sido esse o único disperso, entre quantos publicou até à sua partida para Brasília em 1966, que posteriormente recolheu em livro. Encontra-se hoje em Filosofia e Kabbalah, o que permite confirmar a natureza fulcral deste livro de 1989.
4.
Graças à aturada investigação com que Mafalda Ferro pôde conceber e concretizar a esplêndida exposição comemorativa do 60.º aniversário da Espiral, que, no passado mês de Julho, tive o prazer de visitar na Biblioteca Municipal Dr. Laureano Santos, em Rio Maior (onde está também sediada a Fundação António Quadros), foi possível exumar do espólio de António Quadros um escrito inédito do filósofo que nos revela ter sido sua intenção reeditar e dirigir, no pós-25 de Abril, «embora em novos moldes culturais e gráficos», uma II série da Espiral – facto que, até hoje, se desconhecia em absoluto.
A meio caminho entre a carta circular e a missiva individual, o escrito, dirigido a catorze destinatários(1) que, de alguma sorte, formariam com António Quadros um inner circle no movimento da Filosofia Portuguesa, encerra, na verdade, uma proposta. Data, provavelmente, da primeira metade do ano de 1976 e não chegou nunca a ser enviado aos seus destinatários, consoante o testemunho de António Braz Teixeira e João Botelho o permite hoje afirmar.
Fruto de um «dever de intervenção na crise vital que ameaça a própria sobrevivência do país», a proposta de António Quadros, se, por um lado, reconhece as «perspectivas libertadoras» que o 25 de Abril de 1974 abriu, pondera, por outro, o agravamento, levado às últimas consequências, da deterioração que já anteriormente era patente na nossa vida política e cultural, oportunamente denunciada, «nas suas causas espirituais, éticas e filosóficas», em diversas publicações, com destaque para o jornal 57 e a própria Espiral:
«Sabemos» – escreve o filósofo nesta sua proposta – «que o positivismo historicista, o burocratismo pedagógico, o voluntarismo sem ideias e a desnacionalização cultural, o sociologismo superficial, a corrupção ética e mental prepararam o caminho para o actual predomínio do materialismo e do marxismo, da irresponsabilidade e da desagregação nacional.»
Criticamente distante da impreparação cultural do “escol” dos partidos, da «falência dos universitários positivistas e carreiristas» e das «desastrosas experiências e proposições dos sergistas e dos marxistas nas suas diversas combinações mútuas», a proposta desta nova Espiral mostra-se especialmente atenta a «uma juventude desiludida», e às próprias forças armadas, que «buscam um fundamento teórico para a nacionalidade portuguesa, depois das decepções a que foram sujeitas».
Quadros revela em seguida particulares preocupações com a capacidade de comunicação da futura revista, que deverá, assim, desejavelmente utilizar «uma linguagem e uma abordagem problemática acessível a públicos de média preparação»; com a sustentabilidade financeira do projecto editorial (preconiza, aliás, um aturado esquema de financiamento para os primeiros tempos da publicação, fazendo apelo à subscrição de títulos de sócio-fundador); e com a coesão doutrinal da nova Espiral: no núcleo básico ou principal de redactores ou colaboradores a quem dirige a proposta haverá, por certo, «diferenças de crença e de conceito, em aspectos religiosos, filosóficos e políticos», mas também «as afinidades bastantes para que possa considerar-se uma univocidade de propósitos», sem a qual, aliás, «a revista não teria sentido».
5.
Apesar da pertinência do seu propósito e da solidez das suas proposições, esta notável proposta de António Quadros não chegou sequer a ser expedida para os seus destinatários. Desconhecemos os motivos que terão impedido o filósofo de lhe dar sequência. Um ano depois, surgirá a revista Escola Formal, onde Quadros – importa sublinhá-lo – não assinará qualquer colaboração. Se Escola Formal permite postular uma afirmação do grupo da Filosofia Portuguesa, seguirá, porém, um rumo algo diferente daquele que a nova Espiral prometera tomar. De tom vincadamente polémico no plano ideológico, não tardará a motivar o desagrado da figura tutelar de Álvaro Ribeiro. Quem não souber ler nas entrelinhas a discreta censura que o filósofo da razão animada ali então manifestou quanto ao rumo dos acontecimentos, poderá, todavia, verificar o que deixou escrito em carta para António Telmo, significativamente datada de 30 de Novembro de 1977, o dia em que se comemoravam os 120 anos do nascimento de Sampaio Bruno.
Pela sua ausência, não poderia ser mais eloquente esta nova Espiral que não chegou a haver. Mas o círculo continua por fechar…
(1) - Afonso Botelho, Alexandre Coelho, Álvaro Ribeiro, António Braz Teixeira, António Telmo, Avelino Abrantes, Azinhal Abelho, Dalila Pereira da Costa, Francisco Sottomayor, João Botelho, Luís Furtado Guerra, Orlando Vitorino, Pinharanda Gomes e Rafael Monteiro. |
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03 — A Formação dos Mestres: O Lugar do Livro e outros Horizontes, por António Coito.
Não servem professores, são precisos mestres.
Não servem alunos, são necessários discípulos.
Não servem funcionários, são indispensáveis apóstolos.
Não servem técnicos, são imprescindíveis homens.
(Quadros, 1965, p. 72)
A reflexão sobre o papel dos mestres na vida dos seus discípulos é um caminho sem fim à vista, principalmente, se pensarmos em duas condições: o facto do acto pedagógico ser um trajecto sempre em aberto, ou seja, nunca finalizado, mas também os novos tempos e as consequentes mudanças. Na actualidade, tornou-se mais simples resolver as problemáticas com o fenómeno da adaptabilidade. Contudo, esse processo conduz frequentemente a um enfraquecimento da qualidade pedagógica. Adapta-se, mas não se avaliam as consequências. Ou melhor, evitam-se! Mais do que aplicar e repensar um conjunto de políticas, devemos agir em função do essencial: «É sobretudo o espírito que deve animar e dinamizar todas as actividades docentes e discentes.» (Quadros, 1965, p. 57). As décadas passaram e os princípios básicos para um processo de aprendizagem de sucesso não deveriam ser esquecidos ou anulados. É por isso que não nos espanta o «estado virtual de conflito» que encontramos na Educação do nosso país.
Se pensarmos detalhadamente no processo de formação inicial de um professor, ao dia de hoje, compreendemos que a leitura, enquanto exercício de crescimento intelectual, é menosprezada. O livro deixou de ser o convidado especial na rotina de muitos jovens, tendo sido substituído pelo «fascínio parolo» das tecnologias — os futuros professores não escapam a esta transformação sociológica e o seu percurso formativo é claramente afectado. Não adiantam os relatos de que as vendas de livros, em Portugal, têm atingido níveis históricos. Importa compreender o resultado provocado pelo aumento do número de vendas e se efectivamente estamos a criar uma sociedade leitora, o que não é o caso. Ler não é um mero visionamento de palavras aglomeradas, em páginas devidamente numeradas e em exibições instagramáveis — «é sobretudo (!), pensar e reflectir, descobrir e imaginar, compreender e explicar» (Desmurget, 2024, p. 68).
Neste sentido, é importante olhar para a emergência dos novos meios tecnológicos como um meio auxiliar para algumas práticas de natureza instrumental, mas nunca como algo essencial. Nos últimos anos, a formação contínua dos nossos professores, naquilo que é a oferta formativa, tem passado muito pela capacitação digital, «em detrimento de propostas que envolvam conteúdos e métodos de ensino» (Bernardes, 2023, p. 347). Este cenário culmina na transmissão de conhecimentos não fundamentais, em que o professor é tratado como um técnico digital, estando em evidência a desconstrução do papel primordial do docente — preparar as suas aulas, transmitir conhecimentos e estimular os jovens de hoje a reflectirem, deixando-os sensibilizados e motivados para os efeitos libertadores da leitura. Terão os professores de hoje e do futuro a possibilidade de ascender à condição de mestres? Vejamos a reflexão de Quadros (1965, p. 58) sobre o impacto mortífero da burocracia no trabalho docente:
«Eis porque os professores-burocratas que não são nem mestres, nem discípulos, nem autodidactas, se tornam na realidade em vampiros: vampiros de um saber alheio que simplificam, coisificam, desturpam, minorizam e em última análise destroem; vampiros daqueles alunos que, apanhados nas malhas do sedutor processo de ascensão social, são devorados e extintos como na conhecida alegoria de Ionesco; ou ainda vampiros de uma sociedade que não servem realmente, mas de que se servem, defendendo intransigentemente as suas posições conquistadas e impedindo toda e qualquer emersão de um espírito novo ou renovado.»
Enquanto o «professor-burocrata» estiver preso à técnica, não poderá cumprir a sua missão de abrir mentes através do amor pelo conhecimento. Já afirmava António Quadros (1953, pp. 16-17) que «pelo reino da técnica jamais seríamos capazes de quebrar as grades da prisão». Terá António Quadros escolhido o vocábulo «técnica» como antecipação da barbárie a que chegámos? Apenas o prazer e o lazer da leitura têm efeitos libertadores, permitindo viajar sem fronteiras nem limites. Torna-se assim fulcral o trabalho de introspecção, para considerar o verdadeiro interesse e sentimento do professor pela leitura — sem afectos pelos livros não é possível contaminar uma geração onde a inteligência artificial é o melhor motor de busca e reflexão. Por isso mesmo, como sugere Cortez (2019, p. 337), a única estratégia de combate contra a «nova ignorância» (no fundo, velha, se virmos bem…) passa por trazer de novo o livro para a Escola e a Universidade. Provar aos nossos jovens que o Livro não deve ser encarado como um artefacto pesado, sem interesse e antiquado. Mostrar-lhes casos práticos de como um Livro nos pode transformar, apresentando-lhes obras extraordinárias.
Será um aluno de 20 valores aquele que terminar a escolaridade obrigatória e tiver a capacidade de se questionar e, acima de tudo, de encontrar na leitura a forma de procurar o conhecimento e de sair do seu lugar — a leitura como um «caminho de liberdade através de todos os tempos e de todos os espaços, através do conhecido e do desconhecido, através da realidade e do sonho…» (Quadros, 1953, pp. 16-17).
Posto isto, para que alguns professores possam verdadeiramente inspirar e alcançar o grau de mestres, é crucial que redescubram e transmitam o prazer da leitura. A técnica não pode substituir a paixão pelo conhecimento. Devemos reintroduzir o livro como uma ferramenta vital na educação, mostrando aos jovens o seu poder transformador. Só assim poderemos formar uma geração capaz de pensar criticamente e de se libertar das limitações impostas pela trivialidade da tecnologia. O futuro da educação depende da nossa capacidade de cultivar mentes curiosas e apaixonadas pelo saber. Optimismo ou Negativismo? O Horizonte não permite conhecer o que está além! Talvez o tempo ajude a responder. Será tarde demais?
[Nota: Um agradecimento especial à Espiral, que me permitiu naturalmente um primeiro contacto com a obra de António Quadros, bem como me ensinou a importância de dialogar e meditar ao lado de várias perspectivas. Também os vários números da Espiral, pela sua qualidade, são verdadeiros Livros. Este texto é dedicado aos mestres que vão surgindo no meu percurso (poucos, mas inesquecíveis)]
Referências Bibliográficas
Bernardes, J. A. C. (2023). A hospitalidade e a formação de professores. Em M. L. A. Juan & J. da C. Domingues, Formação Inicial de Professores (Imprensa da Universidade de Coimbra).
Cortez, A. C. (2019). Voltar a ler: Alguma crítica reunida (sobre poesia, educação e outros ensaios) (1.ª edição). Gradiva.
Desmurget, M. (2024). Ponha-nos a Ler! Contraponto Editores.
Quadros, A. (1953). O Prazer e O Lazer da Leitura. Bem Viver - Recreio, 7.
Quadros, A. (1965). A diáspora portuguesa. Revista Espiral — Ensino e Educação dos portugueses, n.º 8/9, Lisboa: Tipografia Peres.
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04 — Pedro Homem de Mello, 120 anos depois, e a sua presença na Fundação António Quadros,
por Mafalda Ferro.
Pedro Homem de Mello, poeta, folclorista, advogado, apresentador de televisão, professor, criador de ranchos folclóricos, amante, estudioso e ensaísta dos usos e costumes folclóricos e populares nasceu em Miragaia, no Porto, a 6 de Setembro de 1904, perfazendo-se este mês 120 anos dessa data.
A admiração que nos suscita não só a sua obra poética como o Ser Humano que foi, não nos permite deixar passar esta efeméride em branco. Decidimos, assim, prestar-lhe uma homenagem, há muito devida, recorrendo à informação patente na Biblioteca e no Arquivo Histórico da Fundação António Quadros, no «Afife digit@l jornal online de Afife».
Pedro Homem de Mello retratado por Carlos Carneiro (1, 2), Eduardo Malta (3) e Júlio Resende (4).
De antiga linhagem, nascido numa terra antiga e com raízes profundas, num passado que enfeitiça, Homem de Mello é, todavia, singularmente moderno. E digo singularmente, porque o seu modernismo consiste em ser exclusivamente ele próprio. Elaine Sanceau, em Fandangueiro.
Não precisa, Pedro Homem de Mello — Poeta de alta estirpe —, de que falem dele aos seus leitores fiéis que são todos aqueles que algum dia abriram, encantados, um livro seu. Júlio Dantas.
Um grande poeta moderno tão antigo como a própria língua portuguesa, eis o que é, em verdade, Pedro Homem de Mello. João Gaspar Simões, em Fandangueiro.
Homem de Mello vivia alternadamente no Porto e em Afife, no Convento de Cabanas, casa que fora dos seus pais. Em Cabanas, passava férias, escrevia, estudava e recebia os seus amigos. Era conhecido por muitos como o «Poeta de Cabanas» ou o «Fidalgo de Cabanas».
Deslocando-se primeiro de bicicleta e depois a pé, desde Cabanas, frequentava a praia de Afife onde, no bar da praia, por vezes apresentava e vendia os seus livros. Um dos ranchos folclóricos que viria a apresentar na RTP seria o rancho folclórico de Afife (Viana do Castelo).
Tendo iniciado o Curso de Direito em Coimbra, veio a terminá-lo na Universidade de Lisboa em 1926.
Senti, logo à chegada a Coimbra, nítida aversão pela estúrdia académica. Os rapazes desse tempo olhavam para mim com ironia (a ironia - essa arma dos falhados! - escreve António Ferro na sua Teoria da Indiferença) dando-me uma alcunha que diz tudo. Chamavam-me «Dom Pedro...». Isto bastou para que eu desaparecesse, de súbito, da cena dos que se tratavam, fraternalmente, por tu. Nada havia, na verdade, de comum entre eles e eu.
Pedro Homem de Mello, em Desterrado.
Dedicou-se depois ao ensino de Português em escolas técnicas do Porto, a antiga Escola Comercial de Mouzinho da Silveira onde foi, também director e a Escola Infante D. Henrique. Dedicando-se desde cedo ao estudo e investigação da poesia, do cantar e do folclore popular portugueses, viria a findar a Escola de Folclore do Porto.
No Porto, participa com José Régio, Eugénio de Andrade, Vasco Lima Couto, entre outros, nas reuniões do Café «Poeta Porto» e frequenta vários outros cafés como o Café Diu onde, em tertúlias de amigos, era ouvido frequentemente a recitar os seus próprios poemas.
Com 30 anos (1934), publica o primeiro livro da, que se viria a revelar, sua extensa obra poética (Caravelas ao Mar).
Cinco anos depois (1939), "Segredo", o terceiro livro de sua autoria, recebe o Prémio Antero de Quental (Poesia) que, em 1934 havia premiado "Mensagem" de Fernando Pessoa e "Romaria", de Vasco Reis; Carlos Queiroz (1935), Azinhal Abelho (1936), Ramiro Guedes de Campos (1937) e Miguel Trigueiros (1938).
Seguem-se dezenas de publicações (30) pelas quais vai recebendo prémios como o Prémio Ocidente (1964), o Prémio Casimiro Dantas da Academia de Ciências de Lisboa (1966) e, em 1972, pela obra "Eu desci aos infernos", o Prémio Nacional de Poesia que Fernanda de Castro recebera três anos antes.
Colaborou na «Presença», em «Altura», em «Prisma», em «Litoral», e no semanário «Mundo Literário».
Por diversas vezes foi jurado em Prémios atribuídos pelo Secretariado da Propaganda Nacional.
Apresentou na RTP diversos programas dos quais o que mais se prolongou no tempo foi «Danças e Cantares».
Pedro Homem de Mello publicou há pouco, nos fins de 48, «Miserere». A emoção, a singularidade, a dor, palpitam no seu livro, não isentas, todavia, da presença de uma forma e de um ritmo próprios. O «eu» social, o mundo envolvente, o povo simples, são os motivos mais caros a Homem de Mello. Do universo exterior, o poeta rouba aquilo que mais fortemente lhe toca - e da fusão entre o acto da escolha, e o produto da escolha, nasce uma poesia torturada e insatisfeita. É um universo íntimo lamentando-se de que o resto do universo, pesado e injusto, teve um destino bem diferente. Deste sentimento, nasce «Miserere» - como aliás de um desentendimento, nasce sempre toda a verdadeira poesia...
António Quadros, em «Diário Popular», "A Semana Literária", 1948.
Os seus poemas eram amiúde, escolhidos para serem interpretados em saraus literários e na televisão por Maria Germana Tânger nos seus programas Ronda Poética dos quais se destaca:
7.º programa de 1964, emitido a 12 de Agosto de 1964. Poetas em foco: Pedro Homem de Mello e António Botto. [PT/FAQ/AFC/12/00483];
49.º programa de 1965, emitido a 12 de Junho de 1965. Poetas em foco: Alberto de Serpa, Júlio de Sousa, Augusto Gil, David Mourão-Ferreira e Pedro Homem de Mello. [PT/FAQ/AFC/12/00525]
«Uma noite com Pedro Homem de Mello», na Taverna do Embuçado, quando Germana Tânger disse «Fandangueiro». Lisboa, Alfama, Novembro de 2007. [PT/FAQ/AFC/12/00171]
Também João Villaret, grande apreciador de Homem de Mello, em programa de sua autoria na RTP, declamava poemas de sua autoria, sempre acompanhado ao piano por seu irmão Carlos Villaret.
A Fundação António Quadros guarda também a reprodução do programa televisivo «João Villaret: Poesia Falada» no qual Villaret diz o poema «Povo que lavas no rio» e, entre outros, também, «Ah, que bela manhã de Primavera!» (de Fernanda de Castro). [PT/FAQ/SIM/00050]
A sua poesia chega-nos até hoje na voz de Amália Rodrigues, Helena Tarouca, Frei Hermano da Câmara, Sérgio Godinho, António Zambujo e muitos outros. Quem não se lembra, por exemplo, de «Povo que Lavas no Rio», «Havemos de ir a Viana» ou «O Rapaz da Camisola Verde»?
Com Fernanda de Castro, elaborou "Danças Populares Tradicionais" (manuscrito de Fernanda de Castro preservado na Fundação António Quadros), selecção de danças populares tradicionais, por local ou região, como Serra do Soure, Penafiel, Afife, Minho, Santo Tirso e muitos mais. [PT/FAQ/AFC/03/00399]
Pedro Homem de Mello morreu no Porto, a 5 de Março de 1984, deixando a sua marca, principalmente, na Poesia, no Fado e no Folclore em Portugal. Tinha 79 anos.
A cerimónia fúnebre realizou-se no Porto. Amália Rodrigues esteve presente e, nessa ocasião, aos jornalistas, referiu:
Fui eu quem mais cantou Pedro Homem de Mello, desde rapariguinha. Por isso, a sua morte significa algo de muito doloroso para mim. Desde muito novo que o poeta me marcou. Ele gostava muito de tudo o que fosse português e fazia versos com o coração.
Por sua vontade expressa, Enterrem os meus ossos em Afife | no bravo jardim que me fez Homem, foi sepultado em campa rasa, no cemitério de Afife.
A 24 de Agosto de 1985, foi agraciado, a título póstumo, com o grau de Comendador da Ordem do Infante D. Henrique.
Bibliografia existente na Biblioteca da Fundação António Quadros
DESTERRADO (1970), com dedicatória manuscrita: À Fernanda de Castro, muito minha Senhora, ao grande Poeta que vê, com uma desmentida paixão, a Terra que Deus lhe deu. Homenagem de Pedro Homem de Mello, 1970.
FANDANGUEIRO (1971), n.º 529.
A POESIA NA DANÇA E NOS CANTARES DO POVO PORTUGUÊS (1941), com dedicatória manuscrita: Ao grande poeta Fernanda de Castro. A António Ferro a quem como português tanto devo! Homenagem de Pedro Homem de Mello. Lisboa, dia da chegada de António Ferro à Pátria que ele escolheu em terra do Brasil 6-1-942.
Correspondência para a família «Ferro»
1942.05.02, Porto, carta de Pedro Homem de Mello para António Ferro. [FAQ/01//0285/00001]
1946.02.04, Porto, cartão de cumprimentos (manuscrito de ambos os lados) de Pedro Homem de Mello para Fernanda de Castro. [FAQ/01//0285/00002]
1942.06.02, Porto, cartão de cumprimentos (manuscrito de ambos os lados) de Pedro Homem de Mello para António Ferro. [FAQ/01//0285/00003]
1956.02.23, Porto, carta de Pedro Homem de Mello para Fernanda de Castro. [FAQ/01//0285/00004]
1965.04.04, Porto, carta de Pedro Homem de Mello para Fernanda de Castro. [FAQ/01//0285/00005]
1969.11.00, Porto, carta de Pedro Homem de Mello para Fernanda de Castro. [FAQ/01//0285/00006]
1970.10.31, Porto, carta de Pedro Homem de Mello para Fernanda de Castro. [FAQ/01//0285/00007]
1956.11.14, Lisboa, carta manuscrita (3 fólios/3 imagens) de Pedro Homem de Mello, para Fernanda de Castro, por ocasião da morte de António Ferro. [FAQ/01//0285/00008]
1950.06.01, Porto, bilhete-postal manuscrito para António Quadros. O Postal apresenta na sua frente, um poema de Pedro Homem de Mello “Ó Virgem-mãe de Fátima (…)” inserido numa imagem de António Lino com representação de Nossa Senhora, pombas, etc. [FAQ/01//0285/00009]
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05 — Revista «Nova Águia», n.º 34. Apresentação online.
23 de Setembro: Lançamento On-Line da nova Águia Nº 34…
Entrar Zoom Reunião: Https://Us06web.Zoom.Us/J/89470105999
Id da Reunião: 894 7010 5999
ÍNDICE
NOS 500 ANOS DE CAMÕES
Nos 500 anos de Camões |
Re-Velando Os Lusíadas | Abel de Lacerda Botelho
Dois Passos até Camões | Carlos Aurélio
Da Presença Camoniana nas Origens do nacionalismo Alemão Oitocentista | César Tomé
Retratos em Volta da Ausência: Camões e as Artes Plásticas, Uma Perspectiva Recentrada | Eduardo Paz Barroso
Reverência de Boucharlat A Camões (O Episódio do Adamastor) | Isabel Ponce de Leão
Camões Hoje | Jorge Chichorro Rodrigues
Quem é o Adamastor? | José Madeira
Evocação Histórica de Luís Vaz de Camões e da sua obra literária | Nuno Sotto Mayor Ferrão
Camões, António José da Silva e o Amphitruo de Plauto | Pedro Martins
Os Lusíadas ou quando o arquétipo se realiza na História | Pedro Sinde
BASÍLIO TELES, 100 ANOS DEPOIS
Afinidades e contrastes entre o Pensamento Filosófico de Basílio Teles e o de Teófilo Braga | António Braz Teixeira
Basílio Teles e o Anti-Atomismo | Carlos Fiolhais
Basílio, Bruno e Junqueiro: a crise e a superação | Joaquim Domingues
Basílio Teles e a História | José Esteves Pereira
Notas Breves sobre o pensamento económico de Basílio Teles | José Luís Cardoso
Basílio Teles e a ideia de tempo | Manuel Cândido Pimentel
Entre Basílio Teles e José Marinho: O Humano e o Divino | Renato Epifânio
O Problema do Mal em Basílio Teles | Samuel Dimas
AGOSTINHO DA SILVA, 30 ANOS APÓS A SUA PARTIDA
Agostinho da Silva. do Seu Passamento há trinta anos | Artur Manso
Agostinho da Silva, um ser vindo do futuro | Fernando Dacosta
Agostinho da Silva, o português à solta | Jorge Chichorro Rodrigues
Atualidade do Pensamento de Agostinho da Silva na reflexão sobre o trabalho contemporâneo | José Acácio Castro
Conversando e Vadiando, Vadiando e Conversando com Agostinho da Silva | Juliana Santos
No que resulta a força de destinação de Agostinho da Silva | Lúcia Helena Alves de Sá
Linhas com Agostinho da Silva | Luís de Barreiros Tavares
Espiritualidade de Agostinho da Silva | Renato Epifânio
OUTROS VULTOS
António Quadros | António Aresta
Couto Viana | António Leite da Costa
Eugénio Lisboa | Isabel Ponce de Leão
Fernanda de Castro | Mafalda Ferro
Francisco da Gama Caeiro | Maria Leonor Xavier
José Carlos Venâncio | J.A. Alves Ambrósio
José Marinho | Luís Furtado, João Seabra Botelho e Francisco Moraes Sarmento
Nuno Júdice | António José Borges
Pepetela | César Tomé
OUTROS VOOS
Patrizio Trampetti, um artista moderno ou o ideal da consciência e o dinamismo da música e do canto | António José Borges
Entre Corsino Fortes e Friedrich Nietzsche: dois Poeta-Pensadores (Es)Cultores de Palavras-Símbolo e Mestres da Leitura e da escrita como arte de ruminar | Elter Manuel Carlos
Educação, Valores e Complexidade: Horizontes de Cultura | Emanuel Oliveira Medeiros
Uma Ferida por cauterizar e o erro da Filosofia Portuguesa | Pedro Sinde
deambulações Pró-Lusófonas | Renato Epifânio
Autobiografia 14 | Samuel Dimas
EXTRAVOO
Prioridades para a cooperação na CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa): de Carlos Mariano Manuel (Angola), Paulo Pereira (Brasil), Elter Manuel Carlos (Cabo Verde), Lúcio Sanhá (Guiné), Delmar Maia Gonçalves (Moçambique), Alice Goretti de Pina (São Tomé e Príncipe) e Ivonia Nakak Borges (Timor)…
Discurso de Agradecimento de Carlos Mariano Manuel pelo Prémio Mil Personalidade Lusófona
PERIÓDICOS ETERNOS
Gazeta do Rossio & Gazeta d’Almada ou o Telescópio Português | Pedro Vistas
BIBLIÁGUIO
Fenomenologia da Religião | António Braz Teixeira
A Heresia Portuguesa | Miguel Real
O Espírito Contemporâneo | António Aresta
Ortega Y Gasset: A Vida ao serviço de si mesma sob a forma de Razão | Renato Epifânio
Henrique Gabriel: Imagética do Pensamento & Pintura Objectual de Culto | José Manuel Anes
A Incoerência dos Filósofos | Maria Leonor Xavier
Tratado de Versificação Portuguesa | Júlio Amorim de Carvalho
A Escrita do Sudoeste ou Cónia: Uma Escrita Pré-Romana a sul da Lusitânia | Rui Martins
Adeus Por Hoje… Cartas de Luzia para Fernanda de Castro e António Ferro | Mafalda Ferro
Do que Não Existe | Natália Constâncio
POEMÁGUIO
À Expedição Lusitânia; Camões, nos seus 500 Anos | Renato Epifânio
Kriolu | Vera Duarte
Liberdade | Susana Marta Pereira
O Hermeneuta de Ceuta; Numa Lápide em Sevilha | Jesus Carlos
Para Além das Portas Colossais | António José Borges
Ode a Álvaro de Campos; Ode a Ricardo Reis | Alexandra Barreiros
Artesanato; Água do Rio | Joel Henriques
És Tu | Maria Leonor Xavier
Mar; desconstrução; A Filosofia da Minha Poesia | Samuel Dimas
Camões; A Pedro Homem de Mello; Assim, Lembro e Escrevo | Manoel Tavares Rodrigues-Leal
MORADAS: CADERNO POÉTICO E VISUAL
Poemas de Jaime Otelo e Ilustrações de Gonçalo Dias
MEMORIÁGUIO
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06 — Boletim Folhas à Solta n.º 127 de Associação Agostinho da Silva: Acerca de Agostinho da Silva, por Miguel Real.
Indubitavelmente o mais desconcertante dos pensadores portugueses do século XX, o pensamento paradoxal de Agostinho da Silva (1906–1994) opõe-se a uma visão racionalista da cultura portuguesa, que identifica o atraso económico, político, cultural e social de Portugal com a ausência de três revoluções que transformaram a face política da Europa moderna: a religiosa, com a emergência do luteranismo; a revolução científica dos séculos XVI e XVII, com explícito privilégio atribuído à Matemática, à Física e à Astronomia, e a revolução política do século XVIII na Inglaterra, na França e nos Estados Unidos da América. Para Agostinho da Silva, a ausência destas três revoluções teria poupado Portugal a uma diluição no espírito europeu moderno e a conservar, como um tesouro civilizacional, um messianismo providencialista, de carácter patriótico (o Quinto Império, a Idade do Espírito Santo), que tendia a estatuir o nosso país como singularmente detentor do cumprimento de uma especial missão no mundo, não já como potência imperial armada, mas como exemplo ético-cultural.
Assim, o messianismo, isto é, a crença em uma futura salvação coletiva por via de um instrumento social de regeneração, constitui-se como um dos traços mais constitutivos do pensamento de Agostinho da Silva, expresso nos seus livros Um Fernando Pessoa e Reflexão à Margem da Literatura Portuguesa. Neste sentido, Portugal nem abandona a sua tradição espiritual medieval, nem segue a nova arquitetura espiritual europeia, residindo nessa ambiguidade histórica tanto as virtudes da criação de novos mundos quanto os defeitos e as perversidades que, no território europeu, lhe são atribuídos (a Inquisição, o centralismo régio, a decadência económica, a miséria popular, o arcaísmo das instituições...).
A crença joaquimita do valor do Espírito Santo na cultura portuguesa faz Agostinho da Silva elevar as festas do Espírito Santo a síntese e símbolo da nossa cultura: o Imperador identificado com uma criança, símbolo da luta contra a razão contabilista dominadora da Europa, o bodo como igualdade entre todos os homens e a libertação dos presos da prisão como símbolo de um novo mundo isento de mal.
Agostinho da Silva dizia-se defensor, não da ortodoxia, que imobilizava a História, não da heterodoxia, momento de rebelião que não se ultrapassava a si próprio, mas da Paradoxia, que ambos compreendia e superava.
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07 — Diário 1980, de Paulo Ribeiro Baptista. Divulgação
“Anos de chumbo”? Talvez haja nisso algo de exagero, mas foi assim que foram sentidos por alguns, também por mim. Após o período “revolucionário”, entre 1974 e 1977, os anos que se seguiram, e muito particularmente o início dos anos 1980, representaram uma espécie de “anos de chumbo”. Uma contra vaga conservadora que tentou submergir, em parte, o oceano de liberdade que Abril tinha trazido. O clima económico não ajudava, com a segunda crise do petróleo e a intervenção do FMI em Portugal, em 1983.
Foi então que comecei a fotografar. No departamento de fotografia do ICBAS, com o fo- tógrafo Abel Roldão, descobri a fotografia documental, sobretudo inglesa e americana. Também aprofundei a minha prática no quarto escuro.
Senti a pulsão de ir para a rua e, com a câmara, tentar traduzir impressões e sentimentos em imagens. Tive o privilégio de usar um dos instrumentos mais eficazes para essa demanda, uma pequena Leica. Já em Lisboa, juntei-me a um grupo de aficionados que se reunia na galeria Ether, Vale Tudo Menos Tirar Olhos. Assim, foi nascendo, uma espécie de diário visual. Ora registava momentos de pura sedução pela luz, ora a surpresa dos rostos, das expressões, das formas ou do movimento urbano. À distância de quarenta anos, identifico claramente, nessas imagens, os traços desses “anos de chumbo”, numa visão que já carregava em si alguma nostalgia do tempo anterior, mas com traços daquilo que se tornou perene, como a liberdade individual
Paulo Ribeiro Baptista é doutorado em História da Arte (FCSH-Universidade Nova de Lisboa) e curador de fotografia no Museu Nacional da Dança e do Teatro (Lisboa). Publicou os fotolivros Guia de Tavira (1990) e Da Natureza das Imagens (2019). Teve as suas fotografias expostas em diversas exposições, individuais e colectivas. Individualmente no Museu Nacional da Música - Banda Filarmónica da Carris (2006), na Casa das Artes de Tavira (1990 e 2019), na Faculdade de Ciências Médicas do Porto (1982), no Museu e Centro de Artes de Figueiró dos Vinhos (2018), no Centro de Artes e Espetáculos da Figueira da Foz (2020), na Capitania/Museu Municipal de Aveiro (2021) e no Museu Nacional do Traje (2021). |
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08 — Outras notícias e publicações recentes
VALE A PENA
A Hemeroteca Municipal de Lisboa convida o público interessado a assistir e participar no II Encontro «A Imprensa como fonte de investigação». Uma conversa com a presença de dois autores de trabalhos produzidos com base na imprensa: Beatriz Ruivo e Tiago Beato. O evento acontece no próximo dia 19 de Setembro, pelas 18h nas instalações da Hemeroteca. Entrada livre |
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09 — Livraria António Quadros
Obra em Promoção até 14 de Outubro de 2024
Autoria: António Quadros
Título: A Paixão de Fernando P. Romance [2.ª edição revista e aumentada]
Coordenação e Introdução: Mafalda Ferro
Ensaístas: Anabela Almeida, Fabrizio Boscaglia, Joaquim Domingues, José António Barreiros (prefácio), José Carlos Seabra Pereira, Lourenço de Morais, Manuel Cândido Pimentel, Manuel Dugos Pimentel, Manuela Dâmaso, Paula Mendes Coelho, Paulo Samuel, Pedro Martins, Ricardo Belo de Morais e Risoleta Pinto Pedro
Descrição: Reedição que integra catorze estudos, resultantes de quatro tertúlias realizadas sobre a obra em Lisboa, Óbidos, Vila Nogueira de Azeitão e Porto
Textos biobibliográficos de António Quadros (Apontamento biográfico, Prémios, Distinções, Presença na Toponímia Nacional, Bibliografia activa: Mafalda Ferro
Edição — Lisboa: Fundação António Quadros Edições | JAB Livros, 2024.
Apoio Institucional: Câmara Municipal de Rio Maior.
PVP: 18€ |
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