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Newsletter Nº 203 / 14 de Novembro de 2023
Direcção Mafalda Ferro Edição Fundação António Quadros
ÍNDICE

01 — Encerramento do Centenário de António Quadros: As «Conversas» vão ao Porto. Divulgação.
02 — Domingos Monteiro e António Quadros, amigos para além do tempo, por Mafalda Ferro.
03 — Domingos Monteiro, António Quadros e as Bibliotecas Itinerantes, por Mafalda Ferro.
04 — Domingos Monteiro, um Testemunho, por Mafalda Ferro.
05 — Colóquio Internacional «120 anos do nascimento de Ana de Gonta Colaço». Memória.
06 — Manuela Nogueira: Desassossego sem fronteira, de Carla Parisi e Conceição Andrade. Divulgação.
07 — Publicação de "Poemas 1934-1961", Volume I, de Pedro Homem de Mello. Divulgação.
08 — Publicação de duas obras de Reto Mónico (escritor suíço). Divulgação.
09 — Programação prevista para a última Newsletter de 2023 (Dezembro). Informação.
10 — Livraria, obra em promoção: Memória de Francisco Lage. Da prática à Teoria, de Maria Barthez.

Editorial,

por Mafalda Ferro


Quando António Ferro, o meu avô, morreu, no dia 11 de Novembro de 1956, há 61 anos, eu tinha apenas 2 anos e ele vivia longe, em Roma. Embora poucas vezes tivéssemos estado juntos, sei que o conheço, hoje, como a poucas pessoas. 

Foi um Homem Bom, Trabalhador, Honesto e Leal. Tinha fragilidades e muito mais qualidades que defeitos.

Depois da sua morte, foi encontrado um envelope «Para ser entregue ao meu filho António depois da minha morte» com um extenso e inspirador texto de despedida de que partilho hoje o final:

Uma última recomendação: sê bom, sê bom através de tudo, até quando tenhas de responder à maldade dos outros.
A glória humilde, a glória íntima do coração é a maior e a mais bela de todas,

Não poder continuar a fazer bem aos outros, a ser, ao menos, gentil para com eles, é agora o meu maior sofrimento.

Um grande beijo do teu pai, para além da morte, outro para a Pó que estimei sempre, e beijos também para os teus filhos cuja graça já não pude saborear como tanto sonhei e desejei.
E peço-te que não chores… A morte é o único repouso possível para quem está minado como estou minado. António, 30-5-1956.



Ainda a propósito do romance de António Quadros publicado a 14 de Julho deste ano, em homenagem ao dia do seu nascimento, cem anos depois:

Título: "A Paixão de Fernando P.", romance

Autoria:
António Quadros

Introdução de António Quadros: 
Todos julgam saber quem é Fernando P. mas não sabem. Nem o autor o sabe. Nem o próprio Fernando P. o sabia.

Introdução do livro:
Mafalda Ferro

Prefácio:
José António Barreiros

Edição: Lisboa, Fundação António Quadros Edições, 2023

Venda exclusiva:
- Casa Fernando Pessoa, Lisboa;
- Fundação António Quadros (presencial e online).


Para aquisição à Fundação, contacte:
mafaldaferro.faq@gmail.com



Para ler o BOLETIM N.º 120 da «Associação Agostinho da Silva» presidida por Maurícia Teles, clique AQUI


Clique nas seguintes NOTÍCIAS
do «Projecto António Telmo Vida e Obra» dirigido por Pedro Martins:

18 de Novembro, às 15:30, no Museu Berardo Estremoz: «ANTÓNIO TELMO EM ESTREMOZ»

No passado dia 21 de Outubro, na Casa-Memória Joana Luísa e Sebastião da Gama, em Azeitão: TERTÚLIA EM TORNO DE «A PAIXÃO DE FERNANDO P.», DE ANTÓNIO QUADROS


Obra em Promoção na Livraria da Fundação, até 14 de Dezembro:
Memória de Francisco Lage. Da prática à Teoria, de Maria Barthez.

 
01 Encerramento do Centenário de António Quadros: As «Conversas» vão ao Porto.
Divulgação.

 

 


Depois de diversas actividades realizadas em homenagem a António Quadros no ano do seu centenário de nascimento das quais se destaca um congresso, dois colóquios, a assinatura de dois protocolos com associações culturais, de uma composição musical para poema de sua autoria, três exposições, duas mesas-redondas, várias palestras, a publicação de um romance inédito, a entrega do Prémio António Quadros, a colocação de um placa na casa onde nasceu e viveu, a inauguração do Jardim António Quadros em Rio Maior, a pintura de quadros, a leitura de poemas e excertos da sua obra, e de três sessões de «Conversas em torno d'«A Paixão de Fernando P.» de António Quadros, nomeadamente em Lisboa (Casa Fernando Pessoa), Óbidos (Fólio Literário) e Vila Nogueira de Azeitão (Associação Cultural Sebastião da Gama, com as participações, em Mesa, de Anabela Almeida, Fabrizio Boscaglia, José António Barreiros, Lourenço de Morais, Manuel Cândido Pimentel, Manuel Dugos Pimentel, Manuela Dâmaso, Paula Mendes Coelho, Pedro Martins, Ricardo Belo de Morais e Risoleta Pinto Pedro...

ANUNCIA-SE hoje a próxima e última das «CONVERSAS», desta feita no Porto, na Cooperativa do Povo Portuense, no dia 17 de Novembro às 18h, com a participação de Joaquim Domingues, José Almeida, José António Barreiros, José Carlos Seabra Pereira e Paulo Samuel. Será servido um porto de honra. Todos estão convidados.

 
02 — Domingos Monteiro e António Quadros, amigos para além do tempo,
por Mafalda Ferro.


Cerimónia de entrega do «Prémio Diário de Notícias» a Miguel Torga pelo seu livro mais recente (o volume X do Diário), distinção que contempla igualmente toda a sua obra literária. Grupo de intelectuais no qual se reconhece: Jacinto do Prado Coelho, Domingos Monteiro, António Quadros, Miguel Torga, Luís Francisco Rebelo. Francisco da Cunha Leão, Pereira da Costa, Luís Teixeira e Clemente Rogeiro (de pé); Augusto de Castro, Andrée Crabbé (mulher de Miguel Torga) e Natércia Freire (sentados). Lisboa, 20 de Abril de 1969. [FAQ/06/05210]


Apesar de Domingos Monteiro ter nascido a 6 de Novembro de 1903, cerca de vinte anos antes de António Quadros, a diferença de idades não os impediu de ser amigos e de colaborar em inúmeros projectos literários ou outros como, desde 1958, o das Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian ou, em 1961, nos colóquios «O que é o Ideal Português» na Casa da Imprensa à Rua da Horta Seca com intelectuais e artistas como Francisco da Cunha Leão, António Duarte, Bernardo Santareno e António de Macedo.

São vários os textos (éditos ou inéditos) de António Quadros sobre Domingos Monteiro. 

Em «Domingos Monteiro, personagem de Domingos Monteiro» manuscrito preservado na Fundação (cuja caligrafia lamentavelmente nos impediu de o transcrever na íntegra), António Quadros escreve:

Transmontano de cepa antiga, desceu de Barqueiros e de Mesão Frio, à conquista do país e de si próprio, com paragens iniciáticas no liceu de Vila Real, na mesa de café de Guerra Junqueiro, no solar de Teixeira de Pascoaes em Amarante e, por último, na Faculdade de Direito de Lisboa, onde conseguiu bater nas classificações, com menos estudo, mas com mais sabedoria intuitiva, o seu colega Marcelo Caetano.
Não seguiu contudo a carreira universitária, porque a sua tese de licenciatura, muito política, fez escândalo. Ainda tentou uma carreira de advogado, aliás com intervenções espectaculares no foro, onde nunca tinham ouvido metáforas como as suas. Mas, Domingos Monteiro estava destinado a ser a melhor personagem de Domingos Monteiro. 
[FAQ/13/00550]


Na sua obra "Critica e Verdade. Introdução à Actual Literatura Portuguesa" (1964), António Quadros inicia o capítulo (p.181) «Na fronteira do Visível» sobre o livro de Domingos Monteiro "História deste Mundo e do Outro" definindo o autor:


Eterno e vagabundo contador de histórias, que vai de terra em terra levando ao sedentário estático a rica e multímoda experiência do nómada meio poeta, meio caçador de imagens, emoções e ideias.

E acrescenta:

Este dom natural de contar histórias, esta noção do ritmo, esta sábia preparação do climax, esta possibilidade de criar um espaço imaginário em que o real se apresenta simultaneamente no mais patente e no mais simbólico, são porventura as características que definem imediatamente a arte de Domingos Monteiro.

Em 1980, tendo entendido mais profundamente o Homem e a Obra, António Quadros  publica n'«O Dia»:

Uma novelística da razão vital, como a que realizou, intuitiva e exemplarmente, Domingos Monteiro, é uma novelística que se amplia a todas as dimensões de ser homem, na sociedade, na natureza, no tempo e no mistério de existir.


A Biblioteca de António Quadros, agora parte do acervo da Fundação, guarda diversas obras de Domingos Monteiro, muitas delas com dedicatórias manuscritas que comprovam a amizade e admiração presentes na relação entre os dois amigos como A Traição Inverosímil. Comédia dramática em três actos; Contos de Natal; Evasão. Poemas; Histórias deste Mundo e do Outro; Nau Errante. Poemas; O Caminho para lá. Romance. Série: A Porta do Outro Mundo. Volume I (trilogia inacabada); O Destino e a Aventura; O Dia Marcado; O Homem Contemporâneo: Subsídios para a sua História; O Mal e o Bem. E outras novelas; O Primeiro Crime de Simão Bolandas; Paisagem Social Portuguesa; A Medicina e a Literatura nas suas Mútuas Relações; e ainda obras como The Narrative Art of Domingos Monteiro, de Claire Paolini e 
"Escritores Doutrinados" de Álvaro Ribeiro (Lisboa: Sociedade de Expansão Cultural, 1965), obra dividida em três partes: «Ontologia dos Valores Poéticos» (1 capítulo, 31 pp.) dedicada a António Quadros; «Bergson Filólogo» (20 capítulos) dedicada a Orlando Vitorino; «Psicologia e Ética na obra de Domingos Monteiro» (20 capítulos) dedicada a Afonso Botelho.

Importa salientar que as obras de Domingos Monteiro (poesia, ficção e teatro, posteriores a 1948) foram publicadas pela «Sociedade de Expansão Cultural», editora por ele fundada em 1948 que então só publicava autores portugueses, geralmente com capas e/ou ilustrações de Manuel Ribeiro Pavia ou de Júlio Gil.


 

No Arquivo Histórico da Fundação António Quadros, estão preservadas 47 cartas de Domingos Monteiro das quais 43 integram o Processo das Bibliotecas Itinerantes da FCG, uma é dirigida a António Quadros e 3 a Afonso Cautela, entendendo-se assim o empenhamento e a paixão que colocava não só da sua obra literária como nas funções que exercia.

A quase completa inexistência de correspondência enviada por Domingos Monteiro e António Quadros deve-se ao facto de estarem quase todos os dias juntos na Gulbenkian.

O Arquivo da Fundação preserva também textos de António Quadros como «Conhece e defende a cultura portuguesa: tempo moderno e tempo rural» (2 fólios dactilografados sobre Domingos Monteiro».

Em "Estruturas Simbólicas do Imaginário na Literatura Portuguesa", último livro de António Quadros, publicado em Novembro de 1992, o Autor dedica-lhe um capítulo (p.131) a que chamou «Domingos Monteiro, Novelista da Razão Vital» que inicia com o sub-capítulo «Simplicidade Narrativa, Conhecimento do Homem e Valores Humanos», referindo que a «obra de Domingos Monteiro levanta, na sua aparente simplicidade, uma série de problemas que seria tentador analisar em monografia apropriada», tema que segue desenvolvendo.
E, avança, analisando alguns dos seus livros e temas associados. O Autor termina este capítulo afirmando que:


A obra de Domingos Monteiro é das que vão renascer e perdurar, porque se imporá às gerações futuras.


Esperemos que, pegando nesta afirmação de António Quadros, e no âmbito dos 120 anos depois do nascimento de Domingos Monteiro, a sua «Obra Completa» seja publicada.

 
03 Domingos Monteiro, António Quadros e as Bibliotecas Itinerantes,
por Mafalda Ferro.

 

Reunião de trabalho efectuada nos primeiros tempos do Serviço de Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian, 1958/1959. Reconhece-se de frente: Tomás Kim (Joaquim Fernandes Tomaz Monteiro-Grillo), Domingos Monteiro, Branquinho da Fonseca, António Quadros, Alexandre O'Neill. [FAQ/06/05822]



O Serviço de Bibliotecas Itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian, presidida por José de Azeredo Perdigão, foi criado em 1958, sobre três pilares fundamentais: Branquinho da Fonseca (1905/1974) como primeiro Director-Geral, Domingos Monteiro (1903/1980) como Director-Adjunto e António Quadros (1923/1993) como Inspector-Geral. 

Em 1973, ainda antes da morte de Branquinho da Fonseca, Domingos Monteiro assume interinamente o cargo de Director-Geral e, um mês depois, em carta de 11 de Junho de 1974, solicita autorização para, sem aumento de ordenado, acrescentar às funções de António Quadros enquanto Inspector-Geral as de Director-Adjunto e às de Orlando Vitorino, então Inspector regional, as de 1.º assistente da direcção.

Durante os seus 22 anos na Gulbenkian, Domingos Monteiro preside à Comissão de Escolha de Livros, também constituída por António Quadros e Tomás Kim. No âmbito das suas funções encarrega-se da aquisição de obras literárias, organiza colóquios e conferências, participa nas reuniões dos encarregados e apoia a elaboração do inventário geral das Bibliotecas Itinerantes. Os sumários do Boletim Informativo são sempre combinados com Domingos Monteiro, António Quadros e Orlando Vitorino.


Depois da morte de Domingos Monteiro (1980), António Quadros é promovido a Director-Geral, cargo que ocupa apenas até 1981, optando nesse ano por se reformar para poder dedicar todo o seu tempo ao projecto que criara em 1969, o IADE. Propõe, então, David Mourão-Ferreira para o substituir. A proposta é aceite e David Mourão-Ferreira dirige as Bibliotecas Itinerantes, desde então até 1996 (ano da sua morte).

Depois da revolução de Abril de 1974, 
muitos são os problemas com que as Bibliotecas Itinerantes, nomeadamente  Domingos Monteiro, António Quadros e Orlando Vitorino, têm que lidar, os conflitos que têm que evitar, os «sapos» que têm que engolir. São quase diariamente formados órgãos directivos e comissões que, pouco tempo depois, são extintos e as suas decisões, anuladas.
Parece não haver coordenação possível. Apesar disso, a direcção mantém-se nas mãos de Domingos Monteiro e de António Quadros que, bastante conciliadores, fazem o possível e o impossível para continuar a trabalhar conjugando os objectivos pré-definidos e os posteriormente impostos. António Quadros, 
por ser filho de quem era, é o mais penalizado.

Pretende-se, inclusive, extinguir a Comissão, facto que, a concretizar-se, deixaria inúmeros funcionários no desemprego. É, para a direcção, uma luta. Tudo é uma luta...

Em Janeiro de 1976, António Quadros escreve a Domingos Monteiro colocando o seu cargo na Comissão de Escolha de Livros à disposição. 

Esta Comissão, também chamada de Leitura, passou posteriormente a ser constituída por Patrícia Joyce, Maria João de Vasconcelos, Natércia Freire, Orlando Vitorino, e Breda Simões.


Assim, destacamos as principais personalidades, primeiros directores que trabalharam no Serviço das Bibliotecas Itinerantes:

- Branquinho da Fonseca, de 1958 até 1974 (durante 16 anos, sendo que nos últimos, bastante ausente, doente).

- Domingos Monteiro, de 1958 até 1980 (durante 22 anos).

- António Quadros, de 1958 até 1981 (durante 23 anos).

- David Mourão-Ferreira, de 1981 até 1996 (durante 15 anos).

 

Quarenta e quatro anos depois, no dia 19 de Dezembro de 2002, para desgosto de muitos, as Bibliotecas encerraram a sua actividade. É opinião de muitos que deviam ser reactivadas.

 
04 — Domingos Monteiro, um Testemunho,
por Mafalda Ferro.

 

Homenagem a Fernanda de Castro, em celebração dos seus 50 anos de Vida Literária (1919-1969), no Restaurante «A Quinta». Reconhece-se Natércia Freire, [...], Fernanda de Castro, Domingos Monteiro, Natália Correia, [...], Heloísa Cid, [...]. Lisboa, 1969. [FAQ/06/02723]



Tinha eu 15 anos quando, pela primeira vez, ouvi e vi Domingos Monteiro. Foi em 1969, no Restaurante «A Quinta», durante a homenagem que foi feita a Fernanda de Castro, minha avó, em celebração dos seus 50 anos de Vida Literária. Além de Domingos Monteiro, foram também oradores Hernâni Cidade, Vitorino Nemésio, David Mourão-Ferreira, Natália Correia e Ary dos Santos. Não fixei nada do que disseram mas lembro-me de que os achei, quase todos, fascinantes e, ao Domingos Monteiro, muito querido por tudo quanto disse sobre a minha avó (que eu já não me lembro o que foi).


Recordo que, depois de uma visita sua a nossa casa na Calçada dos Caetanos 7 (fôramos para lá viver algum tempo depois da morte do meu avô Ferro, mais ou menos quando o meu pai, António Quadros, começou a trabalhar na Gulbenkian), o achei muito simpático. Quando ele saiu, o meu pai disse-me que era um escritor seu amigo e perguntou-me se eu já tinha lido algum livro dele. Eu, que era, nessa altura, uma leitora compulsiva, respondi, envergonhadamente, que não. O meu pai levou-me então ao seu escritório, um lugar que era, para nós, filhos, completamente interdito, um lugar que era, para mim, mágico, um lugar sem paredes já que estas estavam completamente forradas de estantes cheias de livros, um lugar que se dividia em duas zonas: um espaço de escrita com uma enorme secretária que a minha mãe pintara de verde e livros, livros, livros... e um espaço de leitura com sofás e livros, livros, livros.... De uma dessas estantes, nesse dia, o meu pai retirou um volume que me entregou. Era um romance, chamava-se "O Caminho para lá" e entregou-mo dizendo: «Aposto que vai gostar mas olhe que é triste...».


Li-o nessa noite de uma vez só, às escuras, 
com uma lanterna debaixo dos cobertores, no quarto que partilhava com a minha irmã. E, voltei a lê-lo, semanas depois, já de férias na Praia das Maçãs, instalada numa cova, tipo ninho, que cavara numa duna, envolta por um canavial cerrado que ali crescia selvagem e que era um dos meus esconderijos de leitura preferidos. Costumava despedir-me da minha mãe, levando ao ombro um saco onde guardava a toalha, o farnel e um ou dois livros dizendo que ia para a praia mas, de vez em quando, ficava por ali, no areal ao lado de casa, sozinha durante todo o dia.


Se bem me lembro, era a história de um menino, órfão de mãe, que, sobre ela, ouvia sempre dizer «Já lá está... (ou algo parecido)» mas a quem ninguém ensinava o caminho para lá. Penso que quando acabar de o reler, porque o estou a fazer, o interpretarei de outra forma. Não sei...

Soube depois que o livro fora pensado como parte de uma série de três intitulada «A Porta do Outro Mundo» que o autor não terminara. Tive pena.

Pouco depois do meu pai começar a trabalhar nas Bibliotecas da Gulbenkian com dois grandes amigos,  Branquinho da Fonseca e Domingos Monteiro, entrei para a primeira classe. Como meu pai, adorava estar rodeada de livros e lembro-me de me sentir muito crescida quando ele me fazia, com ar sério, perguntas sobre as minhas últimas leituras para, segundo o que me dizia, preencher as fichas bibliográficas referindo o ponto de vista do leitor.


Em fins de semana ou tempo de férias, o meu pai levava a família nas suas viagens por terras de Portugal, de biblioteca em biblioteca, e eu, extasiada, mergulhava nas carrinhas da Gulbenkian onde me davam livre acesso a todas as prateleiras, coisa que não acontecia em minha casa. Embora me quisessem sempre encaminhar para as que “eram para a minha idade”, deliciava-me a espreitar também as outras.


Gostava, além disso, de observar o ritual das pessoas que, a pé, iam chegando a cada carrinha e que, como eu, escolhiam, calma e cuidadosamente, os livros que guardariam, leriam e releriam, até que a biblioteca sobre rodas voltasse a passar pela aldeia, cerca de um mês depois. Nessa época, as crianças não costumavam frequentar bibliotecas e o acesso aos livros não era tão fácil como hoje, principalmente nas terras mais isoladas. Adorava que o meu pai tivesse aquele trabalho, alimentava-me o gosto pela leitura e pelos livros que me tem acompanhado sempre. Estou certa que o mesmo aconteceu com várias gerações de crianças e adultos durante os quarenta e quatro anos de vida das Bibliotecas Itinerantes 
(1958 / 2002).


Vim a saber depois que, anos antes (1945), o meu avô António Ferro, tinha fundado as Bibliotecas Ambulantes de Cultura Popular do SNI, que, até 1949, ano em que deixou de trabalhar no SNI e partiu para Berna, haviam percorrido muitas aldeias de Portugal com os mesmos objectivos.


Hoje em dia, existem imensas bibliotecas mas, naquela altura, como só havia bibliotecas e livrarias nas grandes centros urbanos, o acesso aos livros era muito limitado.


Eu frequentei as Bibliotecas Itinerantes, espaçadamente, entre os 6 e os 19 anos. Os meus gostos começaram pelas obras da Condessa de Ségur, da Odete de Saint Maurice, da Virgínia de Castro e Almeida, pel’"A menina do Mar", de Sofia de Melo Breyner, pela Biblioteca das Raparigas… e, rapidamente, evoluíram, a conselho do meu pai e da minha avó ou do meu gosto, para escritores portugueses, russos, ingleses, brasileiros e franceses. Lembro-me de ler toda a bibliografia de Camilo Castelo Branco, Júlio Diniz, Eça de Queiroz, Alexandre Herculano, Domingos Monteiro, Charles Dickens, Vítor Hugo, Louisa May Alcott, Fernanda de Castro, Erico Veríssimo, José Mauro de Vasconcelos, Soeiro Pereira Gomes, Tolstoi, Dostoievsky, Shakespeare, entre muitos, muitos outros.


Saía sempre das carrinhas da Gulbenkian carregada de livros, desejosa  de, um dia, poder trabalhar rodeada de livros. E, assim aconteceu.


Durante este mês, em homenagem a Domingos Monteiro, um dos fundadores das Bibliotecas Itinerantes, estou a (re)ler "O caminho para lá" e, depois, tenciono continuar para um livro seu de que já não me lembro, proveniente da biblioteca do meu pai, "Histórias deste mundo e do outro", obra dedicada «Ao Dr. José de Azeredo Perdigão e Ao Branquinho da Fonseca O. D. C.», com uma dedicatória manuscrita do autor «Ao António Quadros, ao escritor de real talento, com profunda e sincera amizade e um abraço do Domingos Monteiro. Lx. Maio de 1961.»

 
05 Colóquio Internacional «120 anos do nascimento de Ana de Gonta Colaço».
Memória.


Aconteceu este mês em Tondela, organizado por  Ana Pérez-Quiroga, Anna Klobucka, Câmara Municipal de Tondela e Junta de Freguesia de Parada de Gonta, o «Colóquio de Homenagem à escultora Ana de Gonta Colaço», 120 Anos depois do seu nascimento.

O Colóquio incluiu comunicações de Ana Pérez-Quiroga, Anna Klobucka, Beatriz Albuquerque, Inês Borges, Isabel Lousada, Jorge Pereira de Sampaio, Luís Peres Pereira, Mafalda Ferro e Tomaz Colaço.

Pensa-se que será publicado um Livro com as Actas do Colóquio.

 
06 —  "Manuela Nogueira - Desassossego sem fronteira", de Carla Parisi e Conceição Andrade. 
Divulgação

 

Segundo notícia disponibilizada pela Casa Fernando Pessoa, Manuela Nogueira é frequentemente abordada por ser sobrinha de Fernando Pessoa, a última pessoa que conheceu o poeta em vida, que guarda nas suas memórias os muitos momentos em que privou com o tio e as histórias da família.

Mas Manuela Nogueira tem a sua própria história para contar e é, ela própria, uma poeta com vários livros publicados.


As autoras Carla Parisi e Conceição Andrade quiseram registar as histórias de Manuela Nogueira, contadas na primeira pessoa e intercaladas com a poesia que a acompanhou a vida toda.


O livro "
MANUELA NOGUEIRA - DESASSOSSEGO SEM FRONTEIRA" será apresentado na Casa Fernando Pessoa (que fica no edifício onde Manuela viveu uma parte da sua infância), hoje, dia 14 de Novembro, às 18.30. 

 
07 — Publicação de "Poemas 1934-1961", Volume I, de Pedro Homem de Mello.
Divulgação.


Com edição de Luis Manuel Gaspar, é nesta ocasião publicado o livro «Poemas 1934-1961», o primeiro de dois volumes reunindo toda a poesia de Pedro Homem de Mello. 

Aos mais de 600 poemas agora disponíveis numa edição de referência, incluem-se ainda importantes materiais de apoio: uma cronologia sumária, um estudo bibliográfico e os muitos textos críticos que acompanhavam as obras originais, na sua íntegra.

 

 
08 Publicação de duas obras de Reto Mónico (escritor suíço). 
Divulgação.

 

Reto Monico nasceu em 1953 na Suíça italiana, onde obteve a «Maturité Fédérale» em 1972.  Em 1977, licenciou-se em História na Faculdade de Letras da Universidade de Genebra.

Doutorou-se em 2003 com a tese «Suisse-Portugal: regards croisés (1890-1930)», publicada em 2005, obra que integra a Biblioteca da Fundação António Quadros, com uma dedicatória manuscrita do autor para Mafalda Ferro, em 2006.

Com Joaquim Vieira publicou: Mataram o Rei! O Regicídio na imprensa internacional (2007); República em Portugal! O 5 de Outubro na imprensa internacional (2010); Nas Bocas do Mundo: o 25 de Abril e o PREC na imprensa internacional (2014).


Colabora desde 2017 com a Biblioteca Digital Rio-Grandense, para a qual escreveu vários livros. Leccionou no ensino secundário de 1976 a 2013.

 
09 Programação prevista para a última Newsletter de 2023 (Dezembro).
Informação.

As newsletters de 2023, ano do centenário de nascimento de António Quadros, têm-lhe sido muito especialmente dedicadas. No entanto, temos destacado também a vida e obra de outras personalidades, figuras centrais de importantes efemérides e as actividades da Fundação, de Rio Maior, de outras Instituições ou de Particulares.

Pretendemos dar ao leitor, com antecedência, a oportunidade de sugerir elementos ou publicações para cada mês.

Muitas vezes, depois da publicação de cada NL, recebemos elementos que evidentemente registamos mas que, em termos da sua publicação, já nos chegam fora de horas.


Agenda para DEZEMBRO:

Homenagens a Fernanda de Castro (08.12.1900 / 19.12.1994) e a Paulina Roquette Ferro (27.12.1923 / 06-08.2010), no mês de nascimento e morte de ambas. Encerramento do ano do Centenário de António Quadros.

 
10 — Livraria António Quadros:
Obra em Promoção até 14 de Dezembro:

 

Autoria: Maria Barthez


Título:
Memória de Francisco Lage. Da prática à Teoria.


Edição
— Lisboa: Gradiva Publicações, 2019.

Descrição:
Obra sobre a actividade etnográfica de Francisco Lage, particular e institucional enquanto colaborador do SPN/SNI durante a direcção de António Ferro.


PVP:
€16

 
 
     
 
Apoios:
 
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