Meu Pai
Excertos do testemunho de António Quadros, publicado no Diário de Notícias (Nov.56), dias após a morte de seu pai.
«(…) Deixa-me um imenso vazio, que nada poderá substituir. Creio que deixa um vazio, igualmente, na vida portuguesa. Homem público, funcionário, diplomata, o seu trabalho literário dos últimos anos não é conhecido. Espero que, conforme seu expresso desejo, sejam editados, pouco a pouco, a sua poesia, o seu teatro, o seu «Diário Íntimo», em que as páginas de memórias alternam com as impressões da vida quotidiana e com as observações literárias e artísticas. O público conhecerá ou reconhecerá então um António Ferro diferente, de delicada e profundíssima sensibilidade, e uma cultura vastíssima, actualizada, coada sempre pela emoção que toda a obra de arte provocava no homem e no esteta que ele era. Foi até ao fim um homem superior.(…) Deixou-me uma carta que é o mais nobre e rico testemunho que um pai pode deixar a um filho, e que guardarei sempre junto à minha alma. Diz, a terminar: Uma última recomendação: sê bom, sê bom através de tudo, até quando tenhas de responder à maldade dos outros. A glória humilde, a glória íntima do coração é a maior e a mais bela de todas. Não poder continuar a fazer bem aos outros, a ser, ao menos, gentil para com eles, é agora o meu maior sofrimento.
Era assim o meu pai. Era assim o António Ferro que eu conhecia.» António Quadros
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