MARIA GERMANA TÂNGER REFERÊNCIAS, CITAÇÕES, TESTEMUNHOS por Mafalda Ferro Mário Cesariny chamou-lhe a poeta de poetas; Almada Negreiros, ao ouvi-la dizer Poesia, disse-lhe Maria Germana, você passa a dizer a minha poesia. Maria Germana… - Lamentava o atropelo que se faz à língua portuguesa, como o do Acordo Ortográfico. - Sublinhava que dizia poesia, não declamava. Era contra a declamação porque, se deve sentir o que se diz, sentir o poeta. Mafalda Ferro… Durante os seus 25 anos de carreira, ensinou Poesia e a Arte de a Dizer a centenas de alunos como consta numa lista, em 21 páginas, preservada na Fundação António Quadros, na qual se reconhecem nomes como José Carlos e Diogo Ary dos Santos, José Walenstein, Carlos Fogaça, João Lagarto, Manuel Silva Pereira (aluno do Colégio Manuel Bernardes), Maria Emília Arriaga, Maria Alberta Menéres, Maria Elisa Domingues (aluna em «Arte de Dizer», mais tarde locutora e directora de informação da RTP), Maria Paula Figueiredo (aluna em «Arte de Dizer», mais tarde Juiz de Direito), João Grosso (actor), Graça Lobo, Leonor Poeira, António Tânger Correia (aluno do Colégio Manuel Bernardes), Rita Blanco, São José Lapa, Isabel Medina, Sousa Costa (aluno do Colégio Manuel Bernardes) Teresa Corte Real. Ensinou também Maria Guinot, Alexandra Lencastre, Rui Vieira Nery… João Grosso… Maria Germana entrou na sala de aula do curso de actores de 83/84, eu, com a minha tendência descarada, fiz uma chalaça: levei uma reprimenda que me deixou a tremer, senti que tinha sido incorrecto perante alguém cujo porte me impressionara. Lançou um exercício de leitura de cinco linhas de um conto de Eça de Queiroz, entaramelei-me em cada duas palavras. No final da minha leitura, silêncio. Esperei o pior, o olhar penetrante, radiográfico da Germana, furou-me a alma, só sentia angústia, e ouvi aquela voz, que se tornou irredutivelmente num bordão para a minha vida, a dizer: tens cabeça de poeta, vou apontar aqui no meu caderno. Paixão, paixão absoluta, aquela mulher apoiava o que nem sempre eu tinha percebido na minha vida, era a poesia, não literária, mas na alma, a poesia na percepção da vida. Nunca mais nos largámos. Trabalho, entusiasmo, e a Germana sabia excelentemente incutir o entusiasmo, exigência e, sobretudo, o amor por Pessoa. Costumava assomar comigo à janela da casa do largo de S. Carlos e dizer: vamos falar com o Pessoa. Olhávamos para o quarto andar do prédio na fronteira diagonal e eu ouvia religiosamente, com a atenção do aprendiz para o seu mestre, aquela voz orgânica, que simbioticamente fazia vibrar o meu esqueleto, a declamar versos de todos os heterónimos como se fossem água a correr ou o sino dos Mártires a darem o sinal das horas. Vivemos projectos em conjunto, e todos os meus pessoais, que não houve nenhum que não fosse acalentado pela Germana, vivemos viagens, até um cruzeiro pelas cidades e rios da Rússia, vivemos consoadas, éramos a família no Natal, e as festas de fim de ano, em minha casa, tinham o brilho da sua estrela a trazer coragem para mais um passo a todos os convivas. Gostávamos de copinhos, nos últimos anos, quando já não lhe era possível sair de casa normalmente, era uma alegria quando eu chegava com uma pequenina garrafa, que ainda conservo, cheia de Gin e duas águas tónicas para o nosso fim de tarde. ... E as festas até às quatro da manhã no curto período em que alugou casa na rua das Chagas! A Germana foi para mim uma mãe, uma mãe de arte, agarrado ao seu seio aprendi a estar no meio, a puxar pelos brios, a elaborar e a ousar a diferença. No meu casamento com o Rui, para ela Ruizeco, quis sair da conservatória de braço dado com os cônjuges. Soube reanimar em mim a nobreza que as dificuldades da vida quase tinham erodido. E como ficava linda, quando ao chegar eu com um novo boné ela queria experimentá-lo, em pose, para a fotografia! Passou-me a Ode Marítima, o seu grande trabalho , estreado em 59, um ano depois de eu nascer. Essa Ode que se tornou também o meu grande trabalho, que, ao fim de trinta e muitos anos, ainda não consegui escavar na totalidade. O que nós trabalhámos: coragem, coragem, entusiasmo, atira-te para o abismo, sem receio, com toda a tua alma. E eu por vezes morria, morria na chuva, morria nas poças oleosas da Lisboa esburacada. Mas ouvia, e ouço sempre, aquele som da sua voz, de todo o seu corpo vibrante a levantar-me com o filão mais profundo da poesia. No último minuto, a sós, ainda nos rimos com a proposta de um champanhe para festejar o seu 98º aniversário. E olhando-me com aquele "olhão", numa tranquilidade espantosa, disse-me: eu não estou nada bem. Para sempre minha querida mãe Germana. Maria Paula Figueiredo… Foi na Fundação Lusíada que a conheci pessoalmente, tendo-me sido apresentada pelo meu colega e amigo Abel Lacerda Botelho, no Círculo Eça de Queiroz. Nas audições, o poema que a Maria Elisa sempre dizia era o conhecido do António Gedeão (Luísa sobe, sobe a calçada, intitulado, salvo o erro, Calçada de Carriche). É um poema muito onomatopaico e a Maria Elisa dizia-o na perfeição. Manuel Silva Pereira… Maria Germana dirigiu as festas anuais doa alunos do Colégio Manuel Bernardes, em Lisboa. O António Tanger era aluno do Colégio, e eu também lá estive dos 3 aos 16 anos. Lembro-me bem da Maria Germana; devo-lhe uma parte do meu interesse pelo teatro. Luís Eduardo dos Santos Ferro (a propósito do seu acervo divulgado na newsletter da Fundação) Conheci a Germana Tânger relativamente bem, em circunstâncias diversas. Muito em Sintra, em casa de Olga Cadaval; a partir de certa data tinha uma residência em Sintra, vizinha da Igreja de Pedro. E em Lisboa, a sua residência era no Largo de Carlos. O espólio deve ser interessantíssimo e precioso para melhor conhecer e avaliar tópicos marcantes da vida cultural lisboeta / nacional durante um largo período de tempo. O amplo grupo de personalidades aqui convocadas é IMPRESSIONANTE! Mais uma 'prenda' que te devo, onde me localizo e tanto gosto me traz!
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